Ir para o conteúdo principal

​​

BATALHA DA SALGA E BATALHA DAS MÓS. DOIS CONFLITOS ARMADOS NA ILHA TERCEIRA NO INÍCIO DA UNIÃO IBÉRICA 1581-1583



Humberto Nuno de Oliveira

Luís Silveira




Resumo

O conflito armado é um evento extremo, que acontece quando dois ou mais atores geopolíticos não conseguem encontrar uma solução para que os desenvolvimentos das respetivas agendas estratégicas possam coexistir pacificamente, é sempre uma catástrofe de origem e natureza antropológica, cujo resultado independentemente de servir uma ou outra agenda estratégica, acaba sempre por ser a desgraça daqueles que por várias razões se encontram na janela de espaço e de tempo em que o conflito se desenvolve.

O presente trabalho trata de dois conflitos armados que tiveram lugar na ilha Terceira no início da União Ibérica, e que na historiografia ficaram conhecidos por “Batalha da Salga", que aconteceu em 25 de julho de 1581, e por “Batalha das Mós", travada em 26 e 27 de julho de 1583, tendo sido a ilha Terceira palco desta catástrofe duas vezes no espaço de dois anos.

Estes dois conflitos armados tratados neste trabalho que não fogem à definição supramencionada, acontecem no âmbito do esforço expedicionário desenvolvido no início da penúltima década do século XVI por Filipe II de Espanha, I de Portugal, no sentido da instituição da autoridade da coroa também nas ilhas dos Açores que se encontravam desalinhadas politicamente com a União Ibérica.

O resultado deste esforço expedicionário foi a instituição do status quo pró-filipino nestas ilhas, passando estas a estar integradas numa entidade política que foi a União Ibérica, à semelhança do que já tinha acontecido com o demais território do reino, situação que se manteve por seis décadas até à restauração de 1640.

Palavras-chave: União ibérica; Filipe II de Espanha; Filipe I de Portugal; D. Sebastião; D António; Prior do Crato; Crise dinástica de 1580; Guerra da restauração.

 

Abstract

The armed conflict is an extreme event, which happens when two or more geopolitical actors are unable to find a solution so that the developments of their respective strategic agendas can coexist peacefully. It is always a catastrophe of anthropological origin and nature, the result of which, regardless of whether it serves one or another strategic agenda, always ends up being the misfortune of those who, for various reasons, find themselves in the window of space and time in which the conflict develops.

This work is about two armed conflicts that took place on Terceira Island at the beginning of the Iberian Union, and that in historiography were known as “Batalha da Salga" which took place on July 25, 1581, and “Batalha das Mós" which took place on July 26 and 27 1583, being Terceira island the scenario of this catastrophe twice in the space of two years.

These two armed conflicts discussed in this work, which do not deviate from the aforementioned definition, took place within the scope of the expeditionary effort carried out at the beginning of the penultimate decade of the 16th century by Philip II of Spain, I of Portugal, intending the institution of the crown authority also in the Islands of the Azores, that were politically misaligned with the Iberian Union.

The result of this expeditionary effort was the institution of the pro-Filipino status quo on these islands, which became integrated into a political entity that was the Iberian Union, similar to what had already happened with the other territories of the kingdom, a situation that remained for six decades until the 1640 Restoration of Independence.​

Keywords: Iberian Union; Philip II of Spain; Philip I of Portugal; D. Sebastião; D Antonio, Prior do Crato; Dynastic crisis of 1580; Restoration War.

 

 

 

Antecedentes

Após o desastre de Alcácer Quibir, em 04 de agosto de 1578, sucede a D. Sebastião o seu tio, o cardeal D. Henrique, que morre em 1580 sem deixar descendência, originando a crise da sucessão de 1580. Na sequência da crise, afiguraram-se várias intenções de solução política, entre as quais a de D. António “o Prior do Crato" e a de Filipe II de Espanha, que acabou por suceder ao Cardeal como Filipe I de Portugal, terminando assim a dinastia de Avis e tendo início a dinastia Filipina.

Filipe II de Espanha, ao ser jurado Filipe I de Portugal nas cortes de Tomar, outorgou 24 capítulos que constituíram um compromisso político: no reino de Portugal o Vice-rei seria português; a língua oficial seria o português; a moeda seria portuguesa e a bandeira seriam a portuguesas; os cargos, privilégios e mercês seriam para os portugueses e não para espanhóis. De acordo com este compromisso, o reino de Portugal seria uma entidade política distinta e a União Ibérica só o seria por via do Rei.

Este paradigma geopolítico de independência dos reinos vigorou no reinado de Filipe I de Portugal, mas mais tarde com Filipe III foi alterado, tendo sido comprometida a independência do reino de Portugal, o que originou, no final da quarta década de seiscentos, o processo da “Restauração da Independência".

Na ilha Terceira foi muito clara a divisão entre partidários de Filipe I e de D. António. Entre os partidários de Filipe I estavam as principais famílias, os proprietários ricos, os mercadores, e os membros do alto clero (como o Bispo de Angra). Entre os partidários de D. António estavam os elementos do povo e do clero de baixa estirpe[1].

Vários aspetos favoreceram a rebeldia da ilha Terceira. O afastamento geográfico entre o arquipélago e o reino, não sendo fácil a uma armada atacar a ilha a não ser no Verão. A existência na Terceira de um líder credível, Ciprião de Figueiredo, capaz de funcionar como agente aglutinador e potenciador da causa de D. António. E o interesse da Inglaterra, da França e da Holanda no enfraquecimento da Espanha através do compromisso do controlo da navegação atlântica[2].

Filipe I, no início do seu reinado, é então confrontado com a resistência do Corregedor Geral dos Açores, Ciprião de Figueiredo, que sendo partidário da solução política de D. António “o Prior do Crato", impede o estacionamento de um contingente militar espanhol na Ilha Terceira. Contudo, para o monarca era vital o estacionamento deste contingente militar, uma vez que estavam em pleno desenvolvimento as rotas comerciais da Índia e do Brasil e, sendo a baía de Angra um ancoradouro de excelência, que permitia a paragem dos navios para aguada, reparação e descanso das tripulações na fase de regresso e final das viagens, mas com o risco associado do corso e da pirataria que ameaçavam esta operação, sobretudo enquanto os navios estavam fundeados, mas também na fase final da viagem, da ilha Terceira até aos portos de Lisboa, Sevilha ou Cádis.

Face à irredutibilidade de Ciprião de Figueiredo na fidelidade a D. António, e malsucedidas as diligências diplomáticas de Filipe I no sentido de o corregedor reconsiderar o seu alinhamento, o monarca decide intervir militarmente na ilha Terceira.

 

A Batalha da Salga

Em 1581, Filipe despacha uma armada para os Açores comandada por D. Pedro de Valdez com instruções para não efetuar qualquer tentativa militar de ocupação das ilhas resistentes até que recebesse reforços que, entretanto, foram preparados. Levava cartas para o governo de Angra e instruções para diligenciar a redução pacífica das ilhas rebeldes à obediência do monarca. Está também mandatado para esperar a armada das Índias Orientais e garantir a sua segurança no trânsito entre os Açores e os portos de Lisboa e Sevilha.

No início da primavera, a armada encontrava-se junto da ilha de Santa Maria, saindo do porto com sete naus grandes e mil soldados embarcados, rumando para a ilha de S. Miguel, que tinha por governador Ambrósio D´Aguiar Coutinho. Nesta ilha incorporou D. Juan Valdez, seu primo e mestre de campo, assim como outras embarcações, e rumou com a armada até à ilha Terceira[3]. Ao amanhecer do dia 05[4] 08[5] ou 15[6] de julho (nos primeiros dias de julho), esta armada apareceu à vista de Angra pela parte leste com 08 galeões, um pataxo e uma caravela que vinha por mexeriqueira(reconhecimento).

O aparecimento desta armada suscitou preocupação mas também expetativa da parte dos naturais, uma vez que ainda não era percetível a respetiva intenção. Na ilha Terceira, os partidários de D. António esperavam que a armada fosse o socorro de França e Inglaterra, que tinha sido prometida. Os afetos a Filipe I esperavam que fosse para sujeitar a ilha. No entanto, os partidários de D. António desvalorizaram a eventual ameaça por lhes parecer que a armada seria demasiado pequena para intentar uma conquista militar da ilha, caso fosse inimiga.

Em breve ficou esclarecida a intenção da armada, quando os navios passaram em frente ao porto de Angra e efetuaram uma série de tiros de artilharia para a cidade, os navios velejaram todo o dia ao largo da cidade e à noite as naus lançaram batéis para, de madrugada, e a coberto do Monte Brasil, apreenderem algum barco de pesca, para recolha de informações acerca do estado da ilha. Na terceira noite conseguiram capturar uma embarcação de pesca cuja tripulação foi levada a bordo do navio almirante. Interrogada, foi mandada regressar a terra com recado para o Governador Ciprião de Figueiredo e demais autoridades do governo da terra: deviam-se entregar à obediência de Filipe, que estava disposto a perdoar toda a resistência que tinha sido feita, e que ainda lhes faria outras mercês de grande conveniência para todos eles. No caso da persistência na rebeldia, seria lançada pela armada uma operação para submeter militarmente a ilha.

Estas diligências por parte de D. Pedro de Valdez foram efetuadas reiteradamente, mas não surtiram qualquer tipo de efeito, pois a maior parte da população estava do lado do corregedor, enquanto partidários da causa de D. António.

A armada esteve nestas operações à vista de Angra quase 10 dias[7]. O Rei Filipe toma conhecimento que exceto São Miguel e Santa Maria, todas as outras ilhas estavam rebeldes, e a consciência da necessidade de investir mais na conquista da Terceira. Faz preparar uma armada incumbindo o comando ao mestre de campo D. Lope de Figueiroa, a qual após estar pronta ruma imediatamente aos Açores a fim de integrar a armada de D. Pedro de Valdez e assim efetuar as operações militares de submissão das ilhas rebeldes à obediência do monarca[8].

Quando D. Pedro de Valdez toma conhecimento da vinda da armada de D. Lope de Figueiroa e que este vinha mandatado para ser o comandante de toda a operação, decide iniciar a operação militar de submissão da ilha Terceira sem esperar pela incorporação das duas armadas, seguindo o conselho do seu primo D. Juan Valdez. Esta decisão foi baseada na leitura que, entretanto, fez acerca da facilidade com que conseguiria submeter militarmente a ilha, ganhando assim a glória de ser o comandante expugnador.

