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A propósito da primeira incursão
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A PROPÓSITO DA PRIMEIRA INCURSÃO DA 6.ª COMPANHIA DE CAÇADORES ESPECIAIS NOS DEMBOS: ABORDAGEM DE ALGUNS MITOS E REALIDADES NA ANGOLA DE 1961

 


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Paulo Rodrigues

 

 

 

Resumo

As intervenções levadas a cabo pelas tropas portuguesas no norte de Angola logo após o levantamento de 15 de Março de 1961 têm vindo a ser, desde o início, alvo de um escrutínio que obedece, na maioria das vezes, mais a paixões de ordem política do que propriamente à objectividade. Uma dessas intervenções, em particular, gerou intenso debate: referimo-nos à então famosa incursão do 3º pelotão da 6ª Companhia de Caçadores Especiais, comandado pelo alferes Fernando Robles, pela zona dos Dembos, prontamente romanceada pela imprensa pró-regime[1] ou deturpada pelos adversários do mesmo[2]. Tratando-se de um episódio profusamente badalado na imprensa, rapidamente adquiriu características de mito, um dos vários que têm marcado a historiografia do dealbar da guerra ultramarina portuguesa iniciada em 1961, e que pretendemos abordar aqui.

Palavras-chave: União das Populações de Angola (UPA); Guerra de África; Salazar; Caçadores Especiais; Alferes Robles

 

Abstract

The operations carried out by the Portuguese troops in northern Angola in the aftermath of the so-called March 15th uprising have been, from the very beginning, analysed according to perspectives that obey more to political agendas than to objectivity. One intervention in particular generated heated debates: the famous mission of the 3rd platoon of the 6th Special Sharpshooters Company, commanded by 2nd lieutenant Fernando Robles, in the Dembos area. This episode was promptly romanticised by the pro-regime press and distorted by the regime's opponents. In any case, it quickly acquired the characteristics of a myth, one of the several which can be found in the historiography of the beginning of the Portuguese overseas war that started in 1961, and which the author intends to address in this article.

Keywords: Angola Population's Union (UPA); War in Africa; Salazar; Special S​harpshooters; Second lieutenant Robles

 



Começando por um enquadramento da situação, podemos afirmar que, em finais da década de 1950, e prevendo que a crescente presença de novos países afro-asiáticos e/ou comunistas viesse a transformar a ONU numa cada vez mais forte ameaça à política ultramarina portuguesa, por um lado, e, por outro, que o surto de movimentos independentistas surgido alguns anos antes um pouco por toda a África (e que levara ao aparecimento de alguns desses novos países) se fizesse sentir com intensidade nos seus territórios de além-mar, o governo de Lisboa começou a tomar as devidas providências. Era um facto que o Movimento Popular de Libertação de Angola (MPLA) não passava então de um grupo pouco influente, formado a partir da fusão de outros pequenos grupos independentistas e marxistas, da mesma forma que a União das Populações de Angola (UPA), instalada no Congo Belga, não tinha nem meios nem apoios do lado português da fronteira que lhe permitissem, no futuro imediato, iniciar uma luta armada. Contudo, avaliando a previsível evolução da situação internacional, o governo de Salazar compreendeu que tinha de tomar medidas.

Estando a preparação e o dispositivo militar de então organizados no sentido de uma guerra dita convencional, contando com a eventualidade de um conflito à escala mundial entre os países da OTAN (aliados dos EUA) e os do Pacto de Varsóvia (aliados da URSS), houve que começar pela alteração do paradigma da preparação dos efectivos militares. É neste contexto que surgem a directiva do Estado-Maior do Exército de 12/10/1959 ou, alguns meses depois, o Centro de Instrução de Operações Especiais (CIOE) de Lamego, cuja principal finalidade era a preparação de quadros para o tipo de operações de contraguerrilha que o nosso Exército poderia ter de realizar num futuro próximo.

O tempo urgia de facto e, ao longo do ano de 1960, o horizonte viria a tornar-se realmente carregado, graças a uma catadupa de acontecimentos negativos para a política ultramarina portuguesa: em primeiro lugar, a independência do Congo Belga, que permitia a Holden Roberto (líder da UPA) movimentar-se mais livremente, receber apoio directo dos principais políticos do novo estado e promover um “efeito de contágio" para o norte de Angola, cuja população tinha grandes afinidades étnicas com a do Congo Belga; em segundo, a chegada de Capacetes Azuis tunisinos a Leopoldville, que permitiu à Tunísia proceder ao anteriormente prometido apoio à UPA com armas e instrução de combate[3]; em terceiro, o claro posicionamento dos EUA a favor da independência dos territórios ultramarinos portugueses, traduzida quer na pressão exercida sobre Salazar por Eisenhower aquando da visita deste a Portugal (já em final de mandato), quer, após a vitória de John Fitzgerald Kennedy nas eleições desse ano, na previsível transformação dessa simpatia norte-americana pelos independentistas em apoio mais directo aos mesmos, nomeadamente através das missões cristãs protestantes em território angolano e do estreitamento de laços entre Washington e Holden Roberto (que mantinha ligações com a CIA já desde 1955)[4]; em quarto, a presença não só deste último, mas agora também de Viriato da Cruz na Conferência dos Povos Africanos desse ano (realizada em Túnis) – o que demonstrou aos países participantes que o independentismo em Angola já não era uma causa exclusiva dos bacongos no norte, factor que terá certamente contribuído para uma maior projecção internacional dessa mesma causa e para a angariação de apoios daí decorrente.

Voltando à nova realidade do Exército Português, e de acordo com o que ficara definido na directiva de 22 de Abril de 1959 do então ministro do Exército, brigadeiro Almeida Fernandes, foram criadas “unidades terrestres que, pela sua organização, apetrechamento e preparação, possam ser empregadas, sem perda de tempo, na execução das operações do tipo especial, previsíveis: operações de segurança interna, de contra-subversão e de contraguerrilha". Assim, numa primeira fase, os futuros instrutores do CIOE (cuidadosamente seleccionados) receberam instrução em acções de contra-subversão e contraguerrilha ministrada em centros de instrução estrangeiros, destacando-se naturalmente os do exército francês (no qual, devido à guerra da independência da Argélia, não faltavam especialistas neste tipo de operações). Após o regresso daqueles militares a Portugal, procedeu-se ao enquadramento e preparação das primeiras unidades daquelas que viriam a ficar conhecidas para a História como as primeiras companhias de caçadores especiais, devendo-se a atribuição deste qualificativo (“especiais") à necessidade de distingui-las das unidades de caçadores tradicionais, vocacionados não para a contra-guerrilha mas, acima de tudo, para ações de patrulhamento e defesa das fronteiras.

De início, coube, pois, ao CIOE a organização e a instrução das novas companhias. Posteriormente, todavia, só os oficiais e sargentos receberam instrução naquele centro, indo depois constituir as novas companhias em diversos Batalhões de Caçadores espalhados pelo país (nomeadamente, numa primeira fase, Aveiro, Lisboa e Setúbal)[5]. As primeiras destinaram-se a Angola.

Assim, à data da independência do Congo Belga (29 de Junho de 1960), encontravam-se já presentes 3 companhias de caçadores especiais no Norte de Angola e em Cabinda, a que se juntou um batalhão de caçadores formado naquele território. Referimo-nos ao BC 3, chegado a Carmona (hoje, Uíge) dias antes desse acontecimento. De notar que, pese embora a colocação de um batalhão de caçadores nessa cidade, tal não impediu que o seu distrito viesse a ser um dos mais fustigados aquando do 15 de Março – o que nos leva a concluir que, com ou sem tropa no terreno, a revolta da UPA já vinha sendo planeada há vários anos e a sua preparação há muito que estava em marcha, como aliás, é admitido pelo próprio Holden Roberto[6].

