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MUSEU MILITAR DE LISBOA. ACERVO PATRIMONIAL DA PRESENÇA PORTUGUESA NO ORIENTE.

 

 

 Foto Cor Francisco Rodrigues.JPG

Francisco Amado Rodrigues

 

 

Resumo

A multissecular presença portuguesa no Oriente é de abordagem pluridisciplinar, de identidade e de ligação entre vários povos de usos e costumes distintos. O acervo museológico do Museu Militar de Lisboa constitui um singular reflexo desse envolvimento nacional em tão ousada epopeia marítima e afirmação da autoridade régia portuguesa no continente asiático, consubstanciada por relevantes figuras, elevados à categoria de heróis, por enormes feitos de armas, entre outras manifestações patrimoniais culturais materiais, móveis e imóveis, e imateriais. As suas coleções de armaria, pintura, escultura, azulejaria, artes decorativas, são um real exemplo do importante e monumental legado, referente ao Oriente, e que pode ser fruído pelos cidadãos, nacionais e estrangeiros, de forma genérica ou especializada, em salas expositivas ou em Reserva.

Palavras-Chave: Património; Coleções; Oriente.

Abstract

The multi-secular Portuguese presence in the Orient is one of a multidisciplinary approach, of identity and connection between various peoples with different customs and habits. The museological collection of the Lisbon Military Museum is a unique reflection of this national involvement in such a daring maritime epic and affirmation of Portuguese royal authority on the Asian continent, embodied by important figures, elevated to the rank of heroes, by enormous feats of arms, among other manifestations of material, movable and immovable, and immaterial cultural heritage. Its collections of armoury, painting, sculpture, tiles and decorative arts are a real example of the important and monumental legacy of the Orient, which can be enjoyed by Portuguese and foreign citizens in a general or specialised way, in exhibition rooms or in the Reserves.

Keywords: Patrimony; Collections; Oriente.

 

Nota prévia

O presente artigo é um singelo contributo para a divulgação de algum património cultural, essencialmente material móvel, mas também revestido de algumas manifestações imateriais, que foi salvaguardado no rico, heterogéneo e vasto acervo do Museu Militar de Lisboa (MML), parcialmente exposto e em reserva, integrando diferentes tipologias de coleções, diversificadas autorias, várias épocas e múltiplos países que ligam as memórias de muitos portugueses e respetivas obras ao Oriente. A informação intrínseca foi retirada das fichas de inventário da base de dados In Arte Premium, aplicação informática de inventário e gestão de coleções do Exército.

 

1.       Antecedentes

O processo de criação do Museu Militar de Lisboa teve a sua génese em 1842, através da Ordem da Inspeção Geral Nº 224, de 15 de novembro desse ano, emanada do Inspetor do Arsenal do Exército, Tenente-General José Baptista da Silva Lopes, Barão de Monte Pedral – considerado o seu patrono – e de onde exararam as medidas necessárias para a classificação, guarda e conservação dos objetos raros e curiosos que existiam no Arsenal do Exército. 

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Figura 1 – Pintura, retratando o Tenente-General José Baptista da Silva Lopes, Barão de Monte Pedral, em uniforme de gala.

(Óleo sobre tela. Autor: Arthur de Mello. Sem data. Dimensões: altura 110 x largura 83 cm.Número de inventário: MML00911)

 

Por Decreto de 10 de dezembro de 1851, da Rainha D. Maria II, foi estabelecida a existência do Museu de Artilharia, no Arsenal do Exército, sendo por isso a sua fundadora.

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Figura 2 – Quadro, pintura, retratando a Rainha D. Maria II, fundadora do Museu de Artilharia.

(Óleo sobre tela. Autor: Joaquim Rafael. Data: 1834. Dimensões: altura 255 x largura 166 cm. Número de Inventário: MML00950)

 

Eduardo Ernesto de Castel-Branco foi o oficial nomeado para implementar o Museu de Artilharia e que, desde o posto de Capitão a General, se envolveu extraordinariamente no respetivo projeto museológico, decorativo e monumental, figurando o seu primeiro diretor. 

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Figura 3 – Escultura, busto, retratando o General Ernesto Castel-Branco, em grande uniforme.

(Gesso. Autor: Simões de Almeida (sobrinho). Data: 1906. Dimensões: altura 77 x largura 63 cm. Número de inventário: MML00046.)