D. Pedro de Valdez decide efetuar o desembarque num lugar onde algumas vezes os seus soldados tinham desembarcado para buscar alguns mantimentos e falar com os portugueses, sem que estes os impedissem, ficando também assim a saber que os portugueses partidários de Filipe I estavam recolhidos no interior da ilha. O plano era lançar em terra soldados que se lhes juntassem e dirigir a força à cidade de Angra para a ocupar e controlar, e então ocupar posições fortificadas na ilha. Esperaria então pela chegada de D. Lope de Figueiroa, que era previsto que não levaria muito tempo a acontecer.

Em terra, e ao longo da costa, em lugares onde foi entendido que o desembarque poderia ocorrer, foram colocadas vigias que funcionavam de dia e de noite, por forma a ser dado o alerta oportuno acerca de qualquer desenvolvimento por parte da armada, sobretudo qualquer tentativa de desembarque. Foram também construídas trincheiras e, em alguns lugares, colocadas peças de artilharia.

No dia 24 de julho, a armada foi deslocada para junto da costa da vila de S. Sebastião, a SE da ilha, uma vez que aquela parte da costa tinha algumas enseadas e o terreno era baixo, o que facilitava o desembarque. O plano de D. Pedro de Valdez[9] consistiu em:

  • Efetuar um bloqueio sobre a cidade de Angra com duas naus;
  •  Com um grupo de quatro naus e uma caravela, comandado por D. Juan de Valdez, bloquear a vila da Praia, batendo com artilharia naval o caminho entre esta e a vila de S. Sebastião, no sentido de impedir o reforço de tropa portuguesa a partir da vila da Praia;
  • Com um grupo constituído pelo galeão almirante, uma caravela, um patacho, e sete barcaças de desembarque, dirigir-se à baía da Salga para efetuar o desembarque, tendo sido designada como força de desembarque um efetivo de 330 arcabuzeiros e 20 artilheiros, sob o comando do seu filho Diego de Valdez.


Na tarde do dia 24, foi efetuado o transbordo dos soldados, por forma a ficarem distribuídos pelos três grupos de navios conforme o objetivo de cada um. O grupo comandado por D. Juan de Valdez iniciou o trânsito para o largo da vila da Praia ao início da noite e, pouco tempo depois, seguiu para a baía da Salga o grupo do navio almirante com D. Pedro de Valdez, por forma a lá chegar quando o primeiro grupo já estivesse a bloquear a vila da Praia[10]. No dia 25, pela madrugada, D. Pedro de Valdez faz desembarcar 200 soldados e algumas peças de artilharia no lugar conhecido de Casa da Salga, que fica a cerca de uma milha a Sul de São Sebastião. A aproximação das embarcações de desembarque é detetada pelo vigia que estava na Ponta dos Coelhos, situada do lado oeste da baía da Salga. Chegando ao Porto Judeu, deu de imediato o alarme, tocou a rebate o sino da igreja de Santo António.

O desembarque dos 200 soldados foi efetuado sem grande resistência, pois as ordenanças que guarneciam o lugar da Salga, face à sua desvantagem numérica, apenas efetuaram alguns tiros de arcabuz e retiraram. Os espanhóis progrediram no terreno, desenvolveram numa frente da largura do terreno plano e ocuparam um dispositivo defensivo com a profundidade suficiente para que o desembarque continuasse fora do contacto com os defensores, nomeadamente de mais duas levas[11], que já traziam piqueiros e os trens de combate[12]. Ao nascer do sol, já teriam desembarcado cerca de 500 soldados espanhóis.

Por esta altura a resistência era efetuada por cerca de 50 ordenanças portuguesas.

Entretanto, o aviso do desembarque chega à cidade de Angra e à vila da Praia. As ordenanças são reunidas e, cerca das nove horas da manhã, chegam ao lugar da Salga nove companhias de ordenanças e um destacamento de tropa francesa da nau Eschalim, totalizando cerca de 3000[13] ou 6000[14] ordenanças.

O bloqueio da movimentação de reforços da vila da Praia não foi eficaz, porque as condições de mar e os ventos contrários (NW) não permitiram que o caminho entre a vila da Praia e a vila de S. Sebastião fosse batido pela artilharia naval dos navios de D. Juan de Valdez[15]. E foram ignoradas as ordens de D. Pedro de Valdez no sentido de os soldados espanhóis ocuparem posições num monte sobranceiro à baía (o cabeço de cota 148 a situado a este) e aí se entrincheirassem, no sentido de ser controlado o desembarque a partir de uma posição dominante[16]. Contudo, porque os soldados estavam motivados pelo saque, a progressão no terreno foi efetuada passando pelos objetivos de saque na parte mais baixa do terreno.

As ordenanças ocuparam posições na parte sobranceira do terreno e os soldados espanhóis, face à desvantagem numérica, ocuparam posições defensivas, ficando contidos na bolsa, mas conseguindo estabelecer uma testa-de-ponte com a profundidade suficiente para garantir o desembarque do restante contingente fora de contato[17]. O desembarque continuou, tendo acabado por serem colocados em terra cerca de 1000 soldados[18]. Cerca do meio-dia, D. Pedro de Valdez ao constatar este impasse, encontrando-se em terra, decide embarcar, para a partir do navio almirante preparar o reforço que fosse necessário[19].

Ocorreram algumas escaramuças entre a vanguarda espanhola e as ordenanças portuguesas, que resultaram em alguns mortos e muitos feridos[20], dos quais dezassete mortos portugueses pelo meio-dia[21]. Os soldados espanhóis lançaram fogo às searas de trigo que existiam no vale, que naquela altura estavam secas[22], com o vento do quadrante NW[23] (o eixo do ataque espanhol era N), pelo que à medida que os soldados progrediam no terreno, iam queimando as searas atrás de si, o que causou um grande sentimento de revolta nas hostes portuguesas.

Cerca da uma hora da tarde os portugueses decidem pressionar a bolsa efetuando um contra-ataque e, para maior eficácia, são reunidas duas manadas de gado a partir das imediações do campo de batalha. Os animais são dispostos pelos pastores na frente de ataque e a progressão é efetuada a coberto dos animais, que são empurrados com aguilhoadas e gritos dos combatentes portugueses. Face a este desenvolvimento, os espanhóis arriscaram reforçar a frente e cravaram piques[24] na tentativa de deter o ataque, o que se revelou catastrófico, porque apostando tudo na frente perderam capacidade de resistência em profundidade e, em caso de rotura, perderiam a batalha.

A progressão efetuada desta forma pelos portugueses revelou-se eficaz, porque conferiu proteção e poder de choque no ataque, conseguindo assim com maior segurança e rapidez romper as linhas espanholas em toda a frente, quebrando a integridade do dispositivo e desorganizando as hostes espanholas, que passaram a retirar de forma desorganizada, ficando assim vulneráveis ao ataque português[25]. O que acontece a seguir é a perseguição e a morte dos soldados espanhóis que já só queriam embarcar para salvar as suas vidas e, pressionados entre os portugueses em muito maior número, e a linha de costa, as embarcações de desembarque não conseguiam aproximar-se da costa para a recolha dos soldados, pelos muitos tiros de arcabuz que os portugueses lhes faziam. A maior parte dos soldados espanhóis acabou por morrer à mão dos portugueses. Alguns, na tentativa desesperada de embarcar, lançaram-se à água sem terem tido tempo de retirar as armaduras e morreram afogados. Dos mais de 1000 soldados apenas se salvaram aqueles que conseguiram retirar as armaduras e a nado conseguiram chegar à caravela que andava junto da costa (pouco mais de 50)[26].

O corregedor Ciprião de Figueiredo ordena a retirada imediata dos portugueses de junto da costa, para evitar o risco de estes serem batidos pela artilharia dos navios que se encontravam junto da baía, ordem que não conseguiu evitar o massacre dos soldados espanhóis[27].

Terminada a batalha, D. Pedro de Valdez retirou com a armada de bandeiras arriadas em sinal do grande pesar pela tragédia que tinha acabado de acontecer.

Em resultado da batalha morreram os já referidos 17 portugueses[28], ficando feridos um número muito superior e de acordo com as fontes coevas é admissível que tenham morrido mais de 400 soldados espanhóis[29], pois de todo o contingente que desembarcou só se conseguiram salvar pouco mais de 50[30].

 

Depois da batalha

Foram mobilizados lavradores a partir dos lugares vizinhos e da vila da Praia que com carros de bois recolheram a grande quantidade de cadáveres que ficaram no campo de batalha e os depositaram em vala comum, poços que anteriormente tinham sido escavados na tentativa de captação de água junto da povoação do Porto Judeu[31] Os despojos foram recolhidos do campo de batalha, armaduras, capacetes, espadas, arcabuzes e frascos de pólvora[32].

A armada de D. Pedro de Valdez ainda continuou a navegar ao largo da ilha Terceira até à primeira semana do mês de agosto, altura em que a ela se juntou a frota das Índias de Castela (80 embarcações), mas quatro dias depois esta frota continuou viagem [33]. No início do mês de setembro apareceu finalmente à vista da ilha a armada de D. Lope de Figueiroa (40 embarcações) que se juntou à armada de D. Pedro de Valdez, afastando-se seguida as duas armadas da ilha[34].. D. Pedro de Valdez ainda tentou recorrer aos navios da armada das Índias Ocidentais para tentar novo ataque mas por recusa dos comandantes dos navios não conseguiu e, quando depois integrou a armada de D. Lope de Figueiroa, também não se entendeu com este, não tendo havido mais nenhuma tentativa de ataque. Ficaram assim ambas as armadas a navegar ao largo da ilha sem nunca desembarcar, até ao seu afastamento, em setembro, quando a mudança das condições de mar e a escassez de víveres obrigaram as armadas a retirar dos Açores[35].