O armamento dos caçadores especiais, numa primeira fase, era composto por pistola Parabellum (calibre de 9 mm), espingarda de repetição Mauser 98K (calibre de 7,9 mm), espingarda automática FN-FAL (calibre de 7,62 mm), pistola-metralhadora automática FBP, m/947 (calibre de 9 mm), metralhadora ligeira Dreyse (calibre de 7,9 mm), metralhadoras pesadas Madsen (calibre de 7,9 mm) e Breda (calibre de 7,9) e ainda metralhadora Browning (calibre de 12 mm), morteiro (calibre de 60 mm), lança-granadas foguete (8,9 cm) e granadas de mão. Encontrando-se este material praticamente todo obsoleto, viria a proceder-se também à sua modernização, num processo em que o esforço do governo português começou por esbarrar nas dificuldades levantadas pelos nossos aliados da NATO, as quais se traduziriam num atraso da produção do armamento pretendido. Assim, as unidades no terreno apenas viriam a ser equipadas exclusivamente com armas automáticas mais de um ano após o início do conflito, em 1962[7].

A propósito desta demora, e ainda relativamente ao enquadramento da intervenção das primeiras Companhias de Caçadores Especiais em Angola, há ainda algo que importa esclarecer: alguma historiografia, em voga até um passado recente e ainda hoje muito divulgada, acusa o governo de Salazar e as autoridades militares portuguesas de terem sido deliberadamente lentos na prevenção e na preparação da resposta aos previsíveis levantamentos de populações locais contra as autoridades - chegando mesmo a ignorar um aviso concreto que indicava o dia 15 de Março de 1961 como dia marcado para um grande levantamento[8]. Contudo, estudos mais recentes, politicamente mais neutros e amplamente documentados levam a considerar tais teorias, no mínimo, demasiado simplistas, ou até mesmo a refutá-las[9].

Fernando Martins[10] aponta para as divergências profundas entre Salazar (favorável a um desinvestimento na NATO para maior investimento em tropas e material para a defesa do Ultramar) e o ministro Botelho Moniz (considerado pró-americano desde que fora adido militar nos EUA e defensor de um investimento em ambas as frentes, o que Salazar considerava incomportável para as finanças do país) como factor retardador de uma mais célere preparação para um possível conflito em África. De resto, é nossa opinião que a evidente probabilidade de as cada vez maiores discordâncias entre Salazar e Botelho Moniz poderem desembocar numa tentativa de golpe de estado encabeçada por este último (o que viria de facto a verificar-se e que dificilmente terá surpreendido o então Presidente do Conselho) é um dos factores fundamentais para que Salazar não tenha imposto o envio, logo no início de 1961, de um contingente militar superior ao que já estava gradualmente a ser deslocado da Metrópole sobretudo (mas não só) para Angola. Acresce ainda que Portugal (não sendo um país com uma situação financeira comparável às de uns EUA ou de um Reino Unido), não estava em condições de fazer uma mobilização “rápida e em força" de tropas para qualquer dos seus territórios ultramarinos, nem de manter um tal contingente nesses territórios por tempo indeterminado, sem que uma situação de guerra eclodisse primeiro.

Valentim Alexandre[11], por seu turno, aludindo às acusações de imprevidência de que o governo português de então tem sido alvo, afirma que “A realidade é mais complicada" do que tais acusações pressupõem e que, se por um lado é verdade que se foram acumulando indícios, desde 1959, de que algo estava para acontecer em Angola, por outro é falso que o governo não tivesse tomado medidas. Simplesmente, nunca se esperou uma tal dimensão nos acontecimentos, o que justifica o porquê de zonas como os Dembos (zona rural, próxima de Luanda e longe da fronteira) estarem desguarnecidas.

Finalmente, Bruno Cardoso Reis[12] (na mesma linha de Valentim Alexandre) refere: “Está bem documentada, desde a humilhação da França e da Grã-Bretanha na crise do Suez, em 1956, a preocupação de Salazar com o risco de uma insurreição. (...). Também importa sublinhar que, em conversações secretas regulares (que tenho estudado) entre as quatro principais potências coloniais em África ao longo da década de 1950, não havia sinais, até 1959, de que a França, a Bélgica ou a própria Grã-Bretanha estivessem apostados numa rápida independência das suas colónias da África Austral (...). Parecia haver tempo". E acrescenta, quanto ao alerta para um ataque a 15 de Março que as autoridades militares portuguesas receberam da parte da embaixada dos EUA em Lisboa, mas que terá sido ignorado em Luanda: “Porém, também houve avisos anteriores apontando para outras datas. Ainda assim – esta é parte real deste mito – é claro que, na forma como se lidou com esta informação, houve uma subestimação daquilo que os independentistas podiam fazer. Cabe notar, porém, que não havia memória de um ataque do tipo do 15 de Março em Angola. Eventos recentes, do desorganizado levantamento geral da Baixa do Cassange ao improvisado ataque às prisões de Luanda, alimentaram a ideia de que, a acontecer algo em Março, seria de tipo semelhante e fácil de conter"[13].

O número de testemunhos já considerável que temos lido e ouvido ao longo dos anos, leva-nos a concordar com este autor, cabendo acrescentar que, embora se esperasse de facto que, mais mês, menos mês, ocorresse algum tipo de sublevação no norte de Angola, nunca se pensou que esta chegasse ao ponto de incluir gente proveniente do antigo Congo Belga (cuja presença está amplamente documentada em peças jornalísticas da imprensa e televisão da época). Além disso, tendo em conta a então natural e evidente desconfiança das autoridades portuguesas em relação aos EUA, qualquer indicação proveniente da CIA poderia ser facilmente encarada como manobra de distracção, sobretudo quando a lógica mandava à partida que um eventual ataque começasse pelo enclave de Cabinda e não pelo então chamado “Congo Português".

A ligação da UPA ao ex-Congo Belga não se explica apenas por este novo país ser local de abrigo de muitos independentistas angolanos. Com efeito, em ambas as margens do Rio Zaire havia “Congo", e o povo era o mesmo. De resto, historicamente, o combate entre o antigo reino congolês e o reino de Portugal pela hegemonia na região não era novidade. Recorde-se, a título de exemplo, a famosa Batalha de Ambuíla (travada a 29 de outubro de 1665, numa zona que, em Março de 1961, viria a ser um dos epicentros da revolta da UPA), na qual as tropas portuguesas (comandadas pelo crioulo luandense Luís Lopes de Sequeira, hoje considerado por muitos um herói nacional angolano) conseguiram uma importante vitória sobre o Rei do Congo. Refira-se, a título de curiosidade, que houve portugueses brancos a combater por ambos os lados, o que uma vez mais prova que, sobretudo nas questões coloniais, as coisas nunca são “a preto e branco". Acresce que, nesta vasta região, a presença portuguesa em 1961 era escassa, pelo que a revolta terá tido de facto mais a ver com uma pretensão independentista dos bacongos da UPA do que com uma resposta a situações de exploração dos trabalhadores nas fazendas ou de revolta dos nativos pela apropriação das suas terras por parte de cafeicultores brancos. Estas situações de facto ocorreram e sem dúvida que terão contribuído para a revolta em determinadas localidades. Não podemos, contudo, concordar com aqueles que defendem que essa exploração era generalizada e estava institucionalizada em Angola, até porque as autoridades foram procedendo a reformas, nem sempre eficazes (devido a casos de corrupção), mas suficientes para chegarem a revoltar os colonos contra “excessos de zelo" por parte dos inspectores do trabalho, conforme nos dá conta José Hermano Saraiva ao visitar o Congo[14]. Essa ausência de uma exploração generalizada é-nos corroborada por outros testemunhos que estavam no terreno à data do 15 de Março e já viviam em Angola antes do deflagrar da guerra. Por exemplo, a propósito das condições de vida dos trabalhadores das roças e fazendas, o alferes miliciano Serafim Sousa e Silva (BC 3)[1​5] afirma: “Havia de tudo, boas e más instalações e até instalações nenhumas! Boas instalações, nas fazendas que conheci, não era sinónimo de grandes fazendas. (...) Lembro-me que, entre as muitas fazendas que visitei, quer como militar, quer mais tarde ao serviço da Mobil, aquela que possuía melhores instalações para todo o seu pessoal (fosse branco, negro ou mestiço) era chamada de Boa Entrada, e lá existia um bairro residencial com escola, igreja e um hospital". As imagens da época confirmam este depoimento, revelando que, por vezes, em fazendas situadas a poucos quilómetros umas das outras, as condições de habitação divergiam fortemente: por exemplo, se olharmos para os registos fotográficos das fazendas Maria Fernanda e Margarido (disponíveis online), nos Dembos, facilmente constatamos que, enquanto na primeira os trabalhadores nativos viviam em cubatas, na segunda habitavam edifícios de alvenaria que lhes garantiam condições de perfeita salubridade. O mesmo se passava na zona de Carmona, onde ainda hoje existem ruínas de explorações com verdadeiros bairros para os trabalhadores.[16]

