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​O CARMO, A GNR E O 25 DE ABRIL

 

 

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Nuno Andrade


Resumo

Os decisivos acontecimentos ocorridos na tarde de 25 de abril de 1974 tiveram como “palco" o exterior e interior do Quartel do Carmo (QdC), Comando-Geral (CG) da Guarda Nacional Republicana (GNR), com a transmissão do poder do aí deposto chefe de governo, professor Marcelo Caetano (M. Caetano), para o general (Gen) António de Spínola, marcando dessa forma o fim de 48 anos de ditadura em Portugal e a viragem do país para a democracia e para a Europa, em face do processo de descolonização que se seguiria nos territórios ultramarinos portugueses. A partir desse dia iniciar-se-á um novo ciclo em Portugal, que contagiará a consolidação das democracias europeias e terá grande impacto para os processos de democratização a nível mundial. Cinquenta anos depois já são conhecidos os principais acontecimentos que ocorreram no interior do secular QdC e suas imediações, alguns deles publicados pelo autor em 2008[1], todavia, existem ainda alguns factos pouco conhecidos e mesmo inéditos, que revelam surpresas nas últimas doze horas da ditadura, que aqui são privilegiados, até porque essa obra foi editada há 16 anos e não chegou a ser reeditada.

Todavia, tais factos, não alteram o essencial do desfecho dos acontecimentos. Nem a coragem e heroísmo evidenciados pelas forças revoltosas, especialmente no Carmo por parte dos militares da Escola Prática de Cavalaria (EPC). Nem o sentido de responsabilidade e a “passividade ativa" manifestada pelos militares do comando (Cmd) da GNR e das suas subunidades (SubUn) que foram chamadas ao “cumprimento do dever" nesse dia, dentro e fora do QdC, e que tiveram a coragem, e igualmente o bom senso, de não responder aos dois ataques sobre o quartel, evitando a tentação de cair na “resposta ao fogo" e consequente derramamento de sangue. Só desta forma foi possível que a população concentrada no Largo do Carmo (LdC), eufórica com o desenrolar dos acontecimentos, emergisse e aí vitoriasse o culminar deste golpe de Estado militar, que rapidamente contagiou as ruas da cidade e do país, transformando-se em revolução, ao conseguir a capitulação da ditadura e impor uma radical mudança em todos os setores da vida nacional. Assim, a revolução é hoje reconhecida e valorizada, sobretudo internacionalmente, como ímpar, exemplar e de referência na História da Humanidade.

Palavras-chave: História; Revolução; 25 de Abril de 1974; Movimento das Forças Armadas; MFA; Escola Prática de Cavalaria; Capitão Salgueiro Maia; Guarda Nacional Republicana; GNR.

Abstract

The decisive events that took place on the afternoon of 25 April 1974 had as their 'stage' the exterior and interior of the Carmo Barracks (QdC), General Command (CG) of the National Republican Guard (GNR), with the transfer of power from the then deposed head of government, Professor Marcelo Caetano (M. Caetano), to General António de Spínola, thus marking the end of 48 years of dictatorship in Portugal and the country's turn towards democracy and Europe, in view of the decolonisation process that would follow in Portugal's overseas territories. From that day on, a new cycle would begin in Portugal, which would infect the consolidation of European democracies and have a major impact on democratisation processes worldwide. Fifty years on, the main events that took place inside the secular QdC and its surroundings are already known, some of them published by the author in 2008. However, there are still some little-known and even unpublished facts that reveal surprises in the last twelve hours of the dictatorship, which are privileged here, not least because this work was published 16 years ago and has not been reissued.

However, these facts do not alter the essence of the outcome of events. Nor does the courage and heroism displayed by the insurgent forces, especially in Carmo by the soldiers of the Cavalry Practical School (EPC). Nor the sense of responsibility and 'active passivity' shown by the soldiers of the GNR command (Cmd) and its subunits (SubUn) who were called to 'fulfil their duty' that day, inside and outside the QdC, and who had the courage, and also the common sense, not to respond to the two attacks on the barracks, avoiding the temptation to fall into the 'response to fire' and consequent bloodshed. Only in this way was it possible for the population concentrated in Largo do Carmo (LdC), euphoric at the unfolding of events, to emerge and win the culmination of this military coup d'état, which quickly infected the streets of the city and the country, turning into a revolution by achieving the capitulation of the dictatorship and imposing radical change in all sectors of national life. The revolution is now recognised and valued, especially internationally, as unique, exemplary and a benchmark in human history.

Keywords: History; Revolution; 25 April 1974; Armed Forces Movement; MFA; Cavalry Practical School; Captain Salgueiro Maia; National Republican Guard; GNR.

 

 

 

Razões para a Centralidade do Carmo e da GNR no 25 De Abril

A GNR esteve no centro dos acontecimentos do 25 de abril de 1974 porque o diretor da Direção-Geral de Segurança (DGS), ex-PIDE, elegeu o Quartel do Carmo (QdC) para local de refúgio de M. Caetano, “encostando" a Guarda e o seu CG ao cumprimento do dever e responsabilidade pela defesa e preservação do chefe do governo, ministro da tutela, demais comitiva e dos militares e civis que se encontravam no interior do quartel.

As razões que levaram o diretor da DGS a aconselhar o QdC como refúgio do chefe do governo, justificavam-se pela capacidade operacional evidenciada pela GNR para o malogro da revolta das Caldas, em 16 de março, a par da desconfiança do regime na Força Aérea, tal como na Marinha, mas sobretudo no Exército, pois seria espectável que o quartel, eleito para esse fim, voltasse a ser o da Base Aérea de Monsanto, onde M. Caetano e parte dos seus ministros se tinham acolhido em março[2]. Também, a memória histórica, uma vez que durante todo o século XX, no Carmo se acoitaram diversos chefes de Estado, de governo e ministros, sobretudo da tutela. No fundo, M. Caetano seguiu a prática mais utilizada, prevista nos planos governamentais para a recolha dos membros do governo, em Monsanto, no Batalhão de Caçadores n.º 5 (BCç5) de Campolide ou no Carmo. É de referir que o QdC serviu de refúgio nas graves crises nacionais[3] de 1915, 1919, 1921, 1925, 1926, 1931 e mesmo com Salazar aí a refugiar-se em março de 1959 e na abrilada de 1961, evidenciando nestas duas últimas o começo do afastamento do Exército em relação ao regime, que instaurou a 28-05-1926. Na abrilada de 1961, depois de sair do Carmo, Salazar anunciou o início da guerra em África. Depois de 13 anos de guerra, os oficiais combatentes, sobretudo subalternos e capitães, “já não tremiam antes de dar um tiro"[4], sendo estes os organizadores do Movimento dos Capitães, iniciado exclusivamente por razões corporativas, em oposição à guerra e em protesto à publicação do Decreto-Lei (DL) n.º 375, de 13 de julho (entre outros decretos, que o regime irá reverter), surgido nove meses antes da revolução. Se estas razões de protesto no Exército tinham pouco significado na Marinha e na Força Aérea, tinham grande importância na GNR, tal como na PSP e na Guarda Fiscal, cujos oficiais eram das forças armadas, quase exclusivamente do Exército. Nas FFSS os decretos foram bem recebidos, pois permitiram que os oficiais milicianos do Exército, ao seu serviço, deixassem de ter os contratos prorrogáveis por 3 anos, podendo ainda beneficiar de promoções além do posto de Cap, incluindo os oriundos da classe de sargentos (Sarg), que desta forma passaram a poder, igualmente, ascender a majores (Maj) e a tenentes-coronéis (TCor)[5].

As Limitações da GNR e do Quartel do Carmo

Mas o diretor da DGS e M. Caetano desconheciam que a força evidenciada pela GNR no 16 de março escondia muitas limitações, quer no equipamento, armamento e potencial de fogo, quer as enormes fragilidades do QdC. Este, nas vésperas da revolução, apenas dispunha do Cmd, repartições, serviços e a 1.ª Companhia (Comp) do Batalhão (B) n.º 1 (B1). Excluindo esta última Comp, de Infantaria (Infª), a capacidade de defesa operacional do quartel era praticamente nula. Já não se encontravam no Carmo, desde 1972, as duas principais subunidades operacionais: o 1.º Esquadrão (1.º Esq) a cavalo e a Comp de Engenhos (de Infª motorizada, herdeira em 1944, da Comp mista de autometralhadoras pesadas). A saída destas duas SubUn do QdC inseriu-se na reorganização da GNR, operada com a criação da BT, em 01-07-1970, exatamente na data de tomada de posse do general comandante-geral (GCG) que esteve em funções até 25 de abril de 1974. Essa reforma vitimou, ainda, a capacidade operacional do 2.º Esq, força moto-blindada do RC e de maior potencial militar da GNR (que dividia com a então Comp de Engenhos), pois aí assentou a formação da BT, onde permaneceram muitos dos efetivos desse Esq.

