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CARACTERIZAÇÃO EVOLUÇÃO DA ​DO TERRITÓRIO PÁTRIO DURANTE A EXPANSÃO ULTRAMARINA

 

 

Foto Brandão Ferreira.jpg

JOÃO JOSÉ BRANDÃO FERREIRA​

 

O primeiro passo de uma Nação, para aproveitar as suas vantagens é conhecer perfeitamente as terras que habita, o que em si produzem, o de que são capazes."

Memória Económica, Abade Correia da Serra

 

 

 

Resumo

O artigo trata das diferentes designações do território Pátrio desde a fundação de Portugal por Afonso Henriques, até aos dias de hoje, passando pela expansão ultramarina.

Para tal inclui-se uma abordagem sobre os títulos que os Reis de Portugal usaram até à implantação da República e variaram conforme se acrescentava ou não, território ao existente.

Do mesmo modo se faz uma análise das diferentes Constituições Portuguesas, relativamente à definição do território nacional em cada época e a da evolução dos direitos políticos dos seus habitantes, com especial destaque para a Constituição de 1933, derivado do seu adicional “Acto Colonial".

Uma síntese dos termos usados que vão de “Praças" a “Colónias" e de “Conquistas" a “Estados" e suas justificações, encerram o escrito.

Palavras-chave: Portugal; Reis; Cognomes; Constituição; Território Nacional; Termos de designação do Território; Evolução.

 

Abstract

The article deals with the different designations of Portuguese territory from the foundation of Portugal by Afonso Henriques to the present day, including overseas expansion.

To this end, it includes an approach to the titles used by the Kings of Portugal until the establishment of the Republic, which varied according to whether or not territory was added to the existing territory.

An analysis is also made of the different Portuguese Constitutions, in relation to the definition of the national territory at each time and the evolution of the political rights of its inhabitants, with special emphasis on the 1933 Constitution, derived from its additional "Colonial Act".

A summary of the terms used, ranging from "Stronghold" to "Colonies" and from "Conquests" to "States" and their justifications, concludes the article.

Keywords: Portugal; Kings; Cognomen; Constitution; National Territory; Territory designation terms; Evolution.

 


Os territórios e os povos que constituíram a Nação Portuguesa foram sempre unos. Isto é, caracterizaram-se, desde o princípio da Nacionalidade, pela unidade e pela tendência para a unidade. Os reis Portugueses foram juntando títulos à medida que a expansão do Condado Portucalense se foi efectuando e desde que Portugal pôs pé em Ceuta, em 1415, e se espalhou pelos quatro cantos do Mundo. Deste modo, Afonso Henriques[1] tomou o título de rei após a batalha de Ourique, em 1139, sendo de 1140 o primeiro documento em que tal denominação aparece escrita. Os seus descendentes – D. Sancho I[2] , D. Afonso II[3], D. Sancho II[4] – mantiveram