São ainda de ter em conta o facto de os bailundos (nome genérico que designava trabalhadores provenientes de regiões mais a sul) não terem acedido aos apelos dos emissários da UPA para se juntarem à revolta[17] (o que certamente teriam feito, se se sentissem escravizados), os inúmeros episódios relatados na imprensa da época que atestam a fidelidade desses mesmos bailundos aos seus patrões[18], ou até mesmo, no caso das províncias do Uíge e do Zaire (“Congo Português"), uma simples análise dos mapas da região, que permite concluir que aquele vasto território estava muito longe de estar saturado com fazendas, pelo que não se pode de forma alguma falar de uma efectiva ocupação do espaço dos nativos por parte de colonos. Diga-se, também, que existiam fazendeiros negros “assimilados" ou mestiços na região [19] e que a adesão dos bacongos à revolta não foi geral[20​].

Igualmente digna de nota é a questão religiosa: os revoltosos eram, na sua maioria, cristãos protestantes (enquadrados por missões religiosas britânicas e norte-americanas), sendo de salientar que, em 1961, a percentagem de população protestante em relação à católica nas problemáticas zonas de Nambuangongo e de Carmona era de nada menos de 84% e 83%, respectivamente.[21]

Grosso modo, pode afirmar-se que houve quatro tipos de atitude das populações nativas do Norte de Angola relativamente ao levantamento do 15 de Março: adesão total (sobretudo, nas zonas mais próximas das fronteiras daquela que é hoje a República do Congo e a norte do Quitexe[22]); adesão apenas por receio de represálias, seguida de apresentação e pedido de protecção às autoridades portuguesas após a chegada dos militares à sua região[23]; colaboração com os dois lados, procurando assim sobreviver[24], recusa total logo desde o início e colaboração com as autoridades, por vezes constituindo milícias autónomas (caso da “Vanguarda Salazar", criada pelo dembo de Pango Aluquém, Francisco N'Gola).[25] Quer na região do Congo (habitada por bacongos), quer nos Dembos (habitada por ambundos), verificaram-se exemplos destas quatro situações, o que, neste último caso, era algo que vinha de longe e que umas boas dezenas de anos antes (na última revolta contra as autoridades portuguesas na região) acontecera mais uma vez: não existia união entre os soberanos locais, tendo alguns deles apoiado as autoridades portuguesas, enquanto outros, por um ou outro motivo, aderiram à revolta.

Pelo exposto acima, resulta totalmente falso afirmar-se que a guerra em Angola tenha sido um conflito entre negros e brancos, ou entre nascidos em Angola e nascidos na Metrópole. Tratou-se, isso sim, de uma luta entre angolanos que (por um ou vários motivos) queriam a independência e angolanos e metropolitanos que pretendiam que aquela então província permanecesse portuguesa.

Não se julgue, no entanto, que nos primeiros meses após os acontecimentos de Janeiro (revolta da Baixa do Cassange contra os graves abusos da empresa luso-belga Cotonang sobre as populações nativas, abusos esses denunciados até mesmo pelas autoridades mais próximas do governo, e que levariam Salazar a nomear o reformista Adriano Moreira para Ministro do Ultramar), Fevereiro (assalto a prisões em Luanda) e Março (massacres nas zonas rurais do norte levados a cabo pela UPA) a desconfiança mútua entre negros e brancos não gerou um clima de profunda crispação nas zonas afectadas. Foi esse clima de tensão racial, desconfiança e medo que as Companhias de Caçadores Especiais (CCE) que, umas após as outras, iam chegando a Angola, encontraram ao desembarcar em Luanda após o 4 de Fevereiro e, ainda mais, depois do 15 de Março. No seu diário intitulado “Um ano na guerra no norte de Angola", o hoje consagrado autor tavirense Arnaldo Casimiro Anica (que, à data, integrava a 8ª CCE), refere:

“[29 de Março] (...) Os brancos que viviam isolados nos muceques [NOTA: bairros pobres] abandonaram as suas casas e refugiaram-se nos bairros dos brancos. Nestes bairros, os seus moradores agruparam-se em “milícias", armados de caçadeiras, de catanas (grandes facas com que os pretos normalmente trabalham), ou simplesmente de cacetes, para à noite fazerem rondas na área das suas residências. [...]"[26].

Não surpreende pois que, numa fase inicial, algumas companhias de caçadores especiais tenham sido utilizadas no policiamento dos ditos muceques[27]. Foi o caso dos elementos da 6ª CCE já aqui referidos.

Mobilizada em 2 de Outubro de 1960 pelo Regimento de Infantaria 1 (Amadora), inicialmente para reforço à guarnição da Índia portuguesa[28], sob a designação de “Companhia de Caçadores Especiais 67", esta unidade viria a ser desviada para Angola na ressaca dos acontecimentos de 4 do Fevereiro, onde ficaria conhecida pela designação de 6ª Companhia de Caçadores Especiais do Regimento de Infantaria de Luanda ou, informalmente, por 6ª Companhia de Caçadores Metropolitanos - evitando-se assim confusão com as Companhias de Caçadores Indígenas, que já andavam pelo Norte de Angola e Cabinda desde meados de 1960.

Esta companhia chegou a Luanda por via aérea a 12 de Fevereiro de 1961, sendo inicialmente empregue na segurança à capital, nomeadamente nas já acima referidas acções de prevenção e controlo levadas a cabo nos muceques. Contudo, na sequência do levantamento de 15 de Março, viria a ser integrada sucessivamente no Batalhão de Caçadores do Quanza Norte e no Batalhão de Caçadores 230, desenvolvendo inúmeras actividades de antiterrorismo e luta de contra-guerrilha nas regiões de Caxito, Úcua, Píri, Vista Alegre, Cambamba, Quibaxe, Camabatela, Bula Atumba, Quiculungo, Aldeia Viçosa e Quitexe. Em Novembro regressou a Luanda, onde voltaria a participar na segurança dessa cidade, sendo depois transferida para a fronteira norte, para São Salvador e Nóqui (Abril de 1962) e depois novamente mais para sul, para Duque de Bragança (Novembro de 1962), onde terminaria a sua comissão, regressando à Metrópole em Março de 1963.