Após a batalha, o corregedor Ciprião de Figueiredo toma consciência da necessidade de reorganização das ordenanças, reduzindo o efetivo das companhias[36], sendo possível deste modo constituir mais companhias, e nomeando os comandantes das mesmas entre os da sua confiança[37]. Foi também criada uma companhia de gente a cavalo, no sentido de ser mais eficaz o sistema de vigilância, alerta e comando e controlo[38]. Só em Angra foram constituídas 20 companhias de gente a pé e uma de gente a cavalo[39]. Foi também desenvolvido um esforço intenso de fortificação da ilha pois, excetuando o forte de S. Sebastião na ponta E da baía de Angra, a restante costa da ilha não estava fortificada[40]. Foi então construído o forte de Santo António na ponta W da baía de Angra, ficando deste modo o acesso de embarcações à baía controlado. Também foram construídas ao longo da costa da ilha Terceira um conjunto de fortificações e trincheiras em lugares de costa mais expugnável onde foi considerado mais importante fortificar[41].

Antes da batalha da Salga, a presença militar estrangeira nos Açores é pouco significativa, limitando-se a um pequeno contingente espanhol estacionado em São Miguel (ilha que já aderira à causa Filipina), e um escasso número de franceses chegados a Angra sob o comando de A. Scalin. A derrota de D. Pedro de Valdez na Salga, obriga os atores envolvidos a encararem de modo diferente a questão dos Açores. A França e a Inglaterra, após esta vitória conseguida na ilha Terceira pela população, acreditam mais na possibilidade de opor uma efetiva resistência a Filipe, através do aumento substancial, em meios humanos e materiais, do apoio que já prestavam a D. António. Por sua vez, os espanhóis perdem a esperança de conseguir a submissão pacífica da Terceira[42].

Batalha da Salga.jpeg

                                                                     Azulejo alusivo à batalha da Salga existente na baía da Salga (2017)



Conclusão

A tentativa falhada de ocupação da ilha terceira em 1581, ou “Batalha da Salga" como é referida na historiografia, é uma operação militar mal sucedida, levada a cabo por Pedro de Valdez que é mandatado por Filipe para submeter a ilha pacificamente, mas para o caso de não o conseguir, esperar pela integração da sua armada na armada de D. Lope de Figueroa, no sentido de ser desencadeada uma operação militar de ocupação da ilha com maior probabilidade de sucesso.

Fracassada a tentativa pacífica de submissão, D. Pedro de Valdez, no reconhecimento que efetua à ilha Terceira, acaba por ficar convencido de que com a sua armada de 10 navios e 1000 soldados consegue submeter militarmente a ilha.

Na ilha existia capacidade de mobilização de alguns milhares de ordenanças para a defender, que apesar de não serem soldados profissionais são em número muito superior ao contingente de Valdez. A armada de D. Pedro de Valdez, devido ao reduzido número de navios, não tinha capacidade para efetuar manobra de diversão em vários pontos no sentido de conseguir o efeito de surpresa acerca do local de desembarque. D. Pedro de Valdez comandava um contingente que não tinha tamanho para enfrentar a resistência, no entanto, conseguiu desembarcar e estabelecer uma testa-de-ponte com a profundidade suficiente que permitiu o desembarque do restante contingente em segurança, mas como não conseguiu controlar o terreno elevado adjacente e face à resistência que encontra, fica contido numa bolsa, não lhe sendo possível ultrapassar a testa-de-ponte e continuar a progressão.

Face ao contra-ataque que foi desenvolvido pelas ordenanças portuguesas em número muito superior, optou por reforçar a testa-de-ponte numa tentativa desesperada de deter o contra-ataque em vez de romper o contacto e retirar, empenhando assim a totalidade do efetivo e, consequentemente, perdendo a liberdade de ação, a flexibilidade de manobra e a capacidade de resistência em profundidade.

Os portugueses efetuaram o contra-ataque a coberto dos animais e descendo o terreno[43], face à sua esmagadora superioridade numérica, o resultado do contacto foi a fuga desordenada dos soldados espanhóis. O fator decisivo nesta operação foi a leitura errada do ambiente operacional por D. Pedro de Valdez e a decisão de efetuar o desembarque numa situação de franco desequilíbrio do potencial relativo de combate em favor dos portugueses[44].

 

A Batalha das Mós

Após o início da “União Ibérica", a segunda expedição enviada aos Açores é uma armada comandada por D. Lope de Figueroa, constituída por um efetivo de cerca de dois mil a dois mil e duzentos homens, embarcados em cinco naus e navios de grande porte, em número não determinado. Armada esta que partiu de Lisboa em finais de junho, e deveria juntar-se à de D. Pedro de Valdez, atacando ambas a ilha Terceira. Chegada aos Açores, a armada estacionou primeiro em S. Miguel e, após a junção à de D. Pedro de Valdés, passaram a circundar a ilha Terceira, mas sem nunca desembarcar. As razões para tal prendem-se com a derrota na Salga, com a não-aceitação das propostas de D. Pedro de Valdez a D. Lope de Figueroa para o desembarque e com o pessimismo que se instalou a bordo das armadas face à ideia de que a vitória na Salga tinha dado ânimo suficiente aos terceirenses para uma resistência tenaz. Em setembro, com o agravamento das condições de mar e também com a escassez de víveres, as armadas retiraram-se para o reino. 

A terceira expedição enviada por Filipe I foi claramente formada com o objetivo principal de conquistar a ilha Terceira. Foi comandada pelo Marquês de Santa Cruz, D. Álvaro de Bazan, e reuniu doze mil homens embarcados em vinte e oito naus e cinco patachos pequenos. Esta armada chegou a S. Miguel em 20 de julho de 1582, e avistou a armada de D. António “o Prior do Crato" junto a Ponta Delgada. Depois de alguns dias de impasse, com as armadas frente a frente, deu-se a batalha naval ao largo de de Vila Franca do Campo. D. Álvaro de Bazan, numa manobra bem-sucedida, fez atrasar um dos seus navios para ser atacado pela armada de D. António, enquanto que com o grosso da frota deu uma volta ao largo e atacou-a pela retaguarda. Foram destruídos dez navios da Armada de Filippo Strozzi (o Tenente-geral da armada e do exército dos franceses ao serviço de D. António), e vários outros tinham desertado antes da batalha acontecer. Apesar da superioridade numérica gaulesa, a derrota deveu-se à astúcia de D. Álvaro de Bazan e aos desentendimentos entre D. António e Filipo Srorzzi sobre a forma de combater o Marquês. Nesta batalha foram capturados trezentos e noventa e três franceses que, desembarcados em Vila Franca, foram julgados, condenados à morte e executados. Entretanto, o Marquês optou por não atacar a ilha Terceira devido ao desgaste na batalha de Vila Franca, ao atraso na chegada do reforço esperado e à necessidade de apoiar a Armada das Índias, tendo empreendido o regresso ao reino em finais de agosto. 

 

Preparação da expedição

No sentido de acabar de vez com a rebeldia, Filipe I toma medidas desde o início de 1583 com o objetivo de se antecipar à chegada à ilha Terceira da nova ajuda francesa, e também antes que os locais tivessem oportunidade de desenvolver a fortificação da ilha que estava em curso.

Em 10 de fevereiro de 1583, Filipe emite instruções ao Marquês de Santa Cruz, no sentido de ser reunida uma armada no Tejo junto à cidade de Lisboa com Gente de Guerra que deverá embarcar nela, e que esta força expedicionária possa partir no final do mês e maio ou, no limite, em meados do mês de abril, antes que pudessem chegar à ilha Terceira os navios que poderiam ser aprontados em França.

Por esta altura estão concentrados em Lisboa 55 navios e 7 barcaças de desembarque, tendo D. Álvaro de Bazan sido encarregue por Filipe da sua integração na armada, bem como da sua preparação para a expedição, enquanto outros 34 navios estão sendo também integrados e preparados nos portos do Cantábrico sob a supervisão de Garcia de Arce (Capitão General da província de Guipúscoa, norte de Espanha) com ordens do rei para serem preparados de forma a estarem em Lisboa de 10 a 15 de março de 1583. D. Francés de Alava (Capitão General da Artilharia da Corona) tem ordens para prover os navios da armada de artilharia, pólvora, armas, munições e outros apetrechos de guerra, tendo também a seu cargo o aprovisionamento da armada para seis meses de operação[45].

Entretanto, o monarca constata que para cumprir o objetivo fixado é necessário acelerar os preparativos no que concerne à aguada e embarque de mantimentos (esta tarefa normalmente atrasa a saída da armada), o período compreendido entre as instruções iniciais e o limite imposto de meados de abril, constitui um prazo muito curto para serem cumpridas as múltiplas tarefas conducentes à preparação de uma armada com a constituição proposta pelo Marquês de Santa Cruz (100 embarcações de todos os tipos e 15.000 homens de mar e guerra).

As instruções de Filipe ao Marquês de Santa Cruz não só contêm ordens para a preparação da armada, mas também as contém relativas ao aspeto geral do cumprimento da jornada[46]. Destaca em primeiro lugar a tarefa de destruir armadas ou navios inimigos que vão em socorro da ilha Terceira, sendo que para cumprir esta tarefa D. Álvaro de Bazán deverá permanecer embarcado durante a operação, cabendo a D. Lope de Figueiroa a condução do desembarque e da invasão. Só no caso de ausência de ameaça naval é que D. Álvaro de Bazán desembarcará, mas deixará no comando da armada pessoa capacitada e gente de guerra suficiente para destruir qualquer ameaça naval à própria armada ou de apoio ao inimigo[47].

D. Álvaro de Bazán vai mandatado para, antes de qualquer intervenção militar na ilha Terceira, diligenciar a obediência da ilha ao monarca espanhol e só no caso de esta diligência ser malsucedida, é que a operação militar seria executada. Neste mandato, a mesma política deverá ser seguida para a redução das ilhas do Faial, de São Jorge e demais ilhas rebeldes à obediência do monarca[48]. A última instrução emitida por Filipe, datada de 6 de junho de 1583, em San Lorenzo do Escorial, define que o objetivo prioritário da operação militar é a ilha Terceira e as demais ilhas rebeldes constituem objetivos secundários.

 

Esforço francês de intervenção nos Açores

A derrota de 26 de julho de 1582, ao largo de Vila Franca, da armada de Filippo Strozzi ao serviço de D. António o Prior do Crato, apanhou de rompante a corte de Paris, e enquanto se buscam responsáveis entre os comandantes franceses, empreende-se um esforço de organização de uma nova armada para vingar o fracasso.