Assim, o Cmd da GNR, ciente das limitações operacionais, procurava minimiza-las, com o reforço de pessoal, equipamento e armamento, como referido em Andrade (2008, pp. 45-48), especialmente com os processos em curso para a aquisição de viaturas blindadas Shorland, de espingardas automáticas G-3 e radiotelefones portáteis “STORNO" que reforçavam a fraca rede de transmissões da GNR, em contraste com a da BT, que era quase certamente a melhor do país e que tinha dado provas na revolta das Caldas.

Retirada do Quartel do Carmo como Objetivo Militar do MFA

O facto de Otelo ter observado, a 16 de março, a ação vitoriosa das forças governamentais, que se mobilizaram para travar a coluna das Caldas antes desta entrar em Lisboa, permitiu-lhe conhecer, in loco, as unidades (Un) militares que aí intervieram, designadamente do RC7, RL2, DGS, Legião Portuguesa, “Polícia de Choque" da PSP e GNR, que voltariam a sair em defesa do regime no mês seguinte. O mesmo se passou com o 2.º Esq/RC/GNR e com as Comp de Infª da GNR do Beato (e Santa Bárbara), Lóios, Estrela e Paulistas, que voltaram a intervir no exterior do QdC no dia da revolução.

Desta forma, Otelo e os mentores do MFA puderam percecionar os seus erros, bem como conhecer o potencial de atuação das principais Un com quem se voltariam a “bater", intensificando desde então, esforços para abordar e coaptar para o movimento (ou impedir a intervenção) os comandantes (Cmdt) dessas Un, quer do Exército, quer da GNR, como se constatou no mês seguinte. Apostaram, também, na elaboração de um rigoroso planeamento, onde puderam definir as forças que seriam utilizadas pelo regime, que consideraram “forças inimigas", para além das transmissões e de um Posto de Comando (PC), que não existiu nos revoltosos a 16 de março, ao contrário das forças governamentais, que acionaram o Comando-Geral de Segurança Interna (CGSI), na Cova da Moura, sob o Cmd do Gen Paiva Brandão, Chefe do Estado-Maior do Exército[6]. Para além disso, passaram a equacionar um melhor dia (de semana, e não um sábado como ocorreu a 16 de março).

Assim, no plano geral das operações a GNR foi considerada como força inimiga e sobre ela Otelo definiu dois objetivos militares iniciais: a tomada do QdC, para além da captura de uma viatura da BT para empastelar a rede de transmissões dessa Un, inutilizando-a. A missão de tomada do QdC foi atribuída no referido plano ao BCç5[7]. Contudo, as informações recebidas por Otelo, pouco depois do 16 de março, fornecidas pelo Maj Velasco (primo de Otelo, colocado na GNR quatro meses antes da revolução[8]), dando-lhe conhecimento das limitações da GNR e das fragilidades desse quartel, a par da garantia de abordagens e ligações ao MFA por parte de oficiais colocados “à pressa" e “estrategicamente" na GNR, em posições de destaque no CG e no comando de Un/SubUn operacionais[9], fizeram-no “desinteressar-se" da GNR, mudando de ideias e “riscado" o Carmo como objetivo militar. Ao BCç5, Un afeta ao MFA, acabaria por ser reatribuído um outro objetivo: a tomada do Quartel-General (QG) da Região Militar de Lisboa (RML), bem como o Rádio Clube Português (RCP) e o controlo da “Colina das Revoluções", que desde 1910 era fundamental para a vitória aos respetivos ocupantes.

O Maj Cardoso Fontão, oficial mais graduado das forças revoltosas do BCç5, confessou ter recebido a missão de tomar o QdC e ido ao LdC “fazer o reconhecimento, colher informações e preparar a ocupação do local. Chegou mesmo a entrar em alguns prédios, tendo executado manobras que facilitassem uma posterior entrada e ocupação, incluindo ter partido vidros e arrombado fechaduras". É de salientar que caso se mantivesse esse objetivo a atuação do BCç5 seria completamente diferente da ação da EPC, ao não permitir a presença/proximidade de civis, como ocorreu no QG da RML. Enfim, os acontecimentos do LdC, sem a presença do “povo", seriam seguramente muito diferentes. O mesmo oficial justificou esta perspetiva com a diferença de doutrina e modo de emprego militar das forças de Infª – como era o caso do BCç5 –, em relação às de cavalaria (Cav) – como era o caso da EPC[10].

Primeiro Alerta e as Medidas de Segurança Adotadas pela GNR

O início das movimentações militares foi detetado, primeiramente, pelas sentinelas de serviço da 1.ª Comp/B1/GNR, à Penitenciaria de Lisboa, contígua ao quartel do BCç5, onde pelas 01h30 e as 02h30 se aperceberam de incidentes ocorridos no arranque do movimento. Essa informação chegou rapidamente aos oficiais de dia do B1 e do CG, bem como ao CEM, coronel (Cor) Ângelo Ferrari, que instruiu, de imediato, o oficial de dia ao CG para avisar o 2.º Cmdt-geral (o CEM avisaria o GCG) e telefonar às Un da GNR, com conhecimento aos respetivos Cmdt, mandando-as entrar de prevenção rigorosa e ainda de telefonar para o Cmd da PSP e DGS (que responderam ainda não ter conhecimento de nada).

Desde então a GNR colocou-se em prontidão, em todo o território continental, sendo ativados, pelos oficiais de dia das Un e SubUn, os procedimentos estipulados para as situações de prevenção rigorosa, com a adoção de medidas de segurança extrema, como o fecho de portões, cortes dos telefones civis e controlo de transmissões, prontidão imediata dos militares de serviço, de piquete, dos pelotões de prevenção e demais militares que estão no interior dos quartéis e o acionamento do plano de recolha de todos os militares que estão no exterior. À medida que os militares chegavam aos quartéis iam reforçar as medidas de segurança, em cumprimento dos planos de defesa dos quarteis, integrando equipas ou pelotões para guarnecer os pontos de defesa dos mesmos, como referido em Andrade (2008, pp. 63-81). Para além disso, em Lisboa (e no Porto, Coimbra e Évora), as Comp urbanas (em Lisboa, no B1 e B2, existiam 6 dessas SubUn), escalavam diariamente e tinham em permanência 1 Pel de prevenção (com cerca de 30 militares), tal como os Esq de Cavª (3 em Lisboa e 2 no Porto), que evidenciavam elevados níveis de prontidão[11], como se tinha verificado com a rápida resposta na “barragem" à coluna das Caldas e no cerco à Academia Militar, em 16 de março.

No QdC seguiram-se idênticos procedimentos. O 2.º Cmdt-geral, brigadeiro (Brig) Tavares de Figueiredo, acompanhou a segurança ao interior do quartel, em ligação com o Cmdt da 1ªComp/B1, capitão (Cap) Santiago de Carvalho (Cap S. de Carvalho), sendo adotadas as medidas internas habituais, para guarnecer os postos de defesa do quartel. Os militares dessa Comp foram reforçados com os da Formação e dos serviços de escala das repartições e serviços, sendo todos equipados e armados, com o reforço do capacete de aço, espingardas Mauser (e sabre-baioneta), pistolas-metralhadoras Steyr, metralhadoras Madsen e granadas.

Quanto à segurança interna, as ordens do Cmdt da 1ªComp seguiram as orientações do seu Cmdt do B1, que se deslocou ao QdC, reunindo no seu gabinete, com os seus subordinados, antes da chegada de M. Caetano, transmitindo-lhes que em nenhuma circunstância houvesse disparos ou qualquer ação ofensiva ou provocatória, de dentro para fora do quartel. Nem em resposta ao fogo inimigo proveniente do exterior do quartel. As únicas exceções seriam no caso de dar ordem pessoal e expressa, ou ainda como reação à entrada massiva e pela força de forças hostis no interior do Quartel.