O comando desta companhia estava a cargo do capitão de infantaria Raul Leandro dos Santos, coadjuvado pelos alferes milicianos José Carlos da Cruz Teixeira e Fernando Augusto Colaço Leal Robles, tendo sido temporariamente adjunto o tenente miliciano Pedro Simões Dias. Revelando uma elevada capacidade operacional, esta unidade recebeu oito condecorações individuais[29] (uma Medalha de Prata de Valor Militar com palma, uma Cruz de Guerra de 2.ª classe, três Cruz de Guerra de 3.ª classe e três Cruzes de Guerra de 4.ª classe), tendo sofrido 6 baixas.

Foi na sequência do levantamento do 15 de Março que o 3º pelotão desta companhia, comandado pelo alferes Fernando Robles, se viu envolvido numa missão na região da chamada “estrada do Café", itinerário que vai do Caxito a Carmona (hoje, Uíge), passando por Úcua, Piri, Quibaxe, Vista Alegre e Aldeia Viçosa. Assim, na madrugada do dia 17 de Março, uma coluna composta por 32 militares e cerca de 50 civis (proprietários rurais que, casualmente, se encontravam em Luanda no dia dos massacres, ou que para lá se tinham deslocado para solicitar auxílio) encetou uma marcha que viria a ficar famosa.

Importa antes de mais referir que esta coluna não foi a única que, nesse dia, saiu para “o mato". Com efeito, nessa mesma data, elementos de várias unidades o fizeram, com destaque para a 5ª CCE, que conseguiria chegar além de Nambuangongo[30] (povoação emblemática para a UPA e que só viria a cair sob controlo real das tropas portuguesas vários meses depois, após uma operação de considerável envergadura e com o envolvimento de um efectivo militar muito superior). Os actos de bravura por parte da tropa portuguesa por estes dias sucederam-se, e muitos deles poderiam ter sido dignos de grande destaque. Contudo, foi a coluna do 3º pelotão da 6ª CCE que foi acompanhada por um conhecido jornalista (João Charulla de Azevedo), que prontamente publicou alguns dos episódios por ela vividos no jornal Comércio[31], colocando-a, assim, nas bocas do povo. Estava encontrado o primeiro herói que o povo reclamava, como acontece em qualquer conflito. O “alferes Robles" era o jovem intrépido e invencível, que levara a justiça onde esta fora violada e regressara vivo. As conversas de café e de caserna sucediam-se, e o “diz-que-disse" também. A partir de então, o jovem Fernando Robles deixou de ser “simplesmente" o militar extremamente corajoso e empenhado em cumprir que então se revelara e passou a ser um herói quase sobre-humano (para os defensores do regime) ou um inimigo cujo nome era urgente sujar (para os adversários do mesmo)[32].

Os boatos na rua começaram logo quando se tratava de saber dados biográficos sobre o jovem militar, não estando o próprio Charulla de Azevedo isento de responsabilidades quanto aos mesmos[33]: “É um estudante de Direito que se voluntariou na Metrópole", diziam uns, com base na informação errada veiculada por aquele jornalista. “Mataram-lhe a família no 15 de Março e foi para o mato vingar-se da UPA", diziam outros, sem qualquer conhecimento da realidade. Como refere o tenente-coronel Pires Nunes [34], chegado a Luanda pouco tempo depois: “Cada dia que passava, o mito alimentava-se a si próprio com os boatos que nessa altura fervilhavam por tudo e por nada, confundindo-se o mito com a realidade e, perante tantas incertezas, alguns chegaram a pensar se tal alferes existiria". Na realidade, Fernando Robles era natural de Coimbra, onde nascera a 15 de Agosto de 1940. Filho de um militar, ingressara no Colégio Militar, de onde saíra para a Escola do Exército (logo a seguir rebaptizada como Academia Militar). Tendo chumbado a uma cadeira de física, não pôde continuar decidindo então voluntariar-se como miliciano para as Companhias de Caçadores Especiais. E agora, aos 20 anos, ali estava em Luanda. Contudo, apesar da juventude do alferes, o comando viu nele as características necessárias para lhe conferir uma missão cujas ordens eram simples, mas cujo cumprimento – dadas as condições que encontraria - viria a revelar-se só estar à altura de militares de excepção: acorrer, com o seu pelotão e pouco mais de 50 civis, à zona dos Dembos entre Quibaxe e Aldeia Viçosa, resgatar aqueles que pudessem ter sobrevivido nas fazendas e povoações atacadas e destruir os inimigos que encontrasse.[35]