Mas não existem em França navios em quantidade e qualidade para se oporem aos da armada espanhola e enquanto Henrique III está empenhado em obter navios e armamento, a sua mãe Catarina de Médicis também se empenha em repetidos pedidos de ajuda aos países escandinavos e às cidades mercantis do norte da Europa. Este processo diplomático requer algum tempo, mas a preparação da armada é acelerada, pois é sabido que Filipe I prepara também a expedição à ilha Terceira[49].

Em França, é atribuída ao Comendador Aymar de Chastes uma força constituída por 15 navios dotados de pólvora, munição, armas, material de engenharia militar e 100 peças de artilharia pesada para reforçar a que já está instalada na ilha Terceira. 1000 ou 1200 homens de guerra constituem o contingente de combate. Outros 500 soldados franceses permanecem na ilha desde o verão de 1582, procedentes das tropas embarcadas na armada de Strozzi assim como uma companhia de ingleses. Segundo o Prior do Crato, existem na ilha entre 6000 e 7000 portugueses armados às ordenas do corregedor Manuel da Silva, no entanto valores mais fidedignos apontam para um dispositivo entre os 3000 e os 4000 homens.

Antes que o comendador de Chastes tivesse tempo de se assegurar das condições de sucesso da expedição francesa aos Açores, e no dia 17 de maio de 1593 é obrigado a partir, pressionado por Catarina de Médicis, é conhecida a notícia do embarque em Lisboa da força expedicionária organizada por D. Álvaro de Bazán[50].

 

Defesa da ilha Terceira – dispositivo luso-francês

A geografia da ilha, designadamente a morfologia do terreno e as características da linha de costa, favorecem a sua defesa contra qualquer ataque de uma força através do mar, e os recursos naturais, assim como a existência de trigo armazenado, permitem a manutenção de uma considerável força defensiva. Por outro lado, desde o sucesso em repelir o desembarque espanhol na Salga em 1581, tinha sido desenvolvido um esforço de fortificação da ilha, aproveitando as vantagens defensivas do terreno. Assim, o Prior do Crato tem motivos para estar otimista e confiante na capacidade de Chastes em impedir o intento de ocupação da ilha por D. Álvaro de Bazán.

A cidade de Angra e a vila da Praia são as povoações mais importantes da ilha e situam-se nos extremos da zona provável de desembarque (costa SE da ilha). Na Praia Chastes instala o seu quartel-general e estaciona 400 soldados franceses, quatro companhias de ordenanças portuguesas e 60 estafetas a cavalo designados para percorrer a costa, vigiar e comunicar os movimentos do inimigo, assim como uma forte defesa de artilharia defendendo a linha de costa.

A defesa de Angra assenta também na numerosa artilhara instalada nos fortes que a circundam assim como na artilharia dos 31 navios fundeados na baía, mais do que no contingente de 300 homens ali estacionado, optando assim por empregar a artilharia naval em defesa de Angra, em detrimento da vantagem da capacidade de manobra da força naval que poderia criar uma ameaça significativa à operação de desembarque de D. Álvaro de Bazán.

O mestre de campo de Chastes, Monsieur Caravaques, com 250 soldados franceses e mais de 1000 homens às ordens do corregedor Manuel da Silva Coutinho, seguirão por terra os movimentos da armada espanhola instalados nos vinhedos ao longo da costa entre o Porto Judeu e a vila da Praia, para contra-atacar e impedir o estabelecimento de uma testa-de-ponte [51]. Desde a sua chegada em 14 de junho de 1593, Chastes reorganiza[52] a defesa da ilha com base num dispositivo de fortes, 44 no total e 300 peças de artilharia pesada instaladas na costa sul e leste, mais vulnerável aos ataques pelo mar.

 

Movimento da armada de D. Álvaro de Bazán até ao objetivo

Em 18 de junho de 1583, D. Álvaro de Bazán comunica a Filipe que a armada está pronta para se dirigir aos Açores, e a 23 de junho parte do estuário do Tejo.

A armada é constituída por 91 navios, levando a reboque 7 barcaças de desembarque, deslocando 20.217 toneladas, tripuladas por 3.823 homens de mar e 2.708 homens de remo, armadas com 700 peças de artilharia, e transportando 8.841 homens de guerra, que depois de integrar em São Miguel mais 2.300 soldados do terço de infantaria de Augustin Iñiguez totalizam 11.441 homens de guerra[53].

Foi desenvolvido um grande esforço logístico para a dotação desta força que ultrapassou os 15.000 homens, com quase 1.000 peças de artilharia, e milhares de mosquetes e arcabuzes. Durante quatro meses foi aprovisionada pólvora, munições, alimentos e material sanitário, tendo sido incluído um hospital de campanha com pessoal, medicamentos, instrumentos de cirurgia e camas.

A viagem até aos Açores foi feita com ventos escassos de bolina e no dia 3 de julho, o capitão Diego Medrano chega a São Miguel com um grupo de galeras, chegando a restante armada a 13 de julho, fundeando os navios em Vila Franca e Ponta Delgada para fazer aguada e embarcar o contingente de Augustin de Iñiguez[54].

No dia 22 de julho, quando os vigias da ilha Terceira assinalam a presença da armada de D. Álvaro de Bazán, instala-se o pânico na ilha e três naus da armada de Chastes desertam, apesar das diligências deste, tendo o comendador seguido as naus a bordo de um patacho durante uma parte do trajeto de retirada[55].

Enquanto a armada de D. Álvaro de Bazán estava fundeada, este destacou um emissário com uma proposta do rei no sentido da rendição aos rebeldes, prometendo a saída livre dos estrangeiros com armas, bandeiras e bagagens. Mas o enviado, o português Manuel Gonçalves Rebelo, foi recebido com muito fogo de artilharia, de mosquete e de arcabuz, salvando por pouco a vida.

Perante o fracasso desta embaixada de paz, o Marquês de Santa Cruz envia numa pequena embarcação uma carta ao governador rebelde Manuel da Silva e para reforçar a sua intenção, enviou também o seu estado-maior numa galera, escoltada por dois navios, que acompanharam a pequena embarcação com portugueses a bordo também, à baía de Angra. Esta embaixada foi também repelida por intenso fogo da artilharia colocada nas fortificações que defendiam a cidade, tendo os enviados conseguido chegar à costa a nado[56].

 

Reconhecimento da costa e seleção do local de desembarque

No dia 23 de julho, enquanto a armada se encontrava fundeada ao largo de S. Sebastião, D. Álvaro de Bazan embarca numa galera para reconhecer a ilha, acompanhado pelos elementos do seu conselho e pelos engenheiros militares e percorreu a costa sul da ilha entre a Praia e Angra. O resultado preliminar deste reconhecimento, foi que a parte da costa favorável ao desembarque seria no Porto Judeu em frente aos ilhéus; no dia 24 é efetuado pelo Marquês de Santa Cruz novo reconhecimento, mas um reconhecimento efetuado no dia 25 pelos mestres de campo Francisco de Bobadilla e Augustin de Iñiguez, concluiu que o lugar mais favorável ao desembarque seria uma baía conhecida por “Baía das Mós", situada na parte SE da ilha a meia distância entre a cidade de Angra e a vila da Praia, e em sede de concelho com os mestres de campo é tomada a decisão por parte do Marquês de o desembarque ser efetuado nessa baía[57].

A decisão de ser efetuado o desembarque na Baía das Mós assentou nas seguintes razões [58]:

  • Só existir um forte junto à trincheira ali existente, o que comparativamente com os outros locais constituía uma capacidade de resistência mais baixa;
  • Porque esta baía ficava a uma distância sensivelmente igual da cidade de Angra e da vila da Praia, fazendo com que o reforço fosse mais demorado;
  • Dada a existência de um pequeno ilhéu a E da baía, se este fosse ocupado permitiria a partir daí bater os defensores;
  • O local de desembarque ser próximo do ancoradouro da armada. 
  • As fortificações defensivas no lugar de desembarque selecionado consistem numa trincheira de pedra de 80 metros de extensão com 2,5 metros de espessura e 3 metros de altura, um forte com 2 canhões à esquerda da trincheira e uma posição com outra peça de artilharia à direita. Outra trincheira em forma de arco situada a cerca de 16 metros à retaguarda da anterior, construída com terra, com 1,8 metros de espessura e 2 metros de altura, reforçando a defesa da baía em profundidade[59].


Preparativos para o desembarque

No dia 24 de madrugada as galeras da armada dirigem-se à Praia para efetuar reconhecimento, tendo efetuado alguns tiros de canhão e retirado ao nascer do sol, e no dia 25 fizeram novo reconhecimento também à Praia durante a noite tendo efetuado tiros de canhão e de arcabuz, tendo-se retirado antes do nascer do sol[60].

No dia 25 de julho, D. Álvaro e os capitães dedicam-se à organização final do desembarque; D. Lope de Figueroa organiza o contingente que vai desembarcar, colocando os homens nas barcaças, patachos e chalupas que se irão dirigir a terra, este contingente é da ordem dos 4.000 a 4.500 homens[61].

Cerca da meia-noite de 25 de julho, o pessoal está embarcado nas galeras prontas para efetuar a aproximação à baía das Mós, 10 delas carregadas de gente, e levando a reboque 4 ou 5 barcaças de desembarque e chalupas. As outras 2 galeras irão para o largo da vila da Praia para bater com tiro de artilharia os fortes em ação de diversão[62]. Nesse dia, o corregedor Manuel da Silva, receando que a expedição pretendesse assediar o porto da Praia, fez deslocar para esta muitos homens que defendiam a baía das Mós[63]

 

O Desembarque

Na madrugada do dia 26 de julho de 1583, embarca D. Álvaro de Bazán na nau almirante, acompanhado pelo mestre de campo D. Lope de Figueroa, assim como outros elementos do seu estado-maior, iniciando as 10 galeras a sua aproximação à baía das Mós.

Pela madrugada, ao chegar a uma distância de um tiro de arcabuz da baía, a nau almirante adianta-se para dar sinal de largar os reboques, começando a aproximação das embarcações que se dirigem a terra para o desembarque, seguidamente as galeras iniciam a preparação de artilharia, efetuando tiro sobre as posições defensivas.