A ausência de segurança externa mereceu, posteriormente, uma forte crítica de M. Caetano, que acusou a GNR de não o ter feito, como seria sua obrigação. Mas essas tarefas estavam atribuídas ao 1.º Esq (Carmo) e à Comp de Engenhos, que tinham sido desativadas (não extintas) pelo Cmd da GNR, de 1970 a 1972, como atrás referido. Caso subsistissem, seriam incumbidas de impedir o acesso de pessoas e viaturas ao LdC e o cerco ou ataque ao quartel.

Receção e Movimentações de Marcelo Caetano e da GNR no Carmo

Alertado pelo ministro do Interior, o GCG recebeu cerca das 05h30[12], o chefe de governo, que chegou ao QdC na sua viatura, conduzida por um inspetor da DGS e acompanhado do adjunto militar, Cmdt Coutinho Lanhoso e de outro agente da DGS[13]. Antes de sair de casa M. Caetano telefonou para o gabinete do ministro do Exército, Gen Andrade e Silva, onde já se encontrava o ministro da Defesa Nacional, assumindo o primeiro a chefia das operações militares, a partir do seu gabinete, tendo o chefe de governo dado indicação para que os ministros civis, se possível, se mantivessem nos respetivos gabinetes.

O GCG, Gen Adriano Augusto Pires, “à paisana, recebeu-o à porta do quartel", cortesmente, como admitiu o próprio M. Caetano, apesar de à posteriori o ter criticado pelo facto de não se ter fardado durante todo o dia. Apesar do Gen estar na reserva, o facto de não se ter fardado nesse dia foi um procedimento raro, senão um caso único na história da instituição, um GCG não se fardar quando recebeu, durante tantas horas e num evidente contexto militar, o chefe de governo e o ministro da tutela. Com essa postura o GCG terá transmitido aos restantes militares do CG e às entidades externas, a sua discordância com a escolha do QdC como local de refugio, que dessa forma forçou o GCG e a GNR para o cumprimento de um dever, com o qual não concordava, para mais numa jornada arriscada, que poderia pôr em risco o quartel e quantos estavam no seu interior, incluindo a sua própria família[14], e a dos seus militares, alguns dos quais, também, moravam com as famílias no interior desse edifício (facto que era do desconhecimento de M. Caetano e do Cap S. Maia). Poderá, também, ter simbolizado uma menor vontade ou alheamento face às questões político-militares em jogo, senão mesmo, a solidariedade para com os generais Costa Gomes e Spínola, com quem tinha prestado serviço, na GNR e em África (incluindo o seu 2.º Cmdt-geral)[15].

O GCG após receber M. Caetano, acompanhou-o e à comitiva aos quartos, tendo passado logo por algumas defesas montadas no interior do quartel. Aí deixaram alguns dos pertences pessoais e foram conduzidos, agora, para os gabinetes de trabalho, tendo-se cruzado com o Maj Velasco (primo de Otelo), acabado de dar entrada no quartel.

Instalado no gabinete, M. Caetano e o seu adjunto militar efetuaram e receberam diversos telefonemas. M. Caetano telefonou para o Palácio de Belém para informar o chefe de Estado que se encontrava no QdC. Por sua vez, o Cmdt Coutinho Lanhoso, foi encarregue de telefonar aos ministros a informar onde se encontrava o chefe de governo e que, à parte os ministros militares (e o do Interior), deveriam permanecer nos seus gabinetes, não precisando de se juntar a ele no Carmo (só o ministro dos negócios estrangeiros o fez)[16].

O Cmd da GNR, tal como M. Caetano e sua comitiva foram sendo informados das movimentações das forças governamentais e acompanhando as emissões da rádio, incluindo os comunicados do MFA, através do RCP, cuja reação de M. Caetano junto das forças governamentais acabaria por ser eficaz a partir das 08h00, com o corte seletivo de energia e telefones nessa rádio.

Pouco tempo depois das 08h00, o GCG mandou chamar o oficial de dia, incumbindo-o de acompanhar M. Caetano ao seu quarto para efetuar a higiene pessoal, o que efetuou, regressando ambos ao gabinete pouco tempo depois. Enquanto isso o GCG, após muita atividade e coordenação, interna e externa, aproveitou para fazer o mesmo, deslocando-se à sua residência no quartel. Aí confessou ao filho, antes deste sair para o trabalho, que “desta vez é uma coisa muito séria", regressando pouco tempo depois ao gabinete e acompanhou M. Caetano à Messe de Oficiais, onde tomaram o pequeno-almoço.

Nesta altura, cerca das 08h30[17], Rui Patrício, sem ser esperado pelo Cmd da GNR, nem por M. Caetano, ao chegar junto da porta de armas do quartel, conduzido na viatura do seu chefe de gabinete, não foi reconhecido, pelo que os guardas da 1.ª Comp “apontaram-nos as espingardas e disseram para irmos para trás. O Rui pôs a cabeça de fora e disse: «É o ministro.»". Assim, foi-lhe franqueada a entrada, sendo reconhecido no interior pelo inspetor da DGS. Foi conduzido à sala de reuniões contígua ao gabinete, onde permaneceu com os oficiais do Cmd da GNR (M. Caetano já aí não estava). Aí conversaram do “nosso desalento por ver um movimento militar contra a defesa do Ultramar. Eles estavam sobretudo preocupados com as famílias que se encontravam dentro do quartel e com a hipótese de resistência"[18]. Rui Patrício evidenciava um aspeto pesado e algo desleixado, com a barba por fazer e um estado muito deprimido, tendo pedido logo um comprimido para as dores de cabeça. Tinha sido acordado cerca das 05h00 por Pedro Pinto, que o inteirou das movimentações. Telefonou de seguida para o seu chefe de gabinete, Rui Brito e Cunha, que o transportaria ao ministério, onde refere que pelas 07h00 “queimei uns papéis de ordem meramente pessoal", até receber o telefonema do Cmdt Lanhoso, que o fez deslocar para o Carmo.

Depois do pequeno-almoço M. Caetano deslocou-se para o quarto próximo da Messe, onde aguardou a vinda do ministro do Interior, a quem tinha dado instruções para se juntar a ele. Este assim fez, acompanhado do almirante (Alm) Henrique Tenreiro, depois de terem evitado a prisão no ministério do Exército, colocando-se em fuga, tal como os ministros militares e da Defesa, que estabeleceram, a partir de então, o PC no RL2 da Ajuda, sob direção do ministro de Defesa, conforme telefonema de M. Caetano. Desse quarto, M. Caetano continuou a fazer e receber telefonemas, visando contrariar as movimentações dos revoltosos, sendo conhecidos os telefonemas trocados com os ministros militares, da Defesa e das Corporações, entre outros, bem como com os generais Santos Costa (disponibilizar forças do Exército) e Kaúlza de Arriaga (disponibilizar forças da Força Aérea), para além do Alm Ferreira de Almeida (disponibilizar forças da Marinha, para além das movimentações da fragata no rio Tejo), entre outros militares e governantes, com destaque para Pedro Pinto e Feytor Pinto. É de realçar, ainda, a facilidade de circulação entre os gabinetes do GCG e o quarto da Messe de Oficiais, onde M. Caetano mais tempo privou, havendo circulação integral em toda a quadratura dos 1.º e 2.º pisos (segundo a perspetiva do LdC), ligando-os, ainda, à varanda sobre o Rossio e à sala General Afonso Botelho (sobre o LdC), o que permitiu a M. Caetano, e sua comitiva, visualizar os acontecimentos que aí ocorrerem.

A Mobilização das Forças da GNR

Logo às primeiras horas da manhã, as principais Un e SubUn do RC e dos B1 e B2, encontravam-se mobilizadas e em total prontidão. O CEM tinha telefonado, diretamente, para casa do Cmdt do 2.º Esq/RC, Cap Andrade e Sousa, para que este mobilizasse imediatamente o seu Esq. Telefonou, igualmente, ao Cmdt da 4ªComp/B2, Cap Fernando Lomelino, que residia no quartel da Estrela e que recebeu, ainda, a missão de reforçar a segurança do QdC. Idênticas ordens de prontidão para saírem em reforço da segurança do QdC foram ordenadas aos diversos Cmdt das Comp do B1 e do B2.