Saindo então de Luanda ao raiar da aurora[36], a coluna foi ovacionada no Caxito e prosseguiu para o Úcua. Aqui, a atmosfera era mais crispada. Um fazendeiro do Piri, que fora obrigado a fugir da sua roça com alguns dos seus funcionários para salvar a vida, pediu-lhes auxílio para expulsar os revoltosos da sua propriedade, ao que o alferes, naturalmente acedeu. Resolvida a questão no Piri sem mortos (dado que os revoltosos fugiram aos primeiros tiros e o fazendeiro arranjara reforços armados), a coluna prosseguiu até Quibaxe, onde a sua chegada foi fortemente saudada pela população da localidade e pelos muitos moradores das redondezas que ali tinham procurado refúgio. A vila tinha os acessos barricados, aguardando um ataque a qualquer momento. O alferes e o seu estado-maior (composto pelo sargento Pego e pelos furriéis Bucho e Raposo) reuniram prontamente com o administrador, que não tinha um mapa com as fazendas assinaladas que pudesse fornecer-lhes e confidenciou não saber o que poderiam encontrar: se os revoltosos eram centenas ou milhares, se estavam bem ou mal armados, se teriam entretanto recebido reforços. Ouviram-se então as primeiras vozes a questionar se não seria imprudente passar o rio Dange e avançar estrada acima apenas com um pelotão, mas o alferes achou por bem fazê-lo logo no dia seguinte pela manhã e deixar uma secção do pelotão na vila, para ajudar a garantir a sua segurança. E assim foi: munidos de um guia (um cabo-verdiano que trabalhava em Vista Alegre havia vários anos), fizeram-se à estrada. Antes de chegarem à ponte do Dange, depararam-se pela primeira vez com uma vítima dos massacres: um motorista assassinado no interior da sua camioneta[37]. Pouco depois avistavam a dita ponte, que estava totalmente destruída. De imediato, procederam à reconstrução possível, tarefa que levou várias horas. O objectivo era irem até Vista Alegre e regressarem a Quibaxe para pernoitarem (as duas vilas distam apenas 65 km uma da outra), mas o estado da ponte e a quantidade de árvores abatidas que encontraram a bloquear a estrada foram de tal ordem, que só chegaram a Vista Alegre com a noite já bem alta. Pelo caminho, tinham ficado as primeiras fazendas, onde encontraram mortos barbaramente assassinados, que tiveram de sepultar. Um avião sobrevoara-os, largando uma mensagem na qual os aconselhava a não continuar, visto terem sido detectados aglomerados de revoltosos mais para a frente. Mas, para o alferes, recuar não era opção: a seu ver, tal só moralizaria os revoltosos e desmoralizaria os portugueses. Acrescia que poderia haver pessoas cercadas nas respectivas fazendas e populações nas aldeias a necessitar de auxílio, e as ordens eram para cumprir. Chegados finalmente a Vista Alegre, já de noite, dispuseram as viaturas em círculo e acamparam como puderam no meio das mesmas. Ao raiar da madrugada, verificaram estar cercados. Ouviu-se um apito e um grupo numeroso (onde vinham também mulheres e crianças) começou rapidamente a correr na sua direcção. Mas, em vez de atacarem, ao fim de umas dezenas de metros largaram catanas e canhangulos, ao mesmo tempo que levantavam os braços em sinal de rendição. Interrogados os primeiros, disseram ter sido ameaçados e obrigados pela UPA a atacá-los, mas, em vez disso, vinham pedir protecção. Protecção essa que a tropa não conseguia garantir naquele local, pelo que foi necessário escoltar toda aquela gente novamente até Quibaxe. Ainda por essa altura, depararam-se na estrada com uma pequena comitiva. Era o dembo de Quipenene (sanzala situada um pouco mais a noroeste de Vista Alegre), que vinha com alguns dos seus súbditos para saudá-los, pensando tratar-se de soldados enviados do Congo para combater os portugueses. Imediatamente detidos, os elementos do grupo foram juntar-se ao soba de Quissala na prisão de Quibaxe.[38] Mas ali estava a prova de que era urgente avançar, enfrentar os revoltosos e salvar os outros, ainda que a alguns tal parecesse imprudente. Outra dificuldade era o terreno: ora montanhoso e densamente arborizado, ora mais plano e cheio de capim, que chegava a atingir uma altura de 2 metros. Os locais de onde a qualquer momento podia surgir uma emboscada, sucediam-se. Numa ou noutra ocasião, chegaram a vir balas isoladas do capim, prontamente varrido por uma rajada de metralhadora em resposta. Depois, silêncio e não se encontrava ninguém. Ataques concretos sofreram três, o mais forte dos quais a 27 de Março, após passarem a ponte sobre o Dange, em mais uma incursão de vários dias desde a sua “base" de Quibaxe até às lonjuras da margem norte daquele rio. Cerca de 200 revoltosos, munidos apenas de paus e catanas, carregando sem recuar, parecendo drogados por algum estimulante. A coluna apenas teve alguns feridos ligeiros, mas os nervos adensavam-se sem parar. Mais dias sucessivos com comida racionada, falta de água, privação de um sono reparador. Fazenda após fazenda, cenário de horror após cenário de horror. Ao medo e ao desgaste juntavam-se a raiva e a incredulidade perante uma autêntica descida aos infernos, ficando a pergunta sobre que tipo de seres humanos seria capaz de cometer tais crimes: de usar serras mecânicas para serrar crianças (cujos olhos esbugalhados indicavam ainda estar vivas quando foram assim assassinadas); de cortar os seios de uma adolescente e colocá-los no interior da respectiva vagina rasgada, com um pau a servir de tampa; de retalhar pai, mãe e filho de 3 ou 4 anos à catanada, e depois compor um quadro macabro com os cadáveres abraçados. Ao verem estas cenas, uns desesperavam, outros vomitavam, outros ainda ficavam apáticos. Os civis choravam pelos seus, já encontrados mortos ou ainda por encontrar. Por vezes, ainda não estavam a ver os edifícios das fazendas e já sentiam o cheiro dos cadáveres em putrefacção, acelerada pelos efeitos da humidade e do calor. O alferes procurava dar o exemplo, mantendo-se impávido. Numa fazenda, depararam-se com um bebé cozinhado e parcialmente comido. Referindo-se ao testemunho de Manuel Nunes, filho do proprietário da Roça de São Bento do Castelo e recolhido pela coluna do alferes Robles após vários dias de fuga pelo mato com a respectiva família, Felícia Cabrita escreve[39]: “Numa das fazendas encontram o dono, Manuel de Matos, atado a uma árvore, sem cabeça e sem mãos. O crânio estava todo limpinho, podia beber-se água nele. Ao lado, o corpo nu da mulher com um pau no sexo. Do filho, quase nada sobrava, tinha sido assado e comido[40]. O alferes mantinha a frieza, mas mais adiante a carnificina amolecia o mais forte. Um homem tinha os testículos na boca, a mulher estava toda retalhada e, numa alcofa, um recém-nascido cortado em cinco postas. Robles encosta-se ao jipe e chora como uma criança". Recomposto, o alferes retomou o ritmo. Mais uma fazenda, mais uma ponte destruída ou uma árvore caída sobre a estrada para ser removida, mas avançar sempre. A guerra psicológica era total. Durante a noite, em várias ocasiões, ouviam cortar árvores umas centenas de metros mais atrás, por onde já tinham passado: o caminho para trás passava a estar vedado. Para a frente, logo se veria. Sempre o medo de um ataque em larga escala, a que a coluna certamente não resistiria. Sempre o espectro de uma morte por torturas inimagináveis a pairar no horizonte. Mas a coluna nunca deixou de avançar e conseguiu bater a zona que era suposto bater. Zonas de Quibaxe, Vista Alegre e Aldeia Viçosa, compreendendo, grosso modo, todas as fazendas entre a margem do rio Dange e a margem norte do Rio Luíca. Em 12 dias (desde a primeira saída de Quibaxe, a 19 de Março, até à chegada definitiva a Aldeia Viçosa para aguardar rendição, a 31 do mesmo mês), percorreu aproximadamente 700 km por picadas cheias de subidas e descidas quase intransitáveis (estava-se no período das chuvas e a lama abundava, além de que os independentistas tinham destruído pontes e colocado obstáculos nas vias). Foram quase três semanas no terreno[41], aproximadamente 40 fazendas visitadas, quase todas com gente para sepultar (num total de dezenas de brancos e um número “muitíssimo superior de bailundos"[42]). Aquilo que era para ser uma operação de poucos dias revelou-se assim uma empreitada de várias semanas pelo que, naturalmente, acabou por faltar a comida e a água, e as munições tiveram de ser racionadas. Torna-se, pois, totalmente inverosímil que o 3º pelotão da 6ª CCE tenha perpetrado as grandes chacinas de que o acusam: faltaram-lhe os efectivos (recorde-se que uma secção ficava de guarda permanente a Quibaxe), faltaram-lhe as munições e, sobretudo, faltou-lhe o tempo para tal. De igual modo (e ao contrário daquilo que a propaganda governamental de então se esforçou por fazer passar), o alferes Robles não foi o “pacificador" daquela região: com as suas investidas contribuiu, sem dúvida, para estancar os iminentes ataques às mais importantes povoações a sul do Dange e ajudou a que a UPA perdesse força. Não obstante, os revoltosos continuaram bastante activos, fazendo regularmente emboscadas a colunas de veículos motorizados. Pelas zonas percorridas pelo 3º pelotão da 6ª CCE na operação aqui referida, estiveram depois estacionadas várias unidades, nomeadamente os Batalhões de Caçadores 132 e 186, este último entre Julho de 1962 e Agosto de 1963, altura a partir da qual, então sim, a região passou a estar praticamente pacificada. As fotografias tiradas pelo furriel miliciano Ângelo Ribau Teixeira (Batalhão de Caçadores 357), que ali passou algum tempo em finais de 1963, dão mostras de uma sã convivência entre a tropa e os sobas da região (neste caso concreto, os de Vista Alegre e Cambamba).[43] A grande actividade dos revoltosos até 1963 e a sã convivência entre as autoridades tribais e administrativas acima referidas concorrem, também, para verificarmos que a coluna do alferes Robles nunca poderia ter chacinado tudo o que encontrou à sua passagem.

Não se pretende, contudo, afirmar aqui que, perante a situação vivida quer por militares, quer por civis, não tenham existido excessos. Eles ocorreram, e o hoje coronel Fernando Robles reconhece-o[44]. Excessos de alguns fazendeiros de cabeça perdida, como aquele que, chegado a Aldeia Viçosa depois de lhe terem chacinado toda a família, abateu a sangue-frio um revoltoso confesso que estava a ser interrogado (não restando ao alferes outra alternativa senão dar-lhe voz de prisão)[45]. Ou como aquele que, acabado de sepultar familiares na sua fazenda, pegou na sua arma e abateu um negro que passava na estrada de catana na mão. Ou ainda, de um militar que, perante um cenário de horror, fica totalmente descontrolado e descarrega a sua arma num suspeito, esquecendo-se do dever sagrado da presunção de inocência. Tudo isto é admitido pelo então alferes que, por outro lado, nega categoricamente ter realizado actos “famosos" que lhe são imputados, entre outros o de se passear com cabeças de revoltosos espetadas no jipe, ou de cortar a cabeça aos inimigos abatidos, ou ainda de amarrar os prisioneiros de forma que uma só bala desse para matar vários[46].