Perante este inesperado ataque, os defensores efetuam tiros da artilharia que está nas fortificações e acodem às trincheiras para efetuar tiro de arcabuz sobre os atacantes que desembarcam, mas apenas o canhão que está posicionado no flanco esquerdo da trincheira consegue efetuar tiro contínuo sobre os atacantes[64].

A rebentação dificulta o desembarque, mas não o impede, uns acabam por abordar terra com as embarcações de fundo chato e através de pranchões, outros transpõem com dificuldade a rocha de basalto negro, outros saltam para a água e assim conseguem efetuar a abordagem a terra[65].

Batalha das Mós.jpeg

Pintura de La desembarcación y asalto", gravura em folha de cobre, incorporada na obra de Cristóbal Mosquera de Figueroa “Comentario em breue compendio de disciplina militar: em que se escriue La jornada de lãs islãs de los Açores", en Madrid por Luis Sánchez, 1596.

 

A defesa da baía era efetuada pelo capitão Bourguignon com uma companhia constituída por 50 franceses e 200 portugueses, que se batem contra os atacantes, mas estes apesar de estarem carregados com armamento completo, munições e aprovisionamentos para três dias, são soldados experientes e conseguem aproximar e assaltar a trincheira apesar da sua altura. Perante a pressão dos atacantes, os portugueses retiram, deixando na trincheira apenas os franceses, que sofrem 35 mortes, entre eles o capitão Bourguignon[66].

O assalto às trincheiras durou pouco tempo, em cerca de meia hora os espanhóis conseguiram consolidar o objetivo de assalto, ocupando as posições fortificadas, formando assim uma testa-de-ponte.

Desde a vila da Praia e posições portuguesas próximas acodem reforços, solicitados mediante sinais de fumo e repique dos sinos das igrejas, mas o mestre de campo Francisco de Bobadilla ordena com rapidez a reorganização do dispositivo das companhias, colocando atiradores de arcabuz nos flancos da testa-de-ponte.

O mestre de campo Augustin Iñiguez guarnece com atiradores de arcabuz os dois cabeços que flanqueiam o lugar de desembarque (.148 e .117) e o capitão Augustin de Herrera desloca-se com um grupo de arcabuzeiros para ocupar uma posição forte a sul do dispositivo para intercetar reforços vindos do lado de Angra.

O Marquês de Santa Cruz e o mestre de campo D. Lope de Figueroa chegam a terra com a primeira leva de desembarque, são tomadas medidas para fazer face à chegada de reforços e é decidido a continuação do ataque para conquistar a vila de São Sebastião[67].

As companhias dos capitães La Grave e Mayet acodem desde o Porto Judeu quando as tropas espanholas já tinham consolidado a testa-de-ponte e deste modo adotaram uma posição defensiva, atendendo à sua inferioridade numérica, esperando a vinda do reforço do comendador de Chastes com tropa da vila da Praia (400 franceses e 4 companhias de portugueses num total de 1.000 homens).

As forças luso-francesas que foram repelidas das suas posições defensivas junto da costa, assim como os com os reforços entretanto chegados, estabeleceram-se mais à retaguarda na parte sul do arrabalde de S. Sebastião, com os portugueses à direita (W) e os franceses à esquerda (L)[68].

A tropa do comendador ocupa uma posição defensiva na colina a este de São Sebastião (.214), e pela parte espanhola é preparada a segunda leva de desembarque que traz consigo a artilharia de campanha, sendo desembarcados cinco canhões das galeras que passam a constituir a base de fogos de artilharia para apoiar a progressão das tropas para o interior da ilha[69].

Para desalojar os franceses entrincheirados na colina, é desenvolvido um ataque com grupos de mosqueteiros e arcabuzeiros que conseguem ocupar a primeira trincheira, mas o ataque é repelido na segunda trincheira, com consideráveis baixas. A tropa do comendador tinha colocado oito peças de artilharia, e a sua posição dominante facilita o fogo defensivo. Os ataques e contra-ataques em torno da colina sucedem-se todo o dia, até que no final do dia, a infantaria de D. Lope de Figueroa, consegue envolver as tropas do comendador, obrigando-as a abandonar as suas posições, 70 mortos e 300 feridos da parte espanhola resultaram deste combate[70].

Entretanto, da parte da tarde ou no final do dia, aparece o corregedor Manuel da Silva com 1.000 homens e uma manada de 300 ou 400 vacas para serem lançadas sobre os espanhóis, numa tentativa de repetir o sucesso obtido dois anos antes na baía da Salga, mas esta tática não chega a ser empregue[71], porque, entretanto, cai a noite e o comendador já tinha desistido de atacar[72].

A intervenção deste reforço por parte do corregedor Manuel da Silva acontece tardiamente, muitas horas após o desembarque das forças espanholas (no mínimo nove horas depois de se ter começado a combater em terra), este reforço teria sido muito importante nos primeiros momentos do combate quando a testa-de-ponte ainda não estava consolidada[73].

Durante a noite os espanhóis permanecem em dispositivo defensivo, no sentido de frustrar qualquer contra-ataque. Pela madrugada é efetuado o deslocamento até à vila de São Sebastião (no flanco direito o terço de D. Lope de Figueroa, no centro os terços de Bobadilla e Iñiguez e os alemães, e na ala esquerda o terço de D. Juan de Sandoval), pelo que os franceses abandonam em retirada ordenada até Angra, enquanto os portugueses se dispersam ao ver a aproximação da tropa espanhola, que mantém o ímpeto da progressão.

Para explorar o sucesso, D. Álvaro de Bazán não perde tempo e força o deslocamento por terra até Angra, com D. Lope de Figueroa e 500 arcabuzeiros na vanguarda e dá ordem para que as galeras ataquem os navios fundeados na baía de Angra, no sentido de evitar que os franceses se antecipem e ofereçam resistência na cidade[74]. D. Álvaro de Bazán atribui a D. Lope de Figueroa a missão de efetuar a exploração do sucesso e atingir rapidamente o objetivo decisivo que é a ocupação da cidade de Angra, apesar de o terço de infantaria de D. Lope de Figueroa ter sido o que sofreu maior desgaste por se ter deslocado no flanco direito do eixo Baía das Mós – S. Sebastião e ter conquistado o ponto de cota 214 a NE de S. Sebastião (terreno elevado adjacente ao eixo de progressão importante para o controlo da ocupação desta povoação), resultando deste desenvolvimento tático pesadas baixas para o Terço de D. Lope de Figueroa.

D. Álvaro de Bazán sabe que os franceses estão a retirar ordenadamente para a cidade de Angra, sabe que a cidade é fortificada e uma vez ocupada pelos franceses, estes poderão fazer uma grande resistência à sua ocupação pelas forças espanholas, por isso D. Álvaro de Bazán quer explorar o sucesso com oportunidade, ocupar rapidamente a cidade de Angra de modo a não dar tempo aos franceses de organizar a resistência nesta cidade.

Seria lógico que para a exploração do sucesso fosse designada outra unidade menos desgastada que o Terço de Infantaria de D. Lope de Figueroa, no entanto, é este que recebe a missão. A historiografia é omissa relativamente às alterações de composição e articulação da força expedicionária ao longo da operação, mas certamente em S. Sebastião houve uma reorganização da força, tendo o Terço de D. Lope de Figueroa recebido 500 arcabuzeiros para a exploração do sucesso e a razão desta reorganização terá sido porque no mandato de Filipe, D. Lope de Figueroa é que seria o comandante da operação terrestre e então D. Álvaro quis-lhe conceder a honra de ser este o comandante que atinge o objetivo tático decisivo (aquele que materializa o cumprimento da missão – a cidade de Angra). 

O comendador decide refugiar-se nos fortes da cidade para organizar a resistência, apoiado na logística dos navios fundeados na baía, mas a isto se opõe Manuel da Silva, aludindo que os fortes da cidade só têm capacidade para alojar 200 homens. Perante esta negativa, o comendador desloca-se com o seu contingente para o interior da ilha, para se refugiar na montanha localizada a sul da Agualva, propícia para uma resistência tenaz.

Também o corregedor Manuel da Silva se retira para o interior da ilha com o propósito de organizar a resistência contra os atacantes e esperar pela chegada de reforços de França, porque sabe qua não terá clemência se cair nas mãos dos ocupantes.

A cidade de Angra foi ocupada sem resistência, assim como os navios na baía, porque os habitantes tinham escapado com os seus pertences mais valiosos para o interior da ilha.

Seguidamente teve lugar o saque que tinha sido autorizado por três dias pelo Marquês de Santa Cruz: 

primeiro os soldados, logo a maruja, e ultimamente os turcos e a canhalha que vinha nas galés, os quaes até os ferrolhos das portas arrancavam, quando não achavam outra cousa, forçando aquelas que achavam fechadas, abrindo-as a golpes de machados, e com os malhos dos 5 ferreiros que naquelle tempo haviam na rua da Guarita, da parte do nascente, por onde o exército entrava."[75].

Assim que o Marquês entrou na cidade de Angra, mandou que fossem colocadas guardas nos locais de culto, a fim de impedir o saque nestes locais[76].

Apesar de o saque ter sido autorizado só por 3 dias, na verdade este durou mais de 10 dias e foi feito com extrema violência, apesar das rigorosas ordens do Marquês para que fosse restabelecida a ordem, ordens que tiveram um efeito perverso, pois os soldados temendo serem castigados por serem descobertos a saquear para além dos 3 dias, matavam os espoliados[77].

O facto de os soldados espanhóis estarem empenhados no saque em detrimento da postura defensiva, foi identificado por parte do lado português como uma vulnerabilidade e da capitania da Praia foram reunidos 5.000 homens capazes de pegar em armas para efetuar um contra-ataque à cidade de Angra, no dia 01 de agosto. Este plano foi proposto ao comendador que estava instalado com o seu contingente na região da Agualva, tendo sido reunido um conselho para este fim, mas o plano foi denunciado ao Marquês de Santa Cruz[78].

Na sequência desta denúncia o marquês mandou anunciar que perdoava o crime de rebelião a todos os naturais da ilha, pelo que estes se podiam recolher a suas casas e cuidar das suas fazendas, da mesma forma perdoava os soldados, bem como os seus oficiais, se estes se apresentassem no prazo de 3 dias e aos soldados estrangeiros lhes daria embarcação segura para saírem da ilha[79].