Todavia, o CEM não efetuaria mais contactos diretos com os Cmdt de Comp ou Esq, passando depois a contactar os Cmdt das Un de Lisboa (RC, B1 e B2), sem mandar avançar, no imediato, as forças para o terreno. Isto mesmo seria confirmado, mais tarde, por M. Caetano, que criticando o CEM, referiu que “telefonava para todos os Batalhões a assegurar-se de que estavam prontos e às ordens. As respostas eram afirmativas. Olhou para mim com ar triunfante. Fiquei sem perceber porque é que, obtida essa certeza, não movimentava as tropas"[19]. Acrescentando que, mesmo quando avançaram para o terreno, não intervieram, como era a intenção do chefe de governo.

Efetivamente o CEM só mandou avançar a primeira força da GNR, o 2.º Esq/RC, mais de duas horas depois da sua total prontidão. Às demais 5 Comp, do B1 e do B2, idêntica ordem só chegaria muito mais tarde (após oito horas da sua prontidão e os dois Esq a cavalo não chegaram a ter ordem para avançar), só saindo dos quartéis após o almoço, chegando ao terreno quando o QdC já estava cercado pela EPC.

Mesmo o avanço da primeira força da GNR só ocorreu quando o ministério do Exército estava cercado pela EPC e após o respetivo ministro ter ordenado, ao Cmd da GNR, o avanço das suas forças para o Campo das Cebolas, para se apresentarem e ficarem à ordem do Cmdt do Destacamento da RML, Brig Junqueira dos Reis.

O 2.º Esq era a força de maior potencial de fogo da GNR e saiu para o terreno com o seu Cmdt e 4 oficiais subalternos[20], num total de cerca de 70 militares, transportados em 12 jeeps. Foi a força da GNR, e das forças do regime, que mais tempo esteve no terreno (mais de 12 horas). A ação deste Esq foi descrita em Andrade (2008), realçando-se a ação de um telefonista da BT, à civil, que efetuou um minucioso reconhecimento ao dispositivo da EPC na Praça do Comércio, inteirando o Cmdt do 2.º Esq da situação, antes do primeiro contacto deste com o Cap Salgueiro Maia, que ocorreu a meio caminho de ambos (próximo do cruzamento das ruas da Alfândega e da Madalena), ficando marcado pelo abraço de amigos, entre o Cap S. Maia e o Ten Guiomar. Este facto amenizou logo a ação desse Esq, cujo Cmdt assegurou ao Cap S. Maia que nada fariam para contrariar as suas forças[21]. Tentou regressar ao RC, mas o Cmdt não permitiu a entrada no quartel, insistindo que as ordens do CG eram para se apresentar ao Brig, que estava no Cais do Sodré, com forças para se atuar contra o movimento. O Gen Spínola ainda enviou o Cor Xavier de Brito ao RC/GNR, por duas vezes, a pedir a adesão do Cmdt, Cor Serra Pereira (que seria saneado logo a seguir à revolução, tal como o seu 2.º Cmdt). No terreno, o 2.º Esq foi posicionar-se no Corpo Santo, onde o Cmdt descreve ter visto o Brig a chegar ao Cais do Sodré, num jeep, apenas com um aspirante (Asp) da PM/RL2, esperando aí o reforço de tropas. Aí foram divididos os dois Pel do Esq. Um Pel permaneceu no mesmo local e o outro foi para o cimo da “Calçada de São Francisco", onde tinham “bom campo de tiro", para que daí “fossem disparados tiros" sobre “a Praça do Município e Comércio, o que não fizemos". O primeiro Pel assistiria aos últimos desenlaces com a “troca de tiros" envolvendo a PM/RL2 e a EPC “na sequência da fuga de uma viatura Volkswagen onde se escapava vindo do Ministério do Exército o ten-cor. Ferrand de Almeida", bem como os momentos em que o Cmdt do RC7, da metralhadora da torre do carro de combate M/47 fez fogo em direção ao rio, “tentando provocar a resposta dos revoltosos, mas ficou-se por ali…". Neste dificílimo contexto, as ordens que o Cap Andrade e Sousa transmitiu aos seus subordinados foram sempre no sentido de que “não há fogo, não há tiros, a não ser à minha ordem; a nossa missão é a defesa da ordem e tranquilidade pública"[22].

Passados os momentos mais decisivos na Praça do Comércio e estando o Brig sem comunicações, o Cmdt do 2.º Esq incumbiu o alferes (Alf) Artur Santos Silva de o ir informar que os militares revoltosos retiraram da Praça do Comércio e partiram na direção do QdC, ao que o Brig respondeu: “O quê?! Foram para o quartel do Carmo? Ó filho, então aquilo agora é convosco…. Vão lá vocês… - Ó meu brigadeiro, mas vamos lá como, se todas as ruas estão bloqueadas de alguma forma com os carros e a tropa deles? – retorqui. Resposta do brigadeiro: - Vejam se conseguem avançar pelas ruas… Ou… vão pelos telhados!". Depois regressou para junto do Cmdt do 2ºEsq, que “com um sorriso meio amargo" comentou aos seus subalternos e demais militares presentes “O quê?! O nosso brigadeiro disse para irmos pelos telhados? Mas eu não sou paraquedista!..."[23].


Cerco ao Quartel o Carmo e Reação das Forças Governamentais

Entretanto, as forças da EPC chegaram ao LdC e cercaram o quartel cerca das 12h30. O seu demorado e eufórico trajeto foi observado com extrema apreensão através das “apinhadas" janelas do QdC. A reação das forças governamentais para travar a sua progressão limitou-se à mobilização de uma Comp do RI1, da Amadora, todavia, o Cmdt ao ser abordado pelo Cap S. Maia, aderiu aos revoltosos.

A partir daí, no QdC a prioridade vai passar a ser a retirada de M. Caetano. Para isso foram feitas diversas tentativas: a primeira através de túneis (o Alm Tenreiro bem os procurou, mas à época já não subsistiam), depois através da Força Aérea, que chegou a enviar um helicóptero para o efeito, mas não conseguiu aterrar e, por último, um plano para o retirar, através de uma casa que liga à Rua do Carmo, onde estariam à espera duas viaturas da DGS, contudo, M. Caetano posto perante o facto de ter que subir por uma janela, através de uma escada, rejeitou por falta de dignidade, dizendo que sairia pela porta por onde entrou.

Não subsistindo hipótese de retirada do quartel, a pressão aumentou exponencialmente e o próprio M. Caetano vai acertar com o GCG o avanço das SubUn da GNR de Lisboa, para cercar o LdC, colhendo os revoltosos “entre dois fogos". M. Caetano assistiu às ordens do CEM para, finalmente, os Cmdt do B1 e B2 mandarem avançar as respetivas Comp para o terreno e questionará que uma vez no terreno “em vez de actuar, pararam e retiraram». Quem as mandou retirar?". Referia-se, em concreto, ao 2.º Esq, que vindo do Cais do Sodré, “subiu até ao Largo de Camões" para se aproximar do QdC, inserido num conjunto de forças governamentais que incluiu, também, os 2 carros de combate M/47, com o Brig J. dos Reis e com o Cmdt do RC7, Cor Romeiras Júnior[24], para além de militares da PM do RL2, de parte do RI1 (que, entretanto, abandonariam a coluna) e da “Polícia de Choque" da PSP (que ao chegar ao Chiado, não conseguiu progredir mais e abandonou o terreno). As dificuldades na progressão deviam-se às sucessivas “barreiras" da EPC e à maciça presença de pessoas nas ruas, mas, mesmo assim, as forças governamentais conseguiram chegar ao Camões[25]. Tal ocorreu porque a população pensava que estavam do lado dos revoltosos. Quando os comunicados do MFA relataram essa situação, a população começou a hostilizar estas forças.

Mas, nesse momento, existiu uma resposta coordenada ao cerco, através de uma segunda linha de forças, entre os largos da Misericórdia e Camões, procurando isolar os sitiantes da EPC, tornando-os sitiados. Aí se enquadraram as ordens do CEM aos Cmdt do B1 e do B2, para que, com as 5 Comp de Infª, fossem posicionadas por sectores, numa segunda linha em volta do LdC, entre o Largo Camões, Rua Nova da Trindade, Largo da Misericórdia, Calçada do Duque até à Calçada do Carmo e Estação do Rossio até à Rua 1.º de Dezembro. O B1 (Comp de Santa Bárbara, Beato e Lóios) ocupou o sector a Norte do LdC; o B2 (Comp da Estrela e Paulistas) os sectores Oeste e Sul e o 2.º Esq/RC, com as restantes forças governamentais (incluindo a “Polícia de Choque" da PSP), reforçariam essas forças, avançando pelo sul do LdC, entrando em contacto com o 2.º Cmdt do B1, Maj Teotónio Pereira, oficial da GNR mais graduado no terreno. Dessas, a Comp da Estrela foi a primeira a chegar ao terreno e a que mais perto esteve do QdC (no Largo da Trindade), tendo recebido a missão de “desobstruir as pessoas das imediações do Quartel do Carmo", o que levaram à prática, logo na progressão, após terem apeado das viaturas no Largo da Misericórdia.

Desta forma a GNR posicionou no exterior do QdC um total de cerca de 400 militares, das 5 Companhias de Infª e 1 Esq de Cavª, número que não contabiliza os cerca de 90 militares da 1.ª Comp (seriam muitos mais, pois esta Comp foi reforçada com outros militares do CG), para além dos militares da coluna do Brig J. dos Reis e dos inspetores da DGS que discretamente estiveram no terreno[26].

Perante este cenário, o PC do MFA ao aperceber-se que as forças que cercavam o QdC estavam, igualmente, sob cerco, mandou avançar de imediato, para o local, o Esq do RC3 de Estremoz, para envolver e anular as forças da GNR e do Brig J. dos Reis.

Os Dois Ataques ao Carmo Geram o Caos no Interior do Quartel

Com a chegada dos carros de combate do Esq do RC3 ao LdC, em reforço da EPC, entre as 14h30 e as 15h00, estas forças passaram a dominar as imediações do quartel e forçaram a retirada das forças do regime, incluindo as da GNR. A partir daí, como referiu Otelo, o oficial da GNR mais graduado no terreno, 2.º Cmdt do B1, Maj Teotónio Pereira, “o «Golias», meu conterrâneo da Academia Militar. Afiança que vai contactar o Comando-Geral e dar cumprimento à ordem dos capitães". Nesse mesmo sentido, o Cap S. Maia abordou os oficiais da Comp da Estrela e ficou com a convicção de que as forças da GNR apesar de expectantes, não iriam disparar nem reagir.

Nessa altura desmobilizou, também, o Brig J. dos Reis, e as poucas forças governamentais que ainda o acompanhavam, deixando a GNR sozinha no terreno e o QdC totalmente dominado, excetuando a 1.ª Comp/B1, na defesa interior do quartel. Mas as Comp do B1 e do B2, tal como do RC, apesar de retiraram dos respetivos setores, não lhes foi permitido abandonaram o terreno, concentrando-se no Largo da Misericórdia e no jardim de S. Pedro de Alcântara, junto das viaturas[27].

Restava ao Cap S. Maia forçar a rendição e entrega de “Coelho", nome de código correspondente a M. Caetano, constante no plano conspirativo. Seguiram-se sucessivos ultimatos. Do interior do quartel só o silêncio. Perante a “pressão" imprimida pelo PC do MFA e a não resposta aos ultimatos, Otelo ligou para o CEM e, em nome do MFA, assumiu a vitória e exigiu a rendição e entrega imediata do chefe de Governo ao Cmdt da força sitiante. O CEM desconversou, negando saber que M. Caetano estivesse no quartel. Após o telefonema, Otelo insistiu com o Cap S. Maia para forçar, ainda mais, a rendição, entrando em força ou disparando sobre o quartel e através do Cap Rosado da Luz enviou-lhe um papel com essas instruções, “para verem que é a sério"[28].

Assim, após muitos outros ultimatos, não respondidos, pelas 15h30, surgiu o primeiro ataque, com uma rajada de tiros sobre o quartel, através da metralhadora da Chaimite do Ten Santos Silva, por ordem do Cap S. Maia. O seu impacto foi tremendo no interior do QdC, como descrito em Andrade (2008, pp.144-150). Ao avançar-se para este patamar extremo de ataque ao quartel e esgotadas as hipóteses de fuga e de defesa a partir do exterior, M. Caetano e o regime vão apostar tudo na GNR e na Força Aérea. Por volta desta hora, a Força Aérea “está no ar", pois retira de helicóptero os ministros militares e da Defesa, entre outras entidades que se encontravam no PC no RL2, transportando-os para Monsanto, onde passa a funcionar o PC das forças governamentais. Neste cenário, o PC do MFA transmite ao Cap S. Maia a possibilidade de utilização de helicanhão sobre o LdC, ou outros atos de desespero.

Nessa altura, no QdC, M. Caetano ainda alimentava a esperança de reverter a situação. Por outro lado, já percecionando o seu fim, iniciava, simultaneamente, contactos visando preparar a vinda de um Gen, a quem transmitiria o poder[29]. Por outro lado, o ministro do Interior e sobretudo o Alm Tenreiro vão tentar tudo para resistir, incluindo com as forças da GNR, no interior do QdC, visando o lançamento de granadas para o LdC, através das janelas do 1.º piso. Ciente dos riscos iminentes, Otelo, no PC do MFA, vai pressionar, ainda mais, o Cap S. Maia, para forçar a rendição o mais rápido possível[30].

Mas o silêncio continuou e os portões permaneceram fechados, forçando o Cap S. Maia a intensificar os ultimatos, até que pelas 15h45, mais de três horas depois do início do cerco, abriu-se finalmente um dos portões e de lá saiu o Maj Velasco (primeiro e único militar da GNR que saiu do quartel nos momentos mais dramáticos aí vividos). Mas este Maj saiu por sua iniciativa, não estava mandatado pelo chefe de governo, nem pelo Cmd da GNR. Estava ligado ao MFA, através de Otelo (seu primo). No exterior informou o Cap S. Maia que a GNR não se renderá e o Cap disse-lhe que, assim, ia forçar a entrada. O Maj desaconselhou-o, pois, lá dentro havia “senhoras e crianças" (S. Maia desconhecia esse facto, tal como que aí não estava o chefe de Estado) e a defesa interior do quartel está preparada e, seguramente, reagiria perante uma entrada pela força no quartel. Assim, o Cap S. Maia pede-lhe para regressar ao interior do quartel e informar que dá mais 10 minutos, antes de abrir, novamente, fogo sobre o quartel. Ao reentrar, não foi detido (possibilidade que podia ter ocorrido) e encontrou-se com o GCG, que estava acompanhado do ministro do Interior, pedindo este para aguentar mais um pouco, que o chefe de governo estava em negociações para se encontrar uma solução, através do Gen Spínola. O Maj Velasco regressou ao exterior e transmitiu essa informação ao Cap S. Maia. Este, pensando que apenas se pretendia ganhar tempo, pediu ao Cor Abrantes da Silva, oficial mais graduado que estava no LdC, para entrar no quartel com o objetivo de se almejar uma rápida rendição.

Com o tempo a passar e esse Cor no interior do quartel sem respostas, pelas 16h15, ocorreu o segundo e maior ataque sobre a fachada do QdC, ordenado pelo Cap S. Maia ao Alf Carlos Beato, que instalou os seus atiradores no cimo das varandas do edifício dos Seguros Império, para dispararem na direção da varanda “do alto do centro", agora com espingardas automáticas G-3.

Neste ataque, o fogo descontrolou-se por “longos" 2 minutos e 15 segundos, generalizando-se, tendo disparado “quem sabia e quem não sabia", pois, os cadetes da EPC estavam no início do curso e não teriam prática de tiro. Os projéteis acabaram por seguir todas as direções possíveis: por cima do quartel, para os lados, para os portões de baixo e para o pavimento, sendo muitos os ricochetes que se fizeram sentir nos carros blindados. Alguns dos cadetes chegaram mesmo a “fugir", ao sentirem tiros na sua direção, pensando que a GNR estava a responder ao fogo. O Cap S. Maia teve mesmo de se “expor" à frente dos tiros, com o megafone a gritar sucessivos “alto ao fogo", durante cerca de 45 segundo. O Cor Abrantes da Silva, do interior do quartel, expôs-se também, abrindo uma janela e gritando para pararem o fogo. Por feliz acaso, não foram alvejados, tal como ninguém no exterior e no interior do quartel, como referido em Andrade (2008, pp 147-157).

Este brutal e descontrolado tiroteio agravou radicalmente o ambiente no interior do quartel, aí se instalando o medo, a irracionalidade e imprevisibilidade. Sem saber, o Cap S. Maia mandou apontar na direção da residência do GCG, que aí vivia com a família, no piso superior dessa fachada, tendo a mulher, filho e nora saído “disparados", com os netos ao colo, pelo corredor dos gabinetes do GCG. Este, na presença de M. Caetano e dos ministros (que assistiram com incredibilidade a esta cena), sentindo o pânico nos seus familiares, abriu uma das janelas do corredor, sobre a Parada de Cavalaria, e ordenou “respondam ao fogo". O Cap S. de Carvalho, Cmdt da 1.ª Comp/B1, posicionado na Parada, imediatamente abaixo, ouviu e logo contrariou a ordem do GCG, gritando para que ninguém fizesse nada sem a sua ordem. Os seus soldados ouviram incrédulos, e com orgulho, pois nunca tinham imaginado ouvir tamanha desautorização, para mais a uma ordem do GCG. M. Caetano elogiará, mais tarde, o facto dos “velhos militares práticos da GNR" não terem reagido ao fogo, facto que também foi elogiado pelo GCG, até porque os ricochetes no interior do quartel davam a sensação que havia, igualmente, fogo de dentro para fora.

Este foi o momento de total viragem para M. Caetano, que percebeu, finalmente, o clima de dramatismo instalado à sua volta, sobretudo depois de ouvir a “imprevista" ordem de resposta ao fogo pelo GCG, que até então estivera calmo e ponderado, e que se tivesse sido replicada provocaria, seguramente, um “banho de sangue". Isto, para além de constatar o comportamento de desespero dos que integravam a sua comitiva, sobretudo por parte do Alm Tenreiro, que desesperado tudo tentou para reverter pela força a situação, mesmo com o lançamento de granadas pelas janelas da Sala General Afonso Botelho, em cuja escadaria tinham sido colocados cunhetes, sendo essa tarefa atribuída ao Cmdt do Pel aí posicionado[31], que não a concretizou.

Enfim, M. Caetano ainda manteve alguma calma e a dignidade, contudo os ministros e o Alm reagiram pior do que se possa imaginar, tendo o chefe de governo resignado, finalmente, a qualquer possibilidade de resistência e contrariamente à serenidade que até aí sempre aparentou, vai-se agitar e agir, contrariando as ordens dos seus correligionários, sobretudo do Alm Tenreiro, que continuava a tentar forçar a GNR a reagir, passando então a dirigir-se diretamente aos militares da GNR, pedindo-lhes que não disparassem, que não fizessem nada, pois não queria um “banho de sangue". Todavia, não se entregaria a um simples e desconhecido Cap, para que “o Poder não caísse da rua".

Também M. Caetano e o GCG entraram num clima de desconfiança e de irreversível rutura. O CEM, percecionando o estado do GCG e a saturação dos militares da GNR, bem como os riscos para todos quanto estavam no quartel, entrou no gabinete onde estava M. Caetano e disse-lhe que a sua “presença estava comprometendo a segurança de quantos se achavam no edifício". M. Caetano não lhe perdoará tal gesto, referindo-se-lhe, à posteriori, como “personagem ridícula" e “apalhaçado", no que foi defendido pelo GCG, que fez o elogio do seu CEM, que esteve 15 anos nessa função no CG da GNR (sendo ambos saneados da GNR após a revolução, tal como o 2.º Cmdt-geral).

Neste contexto, M. Caetano e sua comitiva deslocaram-se para os quartos, porque os ultimatos continuaram e aí estavam mais protegido. Aí continuaram os contactos, agora para salvar a situação e a preservação física dos mesmos. O mesmo terá feito o GCG, mas mantendo-se entre o gabinete e a residência do seu ajudante de campo[32], para onde se deslocou a sua família após a fuga, tendo o GCG telefonado por duas vezes para que o Gen Spínola aí acorresse para receber o poder de M. Caetano, que estava na disposição de lho entregar.

Instalado no quarto, M. Caetano, viu entrar um Maj da GNR “dizendo-se delegado do MFA ali no quartel, declarando que eu ia desencadear uma tragédia com a minha existência. Serenamente mandei-o embora, recomendando-lhe calma. Ninguém o prendeu. E fiquei sabendo que o inimigo estava dentro da praça"[33]. Com a total resignação de M. Caetano e com a sua comitiva instalada nos quartos, não mais se fez sentir a presença do Alm Tenreiro, que desapareceu estrategicamente no quartel, escapando na manhã do dia seguinte através do portão da Calçada do Carmo[34].

Entretanto, no exterior, a multidão, protegida em múltiplos abrigos, começou a aproximar-se e a encher, novamente, o LdC. Dentro do quartel, os civis, familiares dos militares da GNR, foram os que mais sofreram, não só com mais este ataque, mas ao longo de todo o cerco, como descrito em Andrade (2008, pp.128-130)[35]. Estes, procuraram concentrar-se em vários recantos do quartel, protegendo-se, bem como aos seus haveres, pois ainda mais que os tiros, temiam que pudesse ocorrer uma entrada em força e anárquica da população pelo quartel dentro, com todas as consequências que daí podiam advir (situação que também preocupava o Cap S. Maia).

É de salientar, ainda, que durante este segundo ataque, existiu uma ordem para as forças da EPC abrirem fogo sobre militares da Comp dos Lóios, que da parte superior da estação do Rossio, a pé, iniciaram uma progressão pela Calçada do Carmo, tentando reagir na direção do QdC. Resta saber se os disparos sobre esses militares da GNR apeados, ordenados pelo Ten Santos Silva, através da metralhadora da Panhard AML do Ten Cardoso, não ocorreram por ter a metralhadora do carro de combate encravado, como tem sido contado, ou, mais credível, se se tratou de mais uma desobediência, como tantas outras que ocorreram nesse dia. Após os tiros se “calarem" o Maj Velasco foi chamado para ir acalmar os militares dessa Comp, como tinha feito junto de outras SubUn da GNR, dizendo-lhe para não fazerem nada e colocarem as armas “à bandoleira", especialmente o Cmdt da Comp, que estava preparado para reagir em defesa do QdC[36].

Ordem para Destruir o Quartel e o seu Incumprimento

Com os ultimatos a sucederem-se e sem vislumbre de rendição, o pior esteve para acontecer. O Cap S. Maia sabendo que M. Caetano não estava disposto a entregar-se-lhe e vendo a situação “bastante tremida", em que tudo era admissível “inclusive um acto de desespero ou loucura, pois eles poderiam lançar-se ao assalto para tentar abrir caminho", acabou por dar cumprimento à ordem escrita, que exigiu do PC, para destruir o quartel.

Efetivamente a ordem de destruição do quartel ocorreu, em ato contínuo ao “ultimato definitivo" que dirigiu por megafone, às 16h25, para o interior do QdC e que terminou com a contagem “1, 2 … [alguns segundos de espera], atenção Santos Silva faz uma rajada". O Ten Santos Silva recebeu a ordem e a mesma acabou desobedecida. Era para ser cumprida “por uma única autometralhadora", como explicado pelo Cap, durante o ultimato, antes da contagem, tendo sido escolhida a da Panhard EBR do Asp Sampaio. Mas este Asp, deliberadamente desobedeceu (no regresso da EPC, a Santarém, terá respondido ao Cap, dizendo “não ouvi"), sendo este facto conhecido quase 50 anos depois, em 2022, justificando que “nesse momento fui mais sensato do que Salgueiro Maia"[37].

Caso o Asp Sampaio tivesse cumprido a ordem, obedecendo ao Cap S. Maia e ao Ten Santos Silva, e o projétil deflagrasse, ocorreria uma tragédia, com os detalhes e consequências descritos em Andrade (2008, pp.160-164). Mas o que nenhum deles sabia era que os portões do QdC são de ferro (e não de madeira, como pensavam), podendo os catastróficos efeitos do disparo com granada explosiva, caso esta deflagrasse no contacto com o ferro do portão, ter maiores consequências no exterior, do que no interior do quartel. Isto porque, se deflagrasse aquando do embate no portão, o raio de morte de 50 metros, teria provocado, quase certamente, a morte de todos os militares e civis que estavam expostos no LdC e de muitos outros no enfiamento direto das ruas envolventes, bem como em frente de portas, janelas e varandas dos prédios “em linha" com o referido portão.

A Transmissão do Poder no Carmo e o Fim da Ditadura em Portugal

Poucos minutos depois chegaram ao LdC, trazidos pelo Ten Assunção[38], dois emissários do Gen Spínola, Feytor Pinto e Nuno Távora, que vieram “à pressa", intermediar junto de M. Caetano para desbloquear o impasse. Falaram com o Cap S. Maia e foi-lhes permitida a entrada. Entraram sozinhos na parada do quartel e daí foram conduzidos ao quarto da Messe, onde estava M. Caetano e sua comitiva. Os detalhes das negociações são conhecidos e encontram-se descritos em Andrade (2008, p.168-172).

Pouco tempo depois da saída dos negociadores, pelas 17h00, o Cap S. Maia, pensando que se tratava de mais uma medida para fazer retardar a rendição, entrou no quartel, podendo ser preso, mas de granada no bolso, determinado a fazê-la explodir em caso extremo de necessidade. Fez-se acompanhar do Ten Assunção, outro oficial do MFA e do Maj Velasco. Este encaminhou-os para que o Cap dialogasse com o GCG, no seu gabinete. Cerca de 15 minutos depois, como o GCG frisou que não lhe competia assumir a rendição, foi o Cap conduzido junto de M. Caetano. Este tem uma perspetiva diferente, pois quando soube que o Cap estava à conversa com o GCG pressentiu que podia ser entregue “ingloriamente", tendo ordenado ao seu adjunto que dissesse ao GCG que “estando eu no quartel, se o capitão Maia queria falar com alguém era comigo que devia conversar". Entretanto deslocou-se do quarto, para a sala de reuniões, ao lado do gabinete, onde receberia o Cap S. Maia, com o enredo descrito em Andrade (2008, p.172-176). À saída desabafou ao Ten Assunção “diz que somos uns garotos", acrescentando que “já vimos o que tínhamos a ver". Depois de sair do quartel entraria uma segunda vez[39], tendo confirmado que, finalmente, todos estavam na disposição de se render. E assim aconteceu, pois, pouco tempo depois, às 17h59, surgiu a viatura do Gen Spínola no LdC. O portão do quartel abriu-se para permitir a entrada da sua viatura. As pessoas aproximaram-se da entrada e o Cap S. Maia teve muitas dificuldades em conseguir segurar a multidão. A entrada apoteótica do Gen no QdC, onde 6 anos antes tinha sido 2.º Cmdt-geral, conquistou, desde logo, a adesão da GNR. Na Parada de Cavalaria o Maj Velasco pretendia indicar-lhe o caminho, mas o Gen antecipou-se e subiu para o corredor pelas escadas de serventia, em caracol, e dirigiu-se ao gabinete do GCG, onde estava M. Caetano, que aí, a sós, se rendeu, transmitindo o poder diretamente ao Gen Spínola, saindo ambos do quartel, cerca das 19h30, o primeiro sob prisão e o segundo ascendendo, na madrugada do dia seguinte, à chefia da Junta de Salvação Nacional.

Com a rendição de M. Caetano, o foco no QdC normalizaria e finalmente o alivio chegava para os familiares dos militares aí residentes, bem como as ordens para a recolha aos quartéis das Comp de Infª e Esq de Cavª, que ainda se encontravam, concentradas, no Largo das Necessidades e no Jardim de São Pedro de Alcântara.

Apesar da rutura entre ambos, tanto M. Caetano homenagearia “Os soldados, os sargentos, os velhos oficiais práticos da GNR que foram admiráveis do princípio ao fim", como o GCG, que igualmente prestou homenagem “ao pessoal da GNR que guarnecia as defesas do quartel, por ter sabido dominar a emoção de que estava possuído, principalmente depois dos ataques sofridos e ter resistido à tentação de responder ao fogo com o fogo".

Dessa forma foi possível que o golpe de Estado tenha saído vitorioso e sem derramamento de sangue no Largo e Quartel do Carmo. Entretanto a euforia espalhou-se do LdC para toda a cidade e ao país, com ecos em toda a parte. Mas o golpe de Estado militar tinha terminado. A revolução, essa, acabava de começar!

FIGURAS

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Fig. 1 – Capitão Santiago de Carvalho, Cmdt da 1ªComp/B1, responsável pela segurança do QdC. Mais tarde, no 2.º ataque ao quartel, perante a ordem do GCG para responder ao fogo, gritou para que ninguém fizesse nada sem a sua ordem. Foto AHGNR.

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Fig. 2 – General Adriano Augusto Pires, Comandante-geral de 01-07-1970 a 25-04-1974. Foto Museu da GNR.
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Fig. 3 – Gabinetes do GCG disponibilizados para Marcello Caetano e comitiva. Na sala de reuniões ocorreu a reuniu com o Cap Salgueiro Maia e, ao fundo, no gabinete, ocorreu a transmissão do poder para o General Spínola.

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Fig. 4 – A coluna de 12 viaturas do 2.º Esq do RC no jardim de S Pedro de Alcântara. Esta foi a primeira força da GNR a avançar para o terreno e a que mais tempo aí permaneceu. Foto Mário Varela Gomes.

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Fig. 5 – Capitão Andrade e Sousa, Cmdt do 2.º Esq/RC recebeu ordens para, do Alto da Calçada de São Francisco,  mandar disparar sobre as praças do Município e do Comércio, o que não cumpriu. Foto AHGNR.

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Fig. 6 – Pelotão do Tenente Loureiro Pinto, da Compª da Estrela, (ao centro da imagem, com pistola-metralhadora Steyr na horizontal), no Largo da Trindade. Esta foi a primeira das Companhias da GNR a chegar ao terreno e a que esteve mais perto do Quartel do Carmo. Foto de Mário Varela Gomes.

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Fig. 7 – Chegada das Companhias de Santa Bárbara e do Beato ao início da tarde de 25 de abril de 1974. Foto Mário Varela Gomes.

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Fig. 8 – Tenente Chartier Martins (na foto já com o posto de Capitão) destacou-se por impedir que fossem lançadas granadas sobre o Largo do Carmo. Foto AHGNR.

9. Largo Carmo no final do dia.jpg

Fig. 9 – Largo do Carmo na tarde de 25 de abril de 1974, sendo visíveis nas paredes do quartel as marcas dos tiros. Foto de Mário Varela Gomes.

 

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Relato de Ocorrências", Movimento das Forças Armadas – Centro de Documentação 25 de Abril, Universidade de Coimbra, 25 de Abril de 1974.

 

NOTAS

[1] Livro “Para Além do Portão. A GNR e o Carmo na Revolução de Abril" (Nuno Andrade, 2008).

[2] Acerca do 16 de março de 1974 vide Andrade, 2008, p. 30-38 e Tornada, 2009.

[3] Cf. Andrade, 2008, pp.39-44, Borges, Telo, Andrade, et al, 2019, p. 74 e Carvalho, 1999, p. 341.

[4] Rodrigues, 2001, pp. 248-262.

[5] Cf. Santos, 1999, pp. 298 e 309-311 e cf. Andrade, 2008, pp. 22-25.

[6] O CGSI (Lei n.º 2084/56, de 16 de agosto, Base XXI) previa que neste tipo de situações as forças armadas e de segurança ficavam na sua dependência operacional, passando o Cmdt do CGSI a liderar as operações (cf. Andrade, 2008, pp. 32-38).

[7] Cf. Mateus et al, 2017, pp. 28-35, e, ainda, cf. Pontes, Castro & Afonso, 2012, pp. 185-198.

[8] O Maj Velasco foi colocado na GNR nas vésperas da revolução, em 08-10-1973, para adjunto da 3ª Repartição, ascendendo à chefia dessa repartição após o 25 de abril, regressando ao Ex um ano depois do ingresso na GNR.

[9] Ingressaram na GNR, nas vésperas da revolução o TCor Castro Lemos (regressou da Guiné em 28 de março); Maj Caramelo (dezembro de 1973, sendo colocado na mesma repartição do Maj Velasco); Maj Teotónio Pereira (colocado um mês antes da revolução como 2.º Cmdt do B1).

[10] Cf. Nuno Andrade, citado em Mateus et al, 2017, pp. 34-35.

[11] Os piquetes dos Esq eram constituídos por 1 Sarg e 8 praças, que ficavam prontos para sair em 5 e 8 minutos (a pé e a cavalo).

[12] Hora aproximada indicada em Andrade (2008). Para M. Caetano 05h00 e para Otelo e relatório do Cap S. Maia 06h00.

[13] O chefe de brigada da DGS, inspetor Diogo Albuquerque (cf. SANTOS, 2000, p. 160, citado por Andrade, 2008, p. 107).

[14] O GCG habitava a residência oficial com a mulher, filhos (2), nora e netos (2): menina de 3 anos e meio e menino de 3 meses.

[15] O GCG tinha sido 2.º Cmdt do Gen Costa Gomes, em Moçambique (e por ele louvado e condecorado). O seu 2.º Cmdt-geral, Brig Tavares de Figueiredo tinha sido 2.º Cmdt do Gen Spínola, na Guiné (e por ele louvado e condecorado. Este Brig terminou a missão na Guiné, em Jan1973, antes do regresso à GNR). Tanto Costa Gomes como Spínola tinham prestado serviço na GNR.

[16] O Cmdt Coutinho Lanhoso telefonou cerca das 08h00 a Rui Patrício (cf. Xavier, 2010, pp. 228 e 229).

[17] Cf. Xavier, 2010, pp. 226 e 231 e cf. Santos, 2000, p. 160.

[18] Cf. Xavier, 2010, pp. 226 e 231, Rui Patrício, teve um cocktail à noite numa embaixada e um jantar tardio numa sala reservada do Grémio Literário, regressando a casa cerca das 01h00, sendo acordado pelas 05h00, com Pedro Pinto a informá-lo que “está a passar-se uma coisa muito séria. Telefonaram-me da Emissora Nacional a dizer que estavam cercados por tanques".

[19] Cf. Caetano, 1976, p. 18 e resposta de defesa do CEM/GNR cf. Pires, 1976, p. 21, ambos citados por Andrade, 2008, p. 86.

[20] Ten Dário Guiomar, Ten Bairrada, Alf Venceslau Fernandes e Alf Artur Santos da Silva.

[21] Cf. Pontes, 2012, pp. 434.

[22] Ibid e cf. “O Regimento de Cavalaria da Guarda Nacional Republicana e a Revolução", 1975, pp. 2 e 3 e, ainda, cf. “Ecos do 25 de Abril «Vão pelos telhados»", s/d.

[23] Cf. “Ecos do 25 de Abril…", s/d.

[24] O Cor Romeiras Júnior tinha um longo passado no RC da GNR, sendo bem conhecido dos oficiais do 2.º Esq/RC/GNR.

[25] O 2.º Esq/GNR chegou ao Largo Barão de Quintela, cerca das 13h00 (pois ouviram tiros nas imediações do LdC, provavelmente disparados pelos militares do MFA sobre a Comp dos Lóios, que ocorreu cerca dessa hora). Daí acederam à Praça Camões, através da Rua das Flores, onde estacionaram as viaturas e apearam.

[26] Cf. Andrade, 2008, pp.86-101. As Comp e Esq saíram com os respetivos Cmdt e com 2 Pel (exceto a Comp dos Paulistas que recebeu mais um Pel, para as imediações da DGS após os primeiros tiros aí ocorridos cerca das 14h00).

[27] Exceto a Comp dos Paulistas, que permaneceu no Camões, dada a proximidade do seu quartel e a Comp dos Lóios, que faria logo o percurso inverso ao da sua chegada. O Pel do Ten Loureiro Pinto, da Comp/B2, da Estrela, permaneceu mais algum tempo junto ao Teatro da Trindade, onde assistiram aos 2 ataques de fogo sobre o quartel.

[28] Carvalho, 1999, pp.365-366, citado por Andrade, 2008, p.141.

[29] Silva Pinto refere que M. Caetano tentou entrar em contacto com o Gen Costa Gomes, que esteve incomunicável, sendo mais tarde “Feytor Pinto que lhe sugeriu que, então, falasse com o Spínola" (cf. “Dentro de Dois Regimes…", Visão, 21-04-2019).

[30] Resolvendo a situação antes do anoitecer, pelo receio de uma possível intervenção espanhola, nos termos do Pacto Ibérico.

[31] Cf. o testemunho do então Ten Chartier Martins, que assistiu ao transporte dos cunhetes de granadas e falou com o Ten Abreu, dizendo-lhe que não lançasse as granadas, que pensasse nas consequências, que exigisse uma ordem escrita.

[32] Localizada do lado superior norte da escadaria principal. De uma janela o GCG viu o trajeto da coluna da EPC para o Carmo.

[33] Foi o Maj Caramelo, que regressou de Moçambique em dezembro de 1973, sendo colocado na repartição do Maj Velasco.

[34] Pernoitou num dos quartos e saiu com a ajuda do Cap Macieira, que cedeu chapéu e calças (consta que se terá “borrado", ou esse foi o pretexto para o seu desaparecimento). A não entrega do Alm pela GNR foi um dos motivos para a prisão do GCG.

[35] Parte das famílias dos soldados concentraram-se na “Sala das Tintas", antigo armazém de papel da tipografia (mais de 20 pessoas). As dos cabos, Sarg e alguns oficiais num quarto interior da residência do enfermeiro, cabo Arlindo (cerca de uma dúzia de pessoas) e outras nas dependências interiores das suas moradias (sobretudo de oficiais), dentro de viaturas estacionados sob os arcos da Parada de Cavalaria, etc. O Cap S. de Carvalho vivia aí com a esposa, filha (grávida) e a criada, tendo pedido às 3 que se instalassem no WC interior, de barriga para baixo e com a cabeça voltada para o lado oposto à Calçada do Carmo.

[36] Este Cmdt tinha colocado atiradores, com espingardas Madsen, no cimo do edifício em construção, em frente ao Hotel Palace. O estado dos militares dessa Comp era preocupante e alguns estiveram quase a fugir (Cf. Andrade, 2008, p.92-96).

[37] Cf. Adelino Gomes e Alfredo Cunha, 2022, p. 141 e cf. Carlos Matos Gomes, Adelino Gomes & Fernando Rosas, 2023, pp.172 e 366. O Ten Santos Silva testemunhou uma versão mais “soft", que não comprometia ninguém, ao assumir que redirecionou a ordem, simultaneamente, aos aspirantes Clímaco e Sampaio, que hesitaram e nesse compasso de espera chegaram os dois negociadores (Feytor Pinto e Nuno Távora), que “salvaram a situação" (cf. Andrade, 2008, pp. 160-161).

[38] A pedido do Ten Simões de Carvalho, da Comp da Estrela, que os levou até ao Ten Assunção.

[39] Desta vez não se fez acompanhar do Ten Assunção, que estava a transportar, no seu jeep, Feytor Pinto e Nuno Távora.

NUNO ANDRADE

Coronel da GNR na situação de reserva, desempenhou nos últimos anos as funções de chefe da Secretaria-Geral e chefe da Divisão de História e Cultura da Guarda, tendo liderado a equipa que inaugurou e abriu ao público o Arquivo Histórico (2008), a Biblioteca (2013) e o Museu da GNR (2014-2015). Licenciado em História pela Universidade Nova de Lisboa é autor de mais de uma dezena de livros e de inúmeros artigos e conferências sobre segurança interna e história contemporânea (sobretudo envolvendo a GNR) e nas vertentes arquivísticas, bibliográficas, museológicas e artísticas e de simbologia Heráldica e Falerística, das quais é academicamente membro. É Auditor de Defesa Nacional..

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Como citar este texto:

ANDRADE, Nuno – O Carmo, a GNR e o 25 de Abril. Revista Portuguesa de História Militar - Dossier: 25 de Abril de 1974. Operações Militares. [Em linha] Ano IV, nº 6 (2024); https://doi.org/10.56092/UJWR4138 [Consultado em ...].


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