Não se pretende, igualmente, afirmar que a atitude da coluna em questão tenha sido passiva relativamente ao inimigo. As sanzalas que aceitaram voltar a hastear a bandeira portuguesa (p. ex. Cambeje)[47] foram poupadas, mas aquelas que se revelaram hostis foram, efectivamente, atacadas, como foi o caso de Quipenene[48] e de algumas outras. Na realidade, não restava outra solução aos caçadores especiais, em muito menor número do que os seus inimigos, senão infundir-lhes uma dose de medo que os levasse a acobardar-se (e, se possível, a depor as armas), o que passava por combater ideias disseminadas pelos feiticeiros, tais como a de que as balas dos portugueses eram água e jamais os matariam. A propósito desta crença, cabe aqui perguntar se, encontrando-se a tropa numa sanzala inimiga, não terá sido mais sensato aterrorizar os habitantes rebentando a tiro com a cabeça do chefe que zombava dos portugueses e se preparava para dar ordem de ataque aos seus homens, em vez de deixá-lo dar essa ordem e sofrer um ataque por parte de gente que, de outra forma, não temeria as balas.[49] Qual das duas opções teria sido, verdadeiramente, uma “atrocidade", ou uma “chacina"? Da mesma forma, em todas as guerras existem ciladas montadas contra os inimigos, que por vezes levam a que morram inocentes. Admitindo desde já que isso possa ter acontecido com o 3º pelotão da 6ª CCE, perguntamo-nos se tal não aconteceu, por exemplo, nos bombardeamentos de fábricas de material de guerra que tanto os Aliados como o Eixo praticaram na 2ª Guerra Mundial. Ou se tal não sucedeu ao longo de toda a História. Por conseguinte, aqueles que apelidam o alferes Robles de “criminoso de guerra", talvez devessem ser coerentes e rever a forma como classificam D. Afonso Henriques e tantos outros grandes chefes militares.

Os autores que, ao longo dos anos, têm tentado fazer passar uma imagem negativa dos militares portugueses responsáveis pelas primeiras contra-ofensivas contra a UPA escolhem, naturalmente, o alferes Robles como alvo principal, o que contribui para perpetuar a lenda negra a respeito deste oficial. Assim fez, logo no início da Guerra, Mário Pádua, médico, militante comunista e desertor do Exército, em cuja obra a antipatia pela tropa e pelo governo português de então se nos afigura por demais evidente. Refira-se que este médico chegou a Angola mais de um mês depois da incursão do 3º pelotão da 6ª CCE aqui tratada, integrado no Batalhão de Caçadores 88, e nunca pisou as zonas de Quibaxe e Vista Alegre. Popularizou-se assim uma imagem negativa daquele pelotão, e do seu alferes em particular, que outros, politicamente mais neutros, perpetuam acriticamente. Em vários casos (cf. Valentim Alexandre[50]) os autores remetem-nos para a obra de Pélissier La colonie du minotaure: nationalismes et révoltes en Angola: 1926-1961[51], onde as fontes indicadas relativamente à incursão em apreço são precisamente Mário Pádua e, sobretudo, a obra de Robert Davezies[52] Les Angolais. Esta última é uma colectânea de entrevistas a pessoas que lutaram contra Portugal, levadas a cabo por este sacerdote anticolonialista francês, colectânea essa que terá o seu valor, mas, uma vez mais, peca pelo testemunho indirecto na questão da coluna do alferes Robles. Assim, nas páginas 165-166 encontramos a repetição das acusações mais comuns ao alferes, numa entrevista realizada mais de 2 anos após a ocorrência dos factos, dada não por algum civil ou combatente da UPA que tenha estado no terreno em Março de 1961, mas sim por um oficial desertor do Exército Português, politicamente comprometido com forças contrárias ao governo de então, chegado a Angola em 1963[​53] e que, uma vez mais, nem sequer esteve nos Dembos.

Algo que consideramos sintomático em vários testemunhos como os que acabamos de citar é a forma como é contado um episódio em que, alegadamente, o alferes Robles convida de forma gentil os revoltosos (segundo uns) ou os habitantes das aldeias (segundo outros) a juntar-se para tirarem uma fotografia, após o que manda metralhá-los. Nas obras e páginas acima referidas, Pélissier diz que o oficial, nessas ocasiões, envergava uma pele de leopardo; Pela voz de Davezies, Honório Fortes fala num “uniforme de pára-quedista"; e, por sua vez, Jaime Weba refere uma indumentária de rei com um chapéu “com uma pena de galinha grande". No fundo, a única coisa que estes testemunhos têm de coerente (para além de se referirem a um episódio que poderá ou não ter ocorrido) é o facto de nenhum dos seus autores ter estado na zona de Vista Alegre (onde se alega que tal ocorreu) à data dos acontecimentos. Weba, activista da UPA e um dos responsáveis pelo massacre na fazenda de Arnaldo Poço[54], diz ter chegado ao local pouco depois, afirmando ter visto ainda um monte de cadáveres sepultados à pressa. Esta informação sobre a pilha de cadáveres poderá eventualmente ser tida como boa, mas há que salientar que a zona de acção deste revoltoso, pelo menos no 15 de Março, fica situada a umas largas dezenas de quilómetros de Vista Alegre – o que deixa no ar a questão sobre se esses cadáveres não seriam de facto de bailundos chacinados pela UPA e sepultados apressadamente pelos caçadores especiais, e não de vítimas destes últimos.

Mesmo em situações em que a hostilidade para com os caçadores especiais é menos aberta e/ou a militância na esquerda política não salta à vista, encontramos, sobretudo em escritos de gente que passou pela guerra, uma notória má vontade para com o alferes Robles. Dir-se-ia que os autores dos escritos em questão procuram com isso dar um toque “politicamente correcto" aos mesmos, como que a quererem dizer (em consonância com o espírito predominante na cena politico-cultural da actualidade) que, embora tenham combatido por Portugal, são isentos e reconhecem que a tropa portuguesa também cometeu excessos. Decidem assim imolar, desonesta e despudoradamente, o alferes Fernando Robles nesse altar da “correcção política". Mas, ao fazê-lo, perpetuam falsidades e prestam um péssimo serviço ao estudo da História, já para não falar na falta de civilidade em que incorrem perante a vítima. Dois casos afiguram-se-nos particularmente exemplificativos deste tipo de atitude: um é o do ex-sargento pára-quedista Joaquim Coelho, que afirma[55]: “Dos exemplos de incongruências, temos os actos de “bravura" do alferes Fernando Robles, da 6ª companhia de Caçadores Especiais, que, num assomo de raiva provocado por lhe terem assassinado familiares, (...) comandou um grupo que matou indiscriminadamente as populações indígenas. A loucura foi tal que o levou a descorar [sic] as regras elementares de precaução e deixou que o inimigo causasse dezenas de baixas entre os seus homens, quando progredia em zona infestada de bakongos instrumentalizados para estripar e esquartejar seres humanos. Provavelmente, a sua experiência na Baixa do Cassange, contra populações desarmadas, o tenha deslumbrado [sic] ao ponto de tamanha leviandade". Ora, como é sabido, o alferes Robles não teve familiares assassinados, a zona onde a sua coluna actuou não era habitada por bacongos (uma simples consulta a um mapa étnico de Angola permite concluí-lo), está por provar que essa mesma coluna tenha feito mortes indiscriminadas (como acima demonstramos), a 6ª CCE não sofreu “dezenas de baixas" (as baixas sofridas por cada companhia são pesquisáveis, por exemplo, em sites como o da Liga dos Combatentes e da Associação Portuguesa de Veteranos de Guerra, sendo que as da 6ª CCE foram em número de 6) e, por último, a 6ª CCE nunca esteve na Baixa do Cassange (o seu histórico operacional também é facilmente pesquisável online).