Em observância do pregão do Marquês, cuja cópia foi entregue ao comendador, este em conselho com o seu mestre de campo, Monsieur Caravaque e demais capitães portugueses, decidiu capitular debaixo das condições oferecidas, atendendo ao desequilíbrio das forças em presença[80].

No dia 31 de julho, o comendador com o seu contingente de soldados franceses e ingleses deslocou-se para a cidade de Angra e foram recebidos e tratados com a devida honra, tendo embarcado com destino a França no dia 3 de agosto, em 4 navios com os mantimentos necessários para a viagem, levando pilotos, mestres e marinheiros franceses [81].

Em virtude desta capitulação, o Marquês de Santa Cruz ficou com a posse pacífica da ilha, ficando afastada a ameaça de qualquer ação militar contra a ocupação espanhola.

 

Conclusão

Obtida a vitória, o marquês de Santa Cruz permaneceu alguns dias na ilha Terceira, e para além de ter estabelecido o acordo de rendição do contingente francês e inglês que se encontrava na ilha, mandou libertar os apoiantes de Filipe que se encontravam presos às ordens de Manuel da Silva, este foi detido assim como outros defensores da causa de D. António e após um processo sumariamente instruído pelo auditor-geral da armada, procedeu-se à execução de muitos deles. Uns foram enforcados e outros degolados conforme o respetivo estatuto social. Manuel da Silva foi degolado[82].

D. Álvaro de Bazán fez ainda instalar na Terceira o governo de Juan D´Urbina e assistiu à chegada das naus das índias Ocidentais e Orientais. Regressou a Lisboa em meados de setembro. Os reais ou supostos partidários do Prior do Crato continuaram a ser perseguidos nos anos seguintes[83].

A conquista da ilha Terceira em 1583, ou batalha das Mós (como é referida na historiografia), é uma operação militar bem-sucedida, levada a cabo por D. Álvaro de Bazán, que é mandatado por Filipe para submeter a ilha pacificamente, mas para o caso de não o conseguir, intervir militarmente. D. Álvaro comanda uma armada com navios suficientes para efetuar uma operação naval, com manobras de diversão em vários pontos da costa da ilha, para conseguir o efeito de surpresa acerca do local de desembarque, comanda um contingente expedicionário com um tamanho suficiente para ter sucesso na operação terrestre, estabelece uma testa-de-ponte com o tamanho e profundidade suficientes que permitem o desembarque em segurança do restante contingente, apoia a manobra terrestre com fogos de artilharia (artilharia naval no desembarque e terrestre na progressão), tem forças suficientes para ultrapassar a testa de ponte e desenvolver a missão ulterior, controla o terreno elevado nas imediações do eixo de progressão, coordena a manobra terrestre com a naval fixando e reduzindo resistências, explora o sucesso com oportunidade e atinge rapidamente o objetivo tático decisivo. 

Da parte portuguesa faltou integridade na ação de comando (desarticulação entre o corregedor e o comendador) e por outro lado houve um deficit de liderança na parte portuguesa, os efetivos eram em número inferior e, apesar de o contingente francês e inglês ser formado por soldados profissionais, os portugueses eram tropa de ordenança (menos preparados). 

Considerar que o fator decisivo nesta operação foi simplesmente o desequilíbrio do potencial relativo de combate, ou seja, o facto de D. Álvaro de Bazán ter mais soldados que o Corregedor Manuel da Silva e o Comendador Aymar de Chastes, seria uma consideração demasiado redutora do que foi esta operação, será mais adequado considerar que a capacidade de comando e controlo, a maior experiência dos combatentes expedicionários de D. Álvaro de Bazán e também o desequilíbrio do potencial relativo de combate, foram os três aspetos que no seu conjunto constituíram o fator decisivo [84].

 

A ocupação da ilha e o paradigma político-militar vivido nela no período da União Ibérica (1583-1642)

A vitória de Filipe I sobre a ilha Terceira, implicou uma política de apaziguamento social, ao confirmar a designação, feita pelo Marquês de Santa Cruz, de D. Juan D'Urbina como Governador das ilhas, o monarca lembrava-lhe que fizesse tudo para que a gente de guerra não fizesse vexações aos locais, não dando assim ocasião a revoltas[85].

D. Juan D'Urbina concentrou poderes de caráter militar e judicial e interferiu em outros domínios, como na vida municipal. A partir de 1585, por disposição de Filipe, o governador ficou limitado a uma tutela meramente militar, passando a dividir os outros poderes com o Bispo e com o Corregedor. 

Apesar da disposição régia no sentido da limitação dos poderes dos governadores militares estes, em regra, e ao longo de todo o período da união ibérica, foram uma figura controversa e geradora de crispações com as autoridades locais, devido às recorrentes interferências com as tutelas destas autoridades (bispo, corregedor, provedores, câmaras e capitanias-mores). 

Também a presença de uma guarnição de soldados estrangeiros na ilha Terceira foi sempre mais um problema do que uma mais-valia, os pagamentos aos soldados espanhóis eram insuficientes e muitas vezes em atraso, os soldados cometiam furtos e ausentavam-se do estacionamento por períodos que iam até um e dois anos, vivendo de expedientes, o que fazia com que esta presença fosse um fator perturbador da paz social. Mas apesar de terem constituído, em regra, um problema para a população, paradoxalmente, ao longo do período espanhol houve uma integração social destes - entre 1583 e 1640 foram constituídos em Angra quatrocentos e oitenta e cinco agregados familiares, resultantes de casamentos entre soldados espanhóis e raparigas terceirenses (o Governador do castelo, mestre de campo D. Diego de Miranda Quirós desposou D. Joana de Melo, uma mulher da Terceira) [86], os primeiros assentos de casamento entre soldados espanhóis e moças terceirenses datam de 1584 e, mesmo após a retirada do contingente espanhol da ilha Terceira, quando da rendição do Castelo de S Filipe, muitos foram os que ficaram na ilha por serem casados nela. Não resta dúvida de que a presença do contingente espanhol na ilha Terceira, apesar dos problemas que causou, deixou uma marca genealógica numa população que, na altura, seria entre oito e nove mil habitantes. 

Ao longo do período de ocupação espanhola na ilha Terceira, o presídio (estacionamento de soldados) foi sendo sistematicamente reduzido no seu efetivo. O Terço de Infantaria de D. Juan D'Urbina tinha entre mil e quinhentos e dois mil soldados. Em 1600, no governo do mestre de campo D. Diego de Miranda Quirós, o efetivo do Terço foi reduzido de mil e setecentos para quinhentos soldados e, ao longo dos restantes quarenta anos, passou a oscilar em torno dos quatrocentos soldados. O Conselho de Guerra em Madrid (órgão que servia para assessorar Filipe acerca de assuntos militares) considerava que, na ilha Terceira, bastavam quinhentos homens, dos quais duzentos e cinquenta ou trezentos poderiam ser dos velhos, ou seja, dos que lá se achavam desde a conquista espanhola [87].

Foram recorrentes as queixas dos governadores do presídio e do Castelo para Madrid, dizendo que o efetivo era manifestamente insuficiente face à ameaça do corso e da pirataria, solicitando reforço de soldados. 

Filipe I, em virtude dos acontecimentos de 1581-1583 (resistência das ordenanças de Ciprião de Figueiredo ao desembarque de Pedro de Valdez na Salga, e das ordenanças de Manuel da Silva Coutinho ao desembarque de Álvaro de Bazan), tinha ordenado que as ordenanças fossem desarmadas e desmobilizadas. Mas, seis anos após a desmobilização, e face aos pedidos dos governadores bem como à dificuldade da coroa espanhola em destacar soldados para os Açores, o monarca vai autorizar a criação de companhias de soldados açorianos.

Face à inexistência de um exército regular, a função de segurança e defesa em Portugal antes do período da união ibérica, era executada pelo sistema de ordenanças, que foi instituído pelas ordenações sebásticas, mais especificamente pelo “Regimento dos Capitães-mores e mais Capitães e Oficiais das Companhias de gente de cavalo e de pé e da ordem que terão em se exercitarem", de 1570, vulgarmente designado por Regimento das Ordenanças de 1570, de D. Sebastião. Este regimento instituía a prestação de serviço militar obrigatório e gratuito a todos os homens válidos, dos 18 aos 60 anos. A estrutura responsável pela organização militar era a Capitania-mor (constituída por um Capitão-mor, um Sargento-mor e um Alferes-mor) que tinha por área de responsabilidade o concelho, e em regra, cada freguesia do concelho formava uma companhia de ordenanças comandada por um Capitão assistido por um Alferes e um Sargento (a companhia tinha um efetivo até 250 combatentes, agrupados em esquadras de 25 combatentes, comandadas por um Cabo), cada combatente era obrigado a ter armamento, que era arrolado em livro próprio [88].

Ao ser autorizada por Filipe I, a criação de companhias de soldados açorianos, e existindo uma matriz de organização militar pré-filipina (o sistema de ordenanças), o que vai acontecer é a reativação desta estrutura com a mobilização e o armamento das ordenanças, passando a coexistir dois tipos de tropa nos 50 anos seguintes: os soldados pagos do terço de infantaria espanhol e as ordenanças açorianas. O paradigma político-militar que é vivido na ilha Terceira no período da união ibérica, caracteriza-se pela existência de um governador militar, figura controversa e geradora de tensões com as autoridades locais, que tinha do seu lado 400 soldados espanhóis que constituíam mais um problema do que uma mais-valia, existindo do outro lado as autoridades locais (bispo, corregedor, provedores, câmaras e capitanias-mores) que tinham do seu lado as ordenanças, em número muito superior ao dos soldados espanhóis. Os soldados espanhóis eram soldados pagos do terço de infantaria (soldados profissionais, bem preparados e experientes), enquanto as ordenanças eram os habitantes organizados em milícias (menos preparados e experientes que os soldados pagos), o armamento e equipamento era semelhante nestes dois tipos de tropa, mas o grande desequilíbrio numérico, em favor das ordenanças, vai ter uma importância fundamental em 1641-1642, através de um outro conflito armado que foi a expulsão do último reduto de soldados espanhóis, o sítio e rendição do Castelo de S. Filipe.