 

Por Decreto N.º 12161 de 21 de agosto de 1926, o nome foi alterado para Museu Militar, com o fundamento de integrar a narrativa histórica da Grande Guerra (1914-1918), muito para além da vasta e importante coleção de artilharia histórica, entre outras ricas coleções constituintes do seu acervo, como são exemplo a pintura, escultura e azulejaria. 

Em 1959, pelo Decreto-lei N.º 42564, de 07 de outubro desse ano, o Museu Militar passou a depender da Direção do Serviço Histórico-Militar. Posteriormente, com a reorganização definida pelo Decreto-lei Nº 50/93, de 26 de fevereiro de 1993, e conjugado com o Decreto Regulamentar Nº43/94, de 02 de setembro de 1994, o Museu Militar passou a depender funcionalmente do Comando do Pessoal, por via da Direção de Documentação de História Militar.

Finalmente, em 2007, verificou-se a alteração da sua designação para Museu Militar de Lisboa, sob a dependência hierárquica da Direção de História e Cultura Militar, que depende hierarquicamente do Vice-Chefe do Estado Maior do Exército, em vigor na atualidade.

 

2.      Algumas coleções de bens patrimoniais móveis portuguesas do Oriente no acervo do MML – breve caracterização

O edifício da segunda metade do século XVIII, conhecido por Fundição de Baixo do Arsenal Real do Exército, localizado em Santa Apolónia, ficou dedicado ao Museu de Artilharia desde 1895, correspondendo ao atual Museu Militar de Lisboa. Do seu programa decorativo, museológico e monumental identitário de Portugal, é significativa a presença portuguesa no Oriente. Os objetos que integram as várias coleções são exemplo dessa presença multissecular, com destaque à armaria, pintura, escultura, azulejaria, artes decorativas. Mas, para além deste património cultural material móvel, o MML tem salas dedicadas a figuras heroicas de Portugal no Oriente, como por exemplo; Sala Vasco da Gama, Sala D. Afonso de Albuquerque e Sala D. João de Castro. O Peristilo ostenta num dos seus topos de teto a alegoria ao continente asiático e a Sala Ásia, em cujo teto está materializada a pintura de Columbano relativa à principal narrativa portuguesa nesta região do globo.

 

De entre ricas e diversas peças de armaria, ressalta:

a.      Espalhafato “Tigre"

O “Espalhafato Tigre" esteve colocado na Fortaleza de Diu, carregado e transportado de navio em 1896, tendo chegado a Lisboa em 1897 para integrar as comemorações centenárias (1898) da chegada dos portugueses à Índia, em 1498. Depois destas comemorações, a respetiva Comissão Executiva cedeu a referida boca de fogo ao Museu de Artilharia, para fins museológicos. Esta peça integra a coleção de artilharia histórica e é a mais icónica do MML! 

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Figura 4 – Deslizamento do Espalhafato “Tigre", da Fortaleza de Diu para o cais naval, realizado pelos marinheiros de Ghoghla. (Foto: Coleção do MML).

 

Trata-se de uma boca de fogo, canhão pedreiro, de bater muralhas, fundido primorosamente em bronze por um grande fundidor e desconhecido, Reimão. Ostenta cinco esferas armilares e a inscrição “NONII DA CVNHA PRESIDIS JVSSV CONFLATUM ET ABSOLVTVM AN MDXXXIII REIMON ME FECIT". Em redor de um tigre, que deu o nome à peça, tem também outra inscrição: “EV SOV O TIGRE ESFORÇADO QVE POR DO ME MANDON PASO". Ainda apresenta duas Cruzes de Cristo, ornamentações de folhas de acanto e três flores de liz. Projetava pelouro de pedra de 225 arráteis (103,300 kg). Pesa seis toneladas[1].

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Figura 5 – Espalhafato Tigre, na Sala Vasco da Gama, do MML.

(Bronze. Fundidor: Reimão. Data: 1533. Comprimento: 331 cm. Calibre: 44,50 cm. Peso: 6000 kg. Número de inventário: MML00020.)

 

Da rica, heterogénea e vasta coleção de artilharia histórica, para além do Espalhafato Tigre, também se destacam as seguintes bocas de fogo e relacionadas com o Oriente:

b.      Tiro de “Diu"

Tiro de Diu é uma boca de fogo fundida em bronze e considerada uma das maiores peças do mundo. Apresenta a seguinte inscrição em relevo, dentro de um retângulo: “DO NOSSO SENHOR O SULTÃO DOS SULTÕES DO TEMPO; VIVIFICADOR DA TRADIÇÃO DO PROFETA DE (DEUS) MISERICORDIOSO; QUE COMBATE PELA EXALTAÇÃO DOS PRECEITOS DO CORÃO; DERRUBADOR DOS FUNDAMENTOS DOS PARTIDÁRIOS DA IMPIEDADE; QUE AFASTA AS HABITAÇÕES DOS ADORADORES DOS ÍDOLOS; VENCEDOR NO DIA DO ENCONTRO DOS DOIS EXÉRCITOS; HERDEIRO DO REINO DE SALOMÃO; CONFIADO EM DEUS BENFEITOR; POSSUIDOR DAS VIRTUDES; BAHADUR XAH, SULTÃO; ESTA PEÇA FOI FEITA A 5 DO MÊS DE DHULKÁDAS, ANO DE NOVECENTOS E TRINTA E NOVE". Esta colossal peça foi enviada em 1538 da Índia para Portugal, pelo Governador Nuno da Cunha. Esteve colocada inicialmente no Castelo de S. Jorge, em Lisboa, seguida do Forte de S. Julião da Barra, no reinado de D. João IV. Foi salvaguardada da sua fundição para a estátua equestre em bronze, do Rei D. José I. Projetava pelouro de ferro de 95 arráteis (43,605 kg). Pesa cerca de vinte toneladas[2].

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Figura 6 – Tiro de “Diu", no Pátio dos Canhões, do MML.

(Bronze. Data: 1533. Comprimento: 611 cm. Calibre: 23,50 cm. Peso: 19.494 kg. Número de inventário: MML01223)

 

c.       Peça de “Malaca"

Peça de “Malaca" é uma boca-de-fogo oriental, denominada “ÁGUIA", de ferro forjado e com a estrutura das antigas bombardas. A alma é formada por onze barras de ferro ou aduelas, reforçadas com grossos aros de ferro. Tem quatro pares de argolões e apresenta uma carranca na culatra e outra à boca. Em cada munhão ostenta também uma carranca em relevo. Projetava pelouro de ferro de 38 arráteis (17,6442 kg) ou de pedra de 13 arráteis (5,967 kg). Pesa cinco toneladas[3].

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Figura 7 – Peça de “Malaca", na Sala Vasco da Gama, do MML. Ferro forjado.

(Data: 1ª metade do século XVI. Comprimento: 336 cm. Calibre: 17,50 cm. Peso: 5.000 kg. Número de inventário: MML00021)

 

O MML possui ainda na sua coleção de armaria, para além da coleção de artilharia histórica, algumas dezenas de singulares armas brancas e armas de fogo, defensivas e ofensivas, individuais e coletivas, ligeiras e pesadas.

Destacam-se as seguintes armas:

 

d.      Espingarda (Japão), designada por "Tanegashima"

Arma de fogo, espingarda japonesa, do século XIX. Possui fecho de serpentina, de mecha japonesa, com mola externa e platina de latão. As guarnições da coronha e do fuste são também em latão, sendo os embutidos decorativos de crisântemos estilizados, em madrepérola. O cano oitavado é longo e pesado, tem inscritos caracteres e figuras japonesas embutidos a ouro, e destaca-se a alça de pontaria elevada, correspondendo à mira colocada numa boca de canhão decorada com entrançados e faixas de prata. Para honrar a memória dos portugueses, que introduziram a espingarda no Japão, o nome da ilha, onde aportaram pela primeira vez, é também a designação de "espingarda" em japonês: Tanegashima[4].

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Figura 8 – Espingarda, Tanegashima, japonesa, do século XIX.

(Calibre: 14 mm. Comprimento: 137 cm. Número de inventário: MML01002)

 

e.      Adaga (Mongólia) 

Arma branca, adaga, ou “Khanjar", mongol, Indo-Moghul, do final do século XVIII, apresentando: punho de jade, guarda-mão de latão em rosácea, lâmina curva de um só gume, com goteira, bainha de madeira, forrada a pele de raia com bocal, braçadeira e ponteira de latão cinzelado[5].

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Figura 9 – Adaga, Kanjar, Mongólia, do final século XVIII.

(Comprimento da lâmina: 50 cm. Comprimento total: 61 cm. Número de inventário: MML00995)

 

f.       Espada (China)

Arma branca, espada curta chinesa, da dinastia Qing, dos séculos XVII-XIX, apresentando: lâmina reta, com dois gumes; punho de madeira com pequenos quartões de bronze, virados para cima, e pomo em forma de folha de trevo, do mesmo material; bainha de madeira lacada, com guarnições de latão cinzelado[6].

 

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Figura 10 – Espada da China.

(Comprimento da lâmina: 40 cm. Comprimento total: 55 cm. Número de inventário: MML00994)

 

g.      Espada (Índia)

Arama branca, espada de parada "Pata", da Índia, dos séculos XVII-XVIII, apresentando: empunhadura, de ferro, com reforços de latão, na zona do punho e braço, que permite o prolongamento direto do mesmo; lâmina direita, de dois gumes, com pequena goteira no primeiro terço.

“Na tradição da parada, cada arma adquiria um valor e um significado especial; obviamente, a sua funcionalidade como arma não desaparecia, mas era quase banalizada pelos elementos decorativos e vistosos que davam às lâminas uma linha elegante que, com as decorações de requintado trabalho acabavam por enobrecer a arma como tal, transformando-a numa preciosidade. Não sendo o tipo de arma branca mais comum na Índia, encontra-se entre os exemplares bastante divulgados, com punhos montados em lâminas fabricadas em Itália (Génova) e na Alemanha (Soligen), introduzidas na Índia pelos Portugueses e Holandeses durante o século XVI"[7].

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Figura 11 – Espada, de parada, Índia, dos séculos XVII-XVIII.

(Comprimento da lâmina: 94 cm. Comprimento total: 125 cm. Número de inventário: MML00275)

 

h.      Kris (Javanês – Indonésia)

Arma branca, Kris Javanês, da Ilha de Java – Indonésia, dos séculos XVIII-XIX, apresentando: punho, de madeira, que representa a "Garuda" - águia do deus Vixnu - representada no brasão heráldico da Indonésia; lâmina, parcialmente ondulada, simbolizando a serpente mitológica "Naga" em movimento, de aço amonizado e ostenta desenhos típicos chamados "Killin"; e bainha de madeira, parcialmente forrada a prata cinzelada.

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Figura 12 – Kris, Javanês - Indonésia, dos séculos XVIII-XIX.

(Comprimento da lâmina: 35 cm. Comprimento total: 44 cm. Número de inventário: MML00997)

 

i.        Faca (Nepal)

Arma branca, faca Kukri, nepalesa, apresentando: lâmina curva de um só gume com entalhe na base e suficientemente larga para ser empunhada por duas mãos no desbaste ou corte do mato, cabo em madeira, bainha de madeira revestida a couro, tendo na parte traseira outra faca pequenina denominada Karda, normalmente usada para tarefas diárias, onde lâminas de maior tamanho não seriam adequadas. A bainha comporta ainda espaço para outra faca pequenina denominada Chakmak[8].

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Figura 13 – Faca do Nepal

(Comprimento da lâmina: 26 cm. Comprimento total: 36,5 cm. Número de inventário: MML06291)

 

j.        Capacete (Japão)

Capacete, japonês Jingasa, do período Edo, em papel marché lacado a preto e decorado com uma ave (cisne) em tons dourados. Interior em tons de preto e vermelho.

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Figura 14 – Capacete, Jingasa, japonês, do século XIX (?).

(Altura: 13,5 cm. Diâmetro: 30 cm. Número de inventário: MML06292)

 

k.      Capacete (Índia)

Capacete de armadura, da Índia e de fins do século XVIII. É composto por uma calote de ferro com vestígios de motivos dourados, com proteção nasal e proteção para o pescoço em malha metálica.

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Figura 15 – Capacete da Índia.

(Diâmetro: 30 cm. Número de inventário: MML01000)

 

l.        Metralhadora (Japão)

Arma de fogo, automática, metralhadora japonesa, Arisaka, coletiva, pesada, modelo de 1914, funcionamento automático a gás, com refrigeração a ar, carregador metálico Puteaux (rígido) para 30 cartuchos, cadência prática de 200 tiros por minuto e alcance prático de 1.500 metros, montada em tripé para fogo terrestre e, eventualmente, usado também em tiro antiaéreo[9].

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Figura 16 – Metralhadora, Taisho, japonesas, 1914.

(Calibre: 6,5 mm. Cadência máxima de tiro: 400 tiros por minuto. Alcance máximo: 4.000 m. Comprimento: 115,5 cm. Peso: 55 kg. Número de inventário: MML06301)

 

Outras coleções orientais a salientar:

Artes decorativas:

m.    Biombo (China), referente à dinastia Qing

O magnífico biombo chinês, de madeira, teca, exposto na Sala Oriental, reproduz a relevância do General Guan Yu[10]pela defesa da cultura chinesa tradicional de forma estável, pacífica e leal aos preceitos antigos.

A Doutora Yanjun Huangis, formada em História pela Academia Chinesa de Ciências Sociais e consultora científica do Museu Militar de Lisboa em cultura chinesa, refere “a enorme admiração do povo chinês pela qualidade da lealdade e admiração pelo herói Guan Yu".  E prossegue, afirmando que “Guan Yu (?- 220), nome de cortesia Yunchang, foi uma figura histórica real durante o período dos Três Reinos. A sua lealdade e bravura sempre foram admiradas pelo povo chinês. A partir das dinastias Song e Yuan, as pessoas gradualmente o adoraram como um deus. A sua posição no sistema de crenças chinês tornou-se cada vez mais nobre, até que ele foi chamado de "Os dois sábios do civil e do militar", com Confúcio. As pessoas o respeitam como "Guan Gong" (Lord Guan), "Guan Di" (Divus Guan), "Guan Sheng Di Jun" (Santo Governante Divindade Guan) e Sangharama Bodhisattva, acreditando que ele pode proteger os seus crentes, testemunhar e supervisionar a lealdade e a fé entre os crentes. A crença nele se estende além das áreas Han da China para as áreas minoritárias. Muitas indústrias o consideram um deus da indústria e acreditam que ele pode abençoar os crentes para obter mais riqueza. Em geral, ele é o deus mais nobre para soldados e artistas marciais. Curiosamente, em Hong Kong e Macau, tanto a polícia quanto o submundo veneram “Kwan Kung" (Guan Yu). Isso ocorre porque todos eles são guerreiros e todos confiam na lealdade de seus companheiros para manter as suas vidas seguras e recompensar uns aos outros com a sua lealdade. Guan Yu foi carinhosamente chamado de "Segundo Lord Guan" ou "Segundo Irmão Guan". Isso ocorre porque ele, Liu Bei e Zhang Fei eram irmãos jurados: Liu Bei era o irmão mais velho, Guan Yu era o segundo irmão e Zhang Fei era o terceiro irmão."

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Figura 17 – Biombo, chinês, do século XX.

Legenda: 1. Guan Yu, General; 2. Guan Ping, filho do General Guan Yu, e o assistente dele; 3. Zhou Cang, General júnior de Guan Yu; 4. Cheng Yu (?), funcionário subordinado do General Cao Cao; 5. As esposas do General Liu Bei, a Senhora Gan e a Senhora Mi; 6. Zhang Liao, General júnior de Cao Cao, e Soldados de Cao Cao; 7. Cavalo Chi Tu; 8. Manto de seda; 9. Mulheres bonitas; 10. Caracteres Chineses 国泰民安: o país é próspero e estável, e as pessoas são pacíficas; 11. Caracteres Chineses 古风: as crenças leais e os caminhos leais dos antigos.

(Altura: 208 cm. Largura: 170 cm. Número de inventário: MML01022)

 

Arte sacra:

n.      Dalmática (Índia)

Veste litúrgica exterior - paramento religioso, do século XIX. Apresenta uma decoração profusamente vegetalista e floral. Foi utilizado em 27 de setembro de 1910, na cerimónia religiosa da evocação dos 100 anos da Batalha do Buçaco. É de seda natural e bordado a fio de ouro, oriundos da Companhia das Índias

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Figura 18 – Dalmática da Índia.

(Altura: 115 cm. Largura: 113 cm. Número de inventário: MML06384.)

 

Azulejaria:

o.      Painel de azulejos

Chegada a Calecute

“Há 528 anos, Vasco da Gama (1469-1524), insigne navegador e explorador português, comandou a frota naval que zarpou em 8 de julho de 1497 de Lisboa e abriu o novo caminho marítimo para a Índia, tendo chegado a Calecute (Índia) nesta data comemorativa, 20 de maio de 1498, após viagem atribulada. Desde 1998 que a mesma data ficou associada também ao dia festivo da Marinha Portuguesa, dando ênfase ao cumprimento do objetivo perseguido durante décadas, o descobrimento do caminho marítimo para a Índia."

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Figura 19 – Azulejaria, “Chegada a Calecute".

Painel azulejar, composto por azulejos cromáticos (azul e branco), de barro calcário revestido de vidro estanífero, de fabrico manual, e reproduzido ao estilo joanino (reinado de D. João V), com a pintura alusiva à Chegada a Calecute, na costa sudoeste da Índia, em 1498, durante a epopeia portuguesa dos descobrimentos marítimos, mais propriamente a descoberta do caminho marítimo para a Índia, ligando, pela primeira vez, por via marítima, a Europa ao Oriente.

(Autor: Victoria Pereira. Data: 1944. Dimensões: altura 212,80 x largura 212,80 cm. Número de inventário: MML05578)

 

Tomada de Malaca

“Afonso de Albuquerque, fidalgo e 2º governador da Índia, conquistou Malaca – atual estado da Malásia, no sudeste asiático, na Península Malaia, nas margens do estreito de Malaca, pelo qual se interligam os Oceanos Índico e Pacífico –, considerada a cidade mais rica e de maior importância na ligação a Leste entre mercadores malaios, guzerates, hindus, chineses, japoneses, persas, árabes, entre outros povos. Com a posse de mais este importante ponto estratégico, juntamente com Ormuz, Goa e Diu, no controlo das rotas marítimas e comerciais entre o Ocidente e o Oriente, Portugal agigantou-se perante o mundo."[11]

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Figura 20 – Azulejaria, “Tomada de Malaca".

Painel azulejar, composto por azulejos cromáticos (azul e branco), de barro calcário revestido de vidro estanífero, de fabrico manual e reproduzido ao estilo joanino (reinado de D. João V), com a pintura alusiva à Tomada de Malaca, em agosto de 1511, na sequência de outras vitórias consideradas estratégicas ao controlo das rotas marítimas e comerciais entre o Ocidente e o Oriente.

(Autor: Victoria Pereira. Data: 1944. Dimensões: altura 212,80 x largura 219,20 cm. Número de inventário: MML05600)

 

Escultura:

p.      Maquete da Fortaleza de Diu (Índia)

A fortaleza localizada na ilha de Diu, no extremo Sul da Península de Kathiawar - Índia. Erguida por forças portuguesas em 1535-1536 é considerada pelos estudiosos de arquitetura militar como a mais importante e bem fortificada estrutura erguida no Estado Português da Índia. Devido à sua importância estratégica, esta fortaleza foi alvo da cobiça e resistiu a inúmeros cercos e ataques de árabes, turcos, indianos e às diversas tentativas holandesas para dela se apoderarem em finais do século XVII. Considerada como indestrutível, acompanhou o declínio de Diu a partir do século XVIII até à sua queda final em dezembro de 1961, frente às forças da União Indiana.

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Figura 21 – Maquete executada numa pedra da própria fortaleza.

Foi oferecida ao Museu de Artilharia em 1898, pelo 1º Bispo de Diu, D. António Pedro da Costa.

(Material: Arenito. Data: Séc. XX. Dimensões: largura 70 cm X comprimento 92 cm. Peso: 70 Kg. Nº Inventário - MML00417.)

 

Pintura:

q.      Óleo sobre tela, na sala Ásia

Nesta sala, são observáveis as cinco magníficas pinturas de teto, da autoria do insigne pintor Columbano, e alusivas à presença portuguesa neste continente e às relações entre os dois povos. A pintura central é uma composição alegórica, com destaque para dois heróis nacionais: Vasco da Gama e Afonso de Albuquerque.

r.       Óleo sobre tela, na sala Vaso da Gama

Nesta sala, são observáveis as quatro monumentais pinturas de parede, da autoria do ilustre pintor Carlos Reis, inspiradas em várias estrofes camonianas de “Os Lusíadas", relativas à ousadia e coragem dos navegadores portugueses, com destaque para o “Concílio dos Desuses". A pintura de teto é da autoria de Luigi Manini, que representa os descobrimentos marítimos portugueses e as viagens de exploração terrestre do continente africano. 

22. Perspetiva sobre busto de Vasco da Gama e Concílio dos Deuses.jpg

Figura 22 – Perspetiva ao busto de Vasco da Gama e à pintura, óleo sobre tela, Concílio dos Deuses, de Carlos Reis, na Sala Vasco da Gama.

23. Pintura de teto, de Luigi Manini,  na sala Vasco da Gama.jpg

Figura 23 – Destaque à pintura de teto, óleo sobre tela, Descobrimentos marítimos portugueses e viagens de exploração do continente africano, de Luigi Manini, na Sala Vasco da Gama. Esta obra esteve exposta na Exposição Universal de Paris, em 1900.

 

s.       Óleo sobre tela, na sala Afonso de Albuquerque

Nesta sala, salientam-se as duas pinturas referentes às ações guerreiras de Afonso de Albuquerque; a conquista de Malaca, da autoria de Ernesto Condeixa, e a conquista da ilha de Sokotora, de Jorge Colaço.

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Figura 24 – Quadro, pintura, Conquista de Malaca.

(Óleo sobre tela. Autor: Ernesto Condeixa. Data: 1903. Dimensões: altura 190 x largura 130 cm. Número de Inventário: MML00401)

 

u. Figura humana – D. João de Castro

Para além de algumas insignes figuras humanas já referidas, como Vasco da Gama e Afonso de Albuquerque, importa agora relevar uma outra personalidade – talvez menos conhecida – que configura de enorme relevância na identidade portuguesa, sendo também herói nacional: D. João de Castro.

 A vida e obra de D. João de Castro (1500-1548) ficou indelevelmente marcada pelas suas brilhantes e multifacetadas caraterísticas de militar, estadista e diplomata, também de cultura e de ciência e, ainda, de humanista.

No campo de batalha, destacou-se na conquista de Tunes (1535). Como Governador da Índia (13º), ousou o segundo cerco à fortaleza de Diu (1546), do qual as armas portuguesas saíram vitoriosas, tendo recebido no ano seguinte o título de Vice-Rei da Índia (4º). Restabeleceu com diplomacia o ambiente favorável à honra portuguesa e atenuou o ambiente de descrédito e ódio herdados dos governos anteriores. Também nas letras e na ciência deixou um rico legado para o conhecimento literário e científico, com os três roteiros da sua autoria de "Lisboa a Goa“, de "Goa a Diu“ e "Mar Roxo“, e os seus metódicos e persistentes estudos científicos permitiram verificar a "inexistência de relações de causalidade entre o nordestear da agulha do astrolábio e as mudanças de meridiano, a sensibilidade da agulha magnética à proximidade dos metais“ e registar a cartografia local por onde passava.

A D. João de Castro ainda lhe são atribuídas invulgares qualidades humanas, como por exemplo o espírito de servir, a justiça, a honra e a coragem. Por isso, esta heroica personagem foi utilizada como referencial de valores militares e de cidadania, tendo sido escolhido, no final da década de 50 do século passado, para Patrono do atual Instituto dos Pupilos do Exército e Patrono do Curso de entrada na Academia Militar no ano letivo de 1959/1960.

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Figura 25 – Quadro, pintura, retrato de D. João de Castro.

(Óleo sobre tela. Autor: João de Melo Trigoso. Data: 1ª metade do século XX. Dimensões: altura 90 x largura 70 cm. Número de Inventário: MML05808)​

 

Considerações finais

O MML é o museu militar mais antigo de Portugal e um dos museus com mais anos de serviço público, vocacionado para a educação histórico-cultural e patrimonial de Portugal multissecular, e contribuindo para a sua identidade e coesão intergeracional. O continente asiático faz parte também da nossa história coletiva e contribui para a idiossincrasia portuguesa. Da Índia, passando pela China, Japão, até Timor, os testemunhos materiais legados pelos nossos antepassados perduram em geral no MML, bem como algumas aceções imateriais, como por exemplo: expressões orais, tradições, usos, costumes, artes, e há muito mais para narrar sobre esta relação de Portugal e o continente asiático: sítios, localidades, outras ilustres personalidades portuguesas, como por exemplo governadores e vice-reis da Índia, outros artistas, armaria, artes, fundidores, outras salas temáticas (salas Camões, Infante D. Henrique, Rainha D. Maria II, Vestíbulo e Peristilo).


NOTAS

[1] Informação extraída da respetiva ficha de inventário, base de dados InArt Premium, do MML, com o Nº de Inventário MML00020. Disponível parcialmente em https://patrimonioweb.exercito.pt/ficha.aspx?t=o&id=2730

[2] Informação extraída da respetiva ficha de inventário, base de dados InArt Premium, do MML, com o Nº de Inventário MML01223. Disponível parcialmente em https://patrimonioweb.exercito.pt/ficha.aspx?t=o&id=3208

[3] - Informação extraída da respetiva ficha de inventário, base de dados InArt Premium, do MML, com o Nº de Inventário MML00021. Disponível parcialmente em https://patrimonioweb.exercito.pt/ficha.aspx?t=o&id=2724

[4] Informação extraída da respetiva ficha de inventário, base de dados InArt Premium, do MML, com o Nº de Inventário MML01002. Disponível parcialmente em https://patrimonioweb.exercito.pt/ficha.aspx?t=o&id=16673

[5] - Informação extraída da respetiva ficha de inventário, base de dados InArt Premium, do MML, com o Nº de Inventário MML00995. Disponível parcialmente em https://patrimonioweb.exercito.pt/ficha.aspx?t=o&id=16713

[6] Informação extraída da respetiva ficha de inventário, base de dados InArt Premium, do MML, com o Nº de Inventário MML00994. Disponível parcialmente em https://patrimonioweb.exercito.pt/ficha.aspx?t=o&id=16775

[7] - Informação extraída da respetiva ficha de inventário, base de dados InArt Premium, do MML, com o Nº de Inventário MML00275. Disponível parcialmente em https://patrimonioweb.exercito.pt/ficha.aspx?t=o&id=16664

[8] Informação extraída da respetiva ficha de inventário, base de dados InArt Premium, do MML, com o Nº de Inventário MML06291. Disponível parcialmente em https://patrimonioweb.exercito.pt/ficha.aspx?t=o&id=27479

[9] Informação extraída da respetiva ficha de inventário, base de dados InArt Premium, do MML, com o Nº de Inventário MML06301. Disponível parcialmente em https://patrimonioweb.exercito.pt/ficha.aspx?t=o&id=27500

[10] A lenda do General Guan Yu narra o seguinte: “O General Guan Yu teve que entrar no acampamento militar do General Cao Cao para encontrar proteção. Mas Guan Yu não aceitou os presentes de Cao Cao, um grande número de ouro, joias e várias belezas. Guan Yu insistiu na sua lealdade e crença, recusou-se a trair o seu irmão jurado Liu Bei e recusou-se a ser subordinado de Cao Cao. No final, depois de recompensar a bondade de Cao Cao, Guan Yu deixou o acampamento militar de Cao Cao, com as duas esposas de Liu Bei, Madame Gan e Mi, sob a proteção do Guan Yu. Guan Yu aceitou o cavalo chamado Chi Tu e o manto de seda dado por Cao Cao. Guan Yu vestiu o novo manto de seda para expressar sua gratidão a Cao Cao, mas ele não tirou o velho manto que Liu Bei havia dado a ele antes, indicando que ele nunca mudaria de posição. O cavalo Chi Tu era muito famoso e o melhor cavalo de guerra da época. Guan Yu precisava do cavalo para lutar e encontrou o irmão jurado perdido, Liu Bei. 

[11] - Disponível em: https://www.facebook.com/photo.php?fbid=1064047211323232&set=pb.100031538895793.-2207520000&type=3&locale=pt_PT.



Francisco Amado Rodrigues

Coronel de Cavalaria, na Reserva na Efetividade de Serviço, Diretor do MML desde 15 de janeiro de 2021. Mestre em Museologia e Museografia (2005), licenciaturas em História e em Ciências Militares, especialidade de Cavalaria. Comandou os diferentes escalões, desde Pelotão até Grupo, na Escola Prática de Cavalaria, entre outras funções de Oficial de Estado-Maior. Professor militar na Academia Militar, entre outros cargos ligados ao ensino militar. Diretor da Revista da Cavalaria. Coordenou vários projetos de museus e coleções visitáveis militares. Autor de vários livros, dois dos quais premiados.


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Como citar este texto:

RODRIGUES, Francisco Amado – 1.     Museu Militar de Lisboa. Acervo Patrimonial da Presença Portuguesa no Oriente. Revista Portuguesa de História Militar - Dossier: Génese do​ Império Português do Oriente. [Em linha] Ano III, nº 5 (2023); https://doi.org/10.56092/XLBH9110 [Consultado em ...].


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