Outro caso paradigmático é o de Rui Azevedo Teixeira[56], que repete os lugares-comuns sobre o alferes Robles, embora com grande virulência, num tratamento diametralmente oposto à isenção com que brinda o sniper da UPA António Fernandes, conhecido por “mata-alferes". Quanto mais não seja por uma questão de civilidade, é sempre conveniente confirmar as informações de que se dispõe, sobretudo quando as acusações que se faz são particularmente graves. E ainda mais quando, sendo-se comando, não é difícil chegar à fala com o visado (também ele comando) para confirmar determinados pormenores.

Existem registos televisivos e escritos de entrevistas ao coronel Fernando Robles onde, embora com menos pormenor, o militar veicula as mesmas ideias que nos expôs pessoalmente[57]. Entre eles, destacamos o documentário Ultramar, Angola 1961-1963, de João Garção Borges[58] (Lisboa 1999, Acetato e RTP) ou o da Revista Expresso de 16 de Março de 1991.[59] Se já por várias vezes não acedeu a pedidos de entrevistas, tal deve-se ao facto de considerar que, nessas ocasiões concretas, a isenção jornalística relativamente à sua pessoa não estava assegurada[60].

Citando fonte desconhecida, o tenente-coronel Pires Nunes[61] afirma sobre o então alferes Robles que “o seu heroísmo foi ter sido lançado às feras e sobrevivido". Da nossa parte, acrescentamos que o heroísmo, quer do jovem alferes, quer dos homens do seu pelotão, foi também o de terem tido a enorme coragem de cumprir as ordens que tinham, em circunstâncias em que tal se revelou extremamente difícil. E sem sofrer qualquer baixa. Mas, mais eloquente do que nós, é a portaria que concede a Fernando Robles a Medalha de Prata de Valor Militar com palma, com que viria a ser condecorado, e cujo texto deixamos aqui transcrito[62]:

“Condecorado com a Medalha de Prata de Valor Militar, com palma, por ter sido considerado ao abrigo do artigo 7.º, com referência ao § 1.º do artigo 51.º, do Regulamento da Medalha Militar, de 28 de Maio de 1946, o Alferes Miliciano de Infantaria, Fernando Augusto Colaço Leal Robles, que durante os largos meses em que serviu na Companhia de Caçadores 67, se evidenciou como oficial decidido e excepcionalmente audacioso, contribuindo com a sua rara abnegação, valentia e coragem para o êxito das múltiplas operações em que, com grande risco de vida, participou, designadamente na limitação das acções terroristas na região dos Dembos, na defesa e segurança interna da cidade de Luanda, na cobertura da fronteira norte e no patrulhamento das zonas particularmente perigosas de Piri, Vista Alegre e Cambamba".

Fernando Robles não foi nem o super-homem nem o assassino que, de um ou do outro lado do espectro político, quiseram fazer dele. Foi, isso sim, um militar do seu tempo, cuja coragem e espírito de auto-superação, por si só, constituem uma verdadeira lição de vida.

 

Imagens

CriançasMortas.jpg 

1. Crianças assassinadas pe​la UPA a 15 de Março de 1961. 
Créditos: Horácio Caio



Picada_Ucua_Pango_ArturFreitas.jpg 

 2. Picada nos Dembos, uma das muitas percorridas pela 6ª CCE. Note-se o tipo de terreno, altamente favorável a emboscadas
Fonte: perfil do Coronel Artur Freitas na rede social Facebook (republicação autorizada para este artigo)



Robles_Condec_RTP.jpg 

 3. O alferes milº Fernando Robles é condecorado pelo Presidente da República, Américo Tomás
Créditos: Arquivo RTP


 

Notas

[1] Cf., p. ex., Charulla de Azevedo, João, A pequena coluna militar comandada pelo moço alferes Robles, in jornal “O Comércio", Luanda, 24 de Março de 1961.

[2] Cf, p. ex., jornal “Avante", ano 32, série 6, n.º 324.

[3] Testemunho de Holden Roberto in Furtado, Joaquim, A Guerra, ep. 1, RTP, 2007.

[4] Cf. https://history.state.gov/historicaldocuments/frus1964-68v24/d442 (acervo eletrónico de documentos históricos do Governo dos EUA).

[5] Sobre o CIOE e a criação das primeiras companhias de caçadores especiais, ver, Silva, António José dos Santos, CIOE – Da Guerra do Ultramar aos Dias de Hoje, Nova Arrancada, Lisboa, 2002, p. 48 e seguintes - não obstante uma ligeira imprecisão no que toca à lista de comandantes dessas companhias na pág. 51.

[6] Ver Nota 3.

[7] CECA/EME, Resenha Histórico-Militar das Campanhas de África (1961-1974), Lisboa, 1998, Vol. I, pp. 274-275.

[8] Cf, p. ex., Afonso, Aniceto e Gomes, C. Matos (coord.), Os anos da Guerra Colonial, Vol. 2, QuidNovi, Matosinhos, 2000 – onde se chega ao ponto de afirmar (p. 42) “Na zona norte, a mais exposta aos ataques, não existia nenhuma unidade militar"; ou Mateus, Dalila e Mateus, Álvaro, Angola 61, Texto, Lisboa, 2011, pp. 117-120.

[9] Cf., p. ex., Martins, Fernando, Como Salazar preparou a guerra colonial, in jornal Observador, 9 de Agosto de 2014; Alexandre, Valentim, Os desastres da guerra, Círculo de Leitores, Lisboa 2021, p. 151 e seg.; Reis, Bruno Cardoso, Mitos na resposta militar do regime em 1961, in jornal Público, 23 de Julho de 2021.

[10] Artigo citado, ver nota 9.

[11] Op. Cit., ver nota 9.

[12] Artigo citado, ver nota 9.

[13] A título de exemplo, leia-se a seguinte mensagem “muito secreta" do Secretariado_Geral da Defesa Nacional para o Quartel-General em Luanda, datada de 1 de Março: “(...) informação origem estrangeira duas fontes, comunicam serem de esperar incidentes tipo terrorismo região Norte de Angola, a partir de 5 de Março. Mesmas fontes não prevêem levantamentos gerais, mas só ataques isolados fim de provocar repressão auxílio apresentação caso Angola Conselho Segurança ONU", in CECA/EME, Resenha Histórico-Militar das Campanhas de África (1961-1974), Lisboa, 1998, Vol. VI, Tomo I, Angola – Livro I, p. 164.

[14] Citado por Alexandre, Valentim, op. cit., p. 144.

[15] Entrevista realizada pelo autor por correio electrónico a 17 de Março de 2020.

[16] A propósito das relações laborais e casos de infracção da lei que, por vezes, ocorriam, leia-se ainda os excertos da reportagem do jornalista brasileiro Mário Morais e os comentários a esses mesmos excertos, in CECA/EME, Resenha Histórico-Militar das Campanhas de África (1961-1974), Lisboa, 1998, Vol. VI, Tomo I, Angola – Livro I, p. 143.

[17] Furtado, Joaquim, op. cit., ep. 1.