 

Nota final

A irredutibilidade do Corregedor Geral dos Açores, Ciprião de Figueiredo, na sua fidelidade a D. António, o Prior do Crato, bem como o consequente desalinhamento político da ilha Terceira e demais ilhas rebeldes no último quartel do século XVI, obrigaram Filipe II de Espanha, I de Portugal, a desenvolver um grande esforço expedicionário no sentido da instituição da União Ibérica também nas ilhas rebeldes, uma vez que era vital o controlo político das ilhas dos Açores para a garantia da operação das rotas marítimas das Índias orientais e ocidentais nas condições de segurança e de apoio logístico necessárias.

O esforço expedicionário desenvolvido pelo monarca espanhol nos Açores consistiu em quatro expedições, totalizando um efetivo de trinta mil e quinhentos homens embarcados em cento e oitenta navios, o que constitui um volume significativo de forças face à população dos Açores (a população da ilha Terceira estaria entre os oito mil e os nove mil habitantes). A dimensão deste esforço é reveladora da importância estratégica que o controlo da região tinha para Filipe.

Por outro lado o processo de resistência desenvolvido nos Açores no início da União Ibérica em 1581-1583, bem como mais tarde no final desta, após a aclamação de D. João IV, com a expulsão do último reduto de presença militar espanhola (através do sítio e rendição da guarnição do Castelo de S. Filipe em 1641-1642), fez com que os súbditos da coroa, ilhéus no seu conjunto, sempre tendencialmente alinhados com soluções de independência, se fossem afirmando como um ator de um sistema político mais vasto, relevando também a centralidade dos Açores neste sistema complexo de entidades políticas como ducados, reinos e impérios com agendas políticas diversas e geradoras de conflitos armados.

 

Bibliografia

ARAÚJO Miguel Cristóvão de – A Batalha do Porto das Mós. Boletim do Instituto Histórico da Ilha Terceira n.º 17, 1959.

BÉLTRAN António Luiz Gomes – Batalla Naval de San Miguel, Operaciones navales españolas del siglo XVI, 1582-1582. Ediciones Platea SL, 2017.

BRAGA Paulo Drummond – Espanhóis, continentais e açoreanos. Um espaço para a libertação / História dos Açores, do descobrimento ao século XX. Volume I, Instituto Açoreano de Cultura, 2008.

CORDEYRO António – História Insulana. Presidência do Governo Regional dos Açores, 2007.

DRUMMOND Francisco Ferreira – Anais da Ilha Terceira. I Volume, Secretaria Regional da Educação e Cultura;

FARIA Manuel Augusto, “Distribuição Territorial e Composição Social das Companhias de Ordenanças dos Açores". In Boletim do Instituto Histórico da Ilha Terceira, LXII, 2004.

FIGUEROA Cristoval Mosquera de – Comentário en breve compêndio de disciplina militar en que se escrive la jornada de la isla de los Açores. Luiz Sanchez, 1596.

FRUTUOSO Gaspar – Saudades da Terra, livro sexto. Instituto Cultural de Ponta Delgada, 2011.

MALDONADO Manuel Luis – Fénix Angrense. I Volume, Secretaria Regional da Educação e Cultura.

MARTINEZ Ricardo Cerezo – “La conquista de la isla Tercera". In Revista de História Naval. Armada Espanhola, 1983.

MENESES Avelino de Freitas – Revista de História das Ideias / Revoltas e Revoluções / insegurança e revolta nas relações entre açorianos e soldados estrangeiros, Instituto de História e Teoria das Ideias. Faculdade de Letras da Universidade de Coimbra, 1984.

ENES Carlos – A Resistência Popular Terceirense a Filipe II. Discursos. Língua Cultura e Sociedade II, 2000.


 

NOTAS

[1] BRAGA, Paulo Drumond - Espanhóis, continentais e açorianos. Um espaço para a libertação / História dos Açores, do descobrimento ao século XXI, Volume I, Instituto Açoriano de Cultura, 2008, p. 238.

[2] Idem, p. 239.

[3] DRUMMOND, Francisco Ferreira, Anais da Ilha Terceira, I volume, Secretaria Regional da Educação e Cultura, 1981, p. 213.

[4] Ibidem, p. 213.

[5] Ibidem.

[6] MALDONADO, Manuel Luis, Fenix Angrense, 1º volume, Instituto Histórico da Ilha Terceira, 1990, p. 278.

[7] Idem, p. 279.

[8] BRAGA, Paulo Drumond, ob. cit., p. 246.

[9] BÉLTAN António Luis Gómez, Batalla Naval de San Miguel, Operaciones navales españolas del siglo XVI, 1581-1582, Ediciones Platea SL, 2017, p. 103.

[10] Ibidem.

[11] MALDONADO Manuel Luis, ob. cit., p. 281.

[12] Os trens de combate são o elemento de apoio logístico imediato ao combate, onde estão a pólvora e munições, víveres e apoio sanitário.

[13] MALDONADO, Manuel Luís, ob. cit, p. 281.

[14] DRUMMOND, Francisco Ferreira, ob. cit., p. 221 e BÉLTRAN, António Luis Gómez, ob. cit., p. 106.

[15] BÉLTRAN, António Luis Gómez, ob. cit., p. 106.

[16] BRAGA Paulo Drumond, ob. cit., p. 245.

[17] MALDONADO, Manuel Luis, ob. cit., p. 107.

[18] Idem, p. 281.

[19] Idem, p. 282.

[20] Ibidem, p. 282.

[21] DRUMMOND, Francisco Ferreira, ob. cit., p.223.

[22] O trigo estava maduro e estavam em curso as colheitas, dada a direção do vento (NW) e o eixo do ataque (N), a ação de incendiar as searas não constituiu nenhuma vantagem tática, terá sido motivada apenas por vandalismo.

[23] FRUTUOSO, Gaspar, Saudades da Terra, Livro Sexto, Instituto Cultural de Ponta Delgada, 1978, p. 157.

[24] MALDONADO, Manuel Luis, ob. cit., pp. 283 e 284.

[25] Idem, p. 284. 

Cf. António BÉLTRAN, Luis Gómez, quando a manada de animais estava próximo de atingir o dispositivo espanhol, foram criadas brechas para os animais passarem através do dispositivo, o que deu a oportunidade aos atacantes portugueses de atacarem a força espanhola, colocando-se nas brechas do dispositivo dividido, podendo bater de flanco e por partes os elementos desagragados, que acabaram lutando pela sua sobrevivência: ob. cit., pp. 107 e 108.

[26] MALDONADO Manuel Luís, ob. cit., p. 284.

[27] Ibidem, 1990, p. 285. DRUMMOND, Francisco Ferreira, ob. cit., p. 225.

[28] DRUMMOND, Francisco Ferreira, ob. cit., p. 225.

Cf. António BÉLTRAN, Luis Gómez, na historiografia portuguesa, as baixas do lado português estão subvalorizadas, atendendo à informação de Fernando de Macedo, enviado à ilha Terceira pelo Governador Ambrózio de Aguiar, e quando regressado a São Miguel em 07 de agosto de 1581, deu conta de que tinham sido realizados na ilha Terceira mais de 630 funerais imediatamente após o conflito.

[29] Na historiografia existe muita incoerência nos números das baixas do lado espanhol: Francisco Ferreira Drummond refere 400, mas admite que o número não é exato, atendendo a que desembarcaram mais de 1000 expedicionários e que no final da batalha só se salvaram cerca de 50 de acordo com as fontes coevas; Cf. Gaspar Frutuoso, foram enterrados nos poços no lugar da Salga 676 homens, tendo para além destes morrido muitos afogados ao tentar nadar para as embarcações; Cf. Pedro de Frias, in Crónica Del-Rei D. António, p. 53, foram mortos 760 soldados espanhóis para além dos que morreram afogados; Cf. António Béltran a historiografia portuguesa exagera a quantidade de baixas do lado espanhol, atendendo a que desembarcaram no máximo 400 homens de uma armada que tinha embarcado para esta expedição 600 soldados e 80 artilheiros.

[30] DRUMMOND, Francisco Ferreira, ob. cit., p. 225.

[31] MALDONADO, Manuel Luís, ob. cit., p. 285.

[32] FRUTUOSO, Gaspar, Saudades da Terra, ob. cit., p.160. 

CORDEYRO, António, História Insulana, Presidência do Governo Regional dos Açores / Direção Regional da Cultura, 2ª edição facsimilada, 2007, p. 361.

[33] MALDONADO, Manuel Luís, ob. cit., p. 287.

[34] Idem, p. 289.

[35] BRAGA, Paulo Drumond, ob. cit., p. 246.

[36] DRUMMOND, Francisco Ferreira, ob. cit., 1981, p. 229.

[37] MALDONADO Manuel Luis, ob. cit., p. 286.

[38] Ibidem, p. 286.

[39] DRUMMOND, Francisco Ferreira, ob. cit., p. 230.

[40] Ibidem, p. 230.

[41] Idem, pp. 231 a 233.

[42] MENESES, Avelino de Freitas de, Revista de História das Ideias / Revoltas e Revoluções / Insegurança e revolta nas relações entre açorianos e soldados estrangeiros, Instituto de História e Teoria das Ideias / Faculdade de Letras da Universidade de Coimbra, 1984, p. 195.

[43] O emprego dos animais não constituiu fator decisivo, mas conferiu proteção aos atacantes conseguindo estes efetuar o contra-ataque com um número de baixas inferior àquele que seria se não tivessem empregue os animais.

[44] Nos séculos XVI e XVII a operação de desembarque tático efetuava-se com o navio ao largo do local de desembarque, mas suficientemente próximo para poder bater com artilharia naval qualquer eventual resistência ao desembarque, seguindo-se o trânsito dos soldados do navio para terra em pequenas embarcações e a abordagem a terra. Para que esta operação fosse bem-sucedida seria importante que as condições de mar fossem favoráveis (que não houvesse muita ondulação) para que o navio tivesse estabilidade para efetuar tiro de artilharia naval ajustado e também para que o trânsito nas pequenas embarcações e a abordagem a terra fosse possível, seria também importante que as arribas da costa não fossem muito elevadas para facilitar a abordagem.

Este conjunto de condições ocorre com mais probabilidade nas baías, mas a morfologia do terreno que garante estas condições e facilita o desembarque, é a mesma que  constitui uma desvantagem tática quando os soldados estão colocados em terra, porque os estes ficam em terreno baixo com terreno elevado a toda a volta.

A forma de resolver de resolver este problema tático, é através da conjugação do fator surpresa com o estabelecimento oportuno de uma testa-de-ponte, que é um dispositivo que ao mesmo tempo isola uma área com o tamanho suficiente para que a restante força possa efetuar o desembarque e a organização para o combate fora do contato com o adversário e também controla toda a área adjacente a esta.

A testa-de-ponte é em sí um objetivo tático, mas a operação não se pode esgotar neste objetivo, para isso a força tem de ultrapassar a testa-de-ponte para cumprir os objetivos táticos subsequentes que no seu conjunto constituem o objetivo operacional.

D. Pedro de Valdez não teve capacidade pra resolver este problema, a força de que dispunha não tinha dimensão para, face à resistência que encontrou, ultrapassar a testa-de-ponte, tendo-se esgotado nesta.

[45] MARTINEZ Ricardo Cerezo, La conquista de la isla Tercera / Revista de História Naval, Instituto de História e Cultura Naval, Armada Espanhola, 1983, p. 9.

[46] Idem, p. 10.

[47] Idem, p. 11.

[48] Ibidem, p. 11.

[49] MARTINEZ Ricardo Cerezo, ob. cit., p. 12.

ARAÚJO Miguel Cristóvão de, Boletim do Instituto Histórico da Ilha Terceira, n.º 17, 1959, p. 200.

[50] MARTINEZ Ricardo Cerezo, ob. cit., p. 14.

[51] MARTINEZ Ricardo Cerezo, ob. cit., p. 16.

[52] O comendador De Chastes com base no reconhecimento que efetuou ao dispositivo defensivo da ilha, bem como na informação de que dispunha previamente através do Prior do Crato, concluiu que existiam lacunas e necessidades de ajustamento no dispositivo, e em resultado desta conclusão os soldados franceses são posicionados por forma a este ficar mais eficaz: cf. Miguel Cristóvão de Araújo, ob. cit., pp. 200 e 201).

[53] MARTINEZ Ricardo Cerezo, ob. cit., p. 17.

Relativamente a estes números, não existe uma correspondência exata entre a historiografia de Ricardo Cerezo Martinez e a de Miguel Cristóvão de Araújo, ob. cit., p. 193.No entanto as ordens de grandeza são semelhantes, sendo assim seguro admitir que a força expedicionária de D. Álvaro de Bazán fosse da ordem dos 15.000 homens embarcados numa centena de navios.

[54] MARTINEZ Ricardo Cerezo, ob. cit., p. 18.

Relativamente às datas da chegada da armada a S. Miguel, Ricardo Cerezo Martinez refere que um grupo de galeras chega a S. Miguel no dia 03 de julho de 1583 e a restante armada chega a 13 de julho de 1583: ob. cit., p. 18. Mas Miguel Cristóvão de Araújo refere que a chegada a S. Miguel é entre o dia 06 e 07 de julho de 1583, chegando a restante armada a 14 de julho de 1583, sendo assim seguro admitir que a chegada da armada a S. Miguel aconteceu nos primeiros dias do mês de julho de 1583.

[55] MARTINEZ Ricardo Cerezo, ob. cit., pp. 18. 19.

ARAÚJO, Miguel Cristóvão de, ob. cit., p. 196.

[56] MARTINEZ Ricardo Cerezo, ob. cit., p. 19.

ARAÚJO Miguel Cristóvão de, ob. cit., p. 202.

[57] Idem, p. 25.

[58] Idem, p. 198.

[59] MARTINEZ Ricardo Cerezo, ob. cit., p. 26.

[60]ARAÚJO Miguel Cristóvão de, ob. cit, p. 203.

[61] MARTINEZ Ricardo Cerezo, ob. cit., p. 26.

[62] Ibidem, p. 28.

[63] MALDONADO Manuel Luis, ob. cit., p. 339.

DRUMMOND Francisco Ferreira, ob. cit., p. 324.

[64] MARTINEZ Ricardo Cerezo, ob. cit., p. 29.

[65] Ibidem, p. 29.

ARAÚJO Miguel Cristóvão de, ob. cit, p. 206.

[66] MARTINEZ Ricardo Cerezo, ob. cit., p. 29.

[67] Idem, p. 30.

ARAÚJO Miguel Cristóvão de, ob. cit., p. 206.

Conforme la Relación de la jornada y conquista de la isla Tercera, cuja origem se atribui ao Marquês de Santa Cruz, a força de desembarque na primeira leva estaria constituída por 12 companhias do terço de D. Lope de Figueroa, 8 companhias do terço de D. Francisco de Bobadilla, 11 companhias do terço de Augustin Iñiguez, 7 companhias de Lisboa, 4 companhias da Andaluzia, 4 companhias do Porto, 3 companhias de italianos e 1 companhia de portugueses de D. Félix de Aragon, num total de 53 companhias.

[68] Idem, p. 208.

[69] Ibidem, p. 208.

[70] MARTINEZ Ricardo Cerezo, ob. cit., p. 30.

[71] Ibidem, p. 30.

[72]  Relativamente ao emprego do gado por parte da tropa portuguesa na tentativa de repetir o sucesso da batalha da Salga, a historiografia é incoerente: cf. Manuel Luis Madonado chegou a ser empregue o gado no confronto direto, mas sem sucesso porque o ataque foi repelido; cf. Gaspar Frutuoso o gado foi empregue e o dispositivo espanhol reagiu abrindo brechas para o gado passar e fechando-as imediatamente à passagem do gado tendo repelido o ataque; cf. Francisco Ferreira Drummond o gado também foi empregue tendo o marquês de Santa Cruz mandado cerrar fileiras face ao desenvolvimento do ataque, abrindo-as para o gado passar e fechando-as imediatamente à passagem, repelindo o ataque português; cf. Ricardo Cerezo Martinez foi reunida uma manada de 300 a 400 vacas mas estas não foram empregues porque entretanto caiu a noite e o comendador desistiu de atacar inviabilizando a ofensiva do corregedor; cf. Paulo Drumond Braga foi afastada a hipótese que Manuel da Silva colocou de se empregar gado no ataque sobre os invasores, não tendo havido entendimento entre este e o comendador.

[73] ARAÚJO Miguel Cristóvão de, ob. cit., pp. 209 e 210.

[74] MARTINEZ Ricardo Cerezo, ob. cit., p. 31.

[75] DRUMMOND Francisco Ferreira, ob. cit., p. 338.

[76] Ibidem, p. 340.

MALDONADO Manuel Luis, ob. cit., p. 345.

[77] DRUMMOND Francisco Ferreira, ob. cit., p. 339.

[78] Ibidem, p. 342.

MALDONADO Manuel Luis, ob. cit., p. 347.

[79] DRUMMOND Francisco Ferreira, ob. cit., p. 342.

[80] Idem, p. 343.

[81] Idem, p. 344.

[82] BRAGA Paulo Drumond, ob. cit., p. 249.

[83] Idem, p. 250.

[84] Na doutrina militar moderna, existe um princípio que diz que uma força que desenvolve uma operação ofensiva, para ter sucesso deve ter um potencial relativo de combate no mínimo de 3:1 relativamente ao adversário para compensar a sua desvantagem pré-existente, (este princípio assenta nos pressupostos de que a força que defende, conhece melhor o terreno e tem oportunidade para organizar as posições defensivas escolhendo criteriosamente o terreno que lhe confere mais vantagem tática, poderá ter a população do seu lado e deste modo hostil ao ofensor, em regra tem as linhas de abastecimento mais curtas e assim mais facilidade na sustentação logística, por outro lado a força que ataca não conhece tão bem o terreno, no caso de ser uma força expedicionária tem o desgaste do trânsito até ao teatro de operações, ao deslocar-se no terreno fica mais vulnerável e em regra tem linhas de abastecimento mais longas e assim menos facilidade na sustentação logística).

Na complexidade da operação militar poderão estar presentes fatores potenciadores do potencial relativo de combate (como o emprego de determinados desenvolvimentos táticos, o emprego de obstáculos, a capacidade de comando e controlo, a capacidade de vigilância do campo de batalha) que poderão eles próprios desequilibrar a vantagem em favor de um ou outro contendor, sendo assim grosseiro este princípio dos 3:1, no entanto serve para a análise do conflito armado.

D. Álvaro de Bazán desenvolveu uma operação ofensiva com um potencial relativo de combate de 2:1 (com uma força expedicionária de 11.441 combatentes, enfrentou um dispositivo defensivo de 5.000 a 6.000 combatentes), o que significa que apesar de ser uma força com um volume considerável, face ao volume da força defensiva não era assim tão esmagadora para que este desequilíbrio só por si constituísse o fator decisivo.

[85] BRAGA Paulo Drumond, História dos Açores / Do descobrimento ao século XX, Espanhóis, continentais e açorianos, um espaço para a libertação, Volume I, Instituto Açoreano de Cultura, 2008, p. 245.

[86] Idem, p.258.

[87] Idem, p.256.

[88] FARIA Manuel Augusto de, Distribuição territorial e composição social das Companhias de Ordenanças dos Açores, Boletim do Instituto Histórico da Ilha Terceira, Volume LXII, IHIT, pp. 291 a 293.




LUÍS SILVEIRA

Nascido em 1966 em​ Angra do Heroísmo na ilha Terceira/Açores em 1966, onde reside. Tenente-coronel do Exército na situação de reforma. Presidente da Comissão Administrativa da Delegação da Cruz Vermelha de Angra do Heroísmo (DCVAH) e membro correspondente do Instituto Histórico da Ilha Terceira (IHIT).


pdf Descarregar este tex​to​​​​


​​​

Como citar este texto:

SILVEIRA, Luís – Batalha da Salga e Batalha das Mós. Dois conflitos armados na Ilha Terceira no início da União Ibérica 1581-1583. Revista Portuguesa de História Militar – Dossier: O reinado de D. Sebastião, a “perda de independência" e o período Filipino. [Em linha] Ano IV, nº 7 (2024),  https://doi.org/10.56092/EDMA4622 [Consultado em ...].


Partilhar
Conteúdo