[18] Angola Mártir – Reportagens dos jornais de Luanda de 20 de Março a 19 de Julho de 1961, Agência Geral do Ultramar, Lisboa, 1961

[19] Ver, p. ex., a história do cabo Pedro Baptista, in Barão da Cunha, Manuel - Tempo Africano. Aquelas longas horas em sete andamentos, CM Oeiras, Oeiras, 2008, pp 65-68 e 255-268 e testemunho de José Mateus Lelo in Furtado, Joaquim, idem.

[20] Cf. testemunhos pessoais do COR INF Rebocho Vaz, in Rebocho Vaz, Camilo - Norte de Angola, 1961: a Verdade e os Mitos, Coimbra, 1993 e do Furriel José Lopes Pereira (recolhido e gravado pelo autor deste artigo por via digital), militar incorporado em 1961 (EAMA e RINL) e em cujo grupo de combate existiam bacongos que permaneceram sempre do lado português.

[21] CECA/EME, Resenha Histórico-Militar das Campanhas de África (1961-1974), Lisboa, 1998, Vol. 2, p. 53.

[22] Ver, p. ex., Jornal de Angola, 20 de Novembro de 2020, pp. 22-23, com relato da adesão total da população da zona de Quipedro à revolta.

[23] Ver, p. ex., os testemunhos do COR INF Rebocho Vaz, op. cit., do furriel mil. António Bucho (6ª CCE) e do soldado Jorge Leite dos Santos (CCaç 135, integrada no BCaç. 132) (ambos recolhidos pelo autor através de entrevistas em plataforma electrónica, respectivamente a 7 de Outubro e a 5 de Novembro de 2021).

[24] Testemunho do soldado Jorge Leite dos Santos, ver nota anterior.

[25] CECA/EME, Resenha Histórico-Militar das Campanhas de África (1961-1974), Lisboa, 1998, Vol. VI, Tomo I, Angola – Livro I, p. 269.

[26] Arquivo Histórico Militar 2/6/163/14.

[27] Ver resumo do histórico operacional da 6ª CCE, disponível no portal online “Dos veteranos da Guerra do Ultramar", em http://ultramar.terraweb.biz/RMA/Imagens_RMA_6CCE_CCE67.htm, que nos foi confirmado pelo testemunho do COR INF Fernando Robles, registado em 28 de Março de 2018.

[28] Testemunho do COR INF Fernando Robles, registado pelo autor, em 28 de Março de 2018.

[29] Ver Nota 27.

[30] Ver Cabrita, Felícia, 1961: os dias da raiva, in Revista Expresso, 16 de Março de 1991.

[31] Alguns deles compilados em Angola Mártir – Reportagens dos jornais de Luanda de 20 de Março a 19 de Julho de 1961, Agência Geral do Ultramar, Lisboa, 1961

[32] Ver Notas 1 e 2 e Pires Nunes, A. L., Angola 1961 - Da Baixa de Cassange a Nambuangongo, Prefácio, Lisboa, 2005, p. 112.

[33] Ver Nota 1.

[34] Op. cit., idem.

[35] Ver nota 28.

[36] As fontes das informações relativas ao percurso da coluna e as ocorrências durante a sua missão nos Dembos abaixo referidas são, excepto indicação em contrário: Charulla de Azevedo, João, art. cit., e o próprio coronel Fernando Robles (ver nota 28).

[37] Barreiros, A., A verdade sobre os acontecimentos em Angola, Carmona, 1961.

[38] Angola Mártir ..., p. 20.

[39] Cabrita, Felícia – “O 1º dia do fim do Império", in Revista Expresso de 14/03/1998, p. 48.

[40] A prática de canibalismo por parte dos revoltosos durante este período encontra-se amplamente atestada por várias fontes, cf. Pires Nunes, A. L., op. cit., p. 103. De resto, barbaridades semelhantes às aqui descritas são ainda hoje praticadas no Congo, de acordo com um relatório da ONU de 2018, citado pela Agência Reuters (cf. https://www.reuters.com/article/us-congo-violence-un-idUSKBN1JT2CF - em inglês).

[41] As fontes diferem quanto à duração desta operação. Da nossa parte, socorremo-nos de Caio, Horácio, Angola – Os dias do desespero, edição do autor, Lisboa, 1961, pp. 60-62, que refere ter estado com o alferes Robles em Aldeia Viçosa a 2 de Abril, data que afirma ser a véspera do regresso previsto do pelotão deste último a Luanda. Sabemos hoje, contudo, que esse regresso acabaria por ser adiado por alguns dias, devido a atraso na rendição e ao ataque sofrido por elementos da 7ª CCE no Cólua (ver nota 28).

[42] Ver nota 28.

[43] A boa convivência foi-nos referida verbalmente pelo próprio. Para consultar as fotografias em questão, visitar: http://ww3.aeje.pt/avcultur/Secjeste/Arkidigi/Cambamba.htm ; http://ww3.aeje.pt/avcultur/Secjeste/Arkidigi/VistAlegre01.htm

[44] Revista Expresso de 16 de Março de 1991, Lisboa, p. 10 (caixa).

[45] Ver nota 28.

[46] Segundo o coronel Fernando Robles, este é um dos vários episódios descritos no conto de O alferes Robles cujo relato não corresponde exactamente à verdade (cf. Ventura, Reis Sangue no capim - Cenas da guerra em Angola, ed. autor, Luanda, 1962

[47] Angola Mártir, p. 14.

[48] Ver nota 28.

[49] Cf. depoimento de Álvaro Silva Tavares sobre o alferes Robles, in Furtado, Joaquim, op. cit., e p. 3; ver nota 28.

[50] Op. cit., p. 175. De salientar que, nas notas correspondentes à coluna do alferes Robles (p. 436), uma das duas notas da obra de Pélissier para as quais Valentim Alexandre remete (p. 536) nem sequer diz respeito a esta coluna, mas sim a acontecimentos ocorridos na Fazenda Primavera (Madimba), situada a centenas de quilómetros do local onde o 3º pelotão da CCE atuou em Março/Abril de 1961.

[51] Éditions Pélissier, Orgeval, 1978, p. 532.

[52] Les Angolais, Éd. de Minuit, Paris, 1965

[53] Trata-se de Honório Fortes, futuro membro do PAIGC e Ministro da Defesa de Cabo Verde.

[54] Cabrita, Felícia – “O 1º dia do fim do Império", in Revista Expresso de 14/03/1998, p. 8.

[55] Artigo republicado em vários locais, ams originariamente disponibilizado no blogue do autor, em https://micaias.blogs.sapo.pt/24254.html

[56] A Guerra de Angola, 1961-1974, Matosinhos, QuidNovi (2010), p. 69.

[57] Ver nota 28.

[58] Disponível na plataforma Youtube em canal não oficial da produtora: https://www.youtube.com/watch?v=vvgkgZQLwqU

[59] P. 10 (caixa).

[60] Ver nota 28.

[61] Op. cit., p. 112.

[6​2] Portaria de 22 de Janeiro de 1963, que concede a condecoração, publicada na OE n.º 3 - 2.ª série, de 1963.​



PAULO RODRIGUES

Licenciado em LLM​ pela Universidade Nova de Lisboa (FCSH), trabalhou no projecto editorial da versão portuguesa da História da Humanidade (UNESCO), da Editorial Verb, coordenando a tradução dos capítulos referentes à Europa. É estudioso da Guerra de África (1961-1975) no Teatro de Operações de Angola, com artigos sobre o tema publicados na imprensa.


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​Como citar este texto:

RODRIGUES, Paulo – A Propósito da Primeira Incursão da 6.ª Companhia de Caçadores Especiais nos Dembos: Alguns Mitos e Realidades na Angola de 1961​. Revista Portuguesa de História Militar - Dossier: Início da Guerra de África 1961-1965. [Em linha]. Ano I, nº 1 (2021). [Consultado em ...], https://doi.org/10.56092/BMGE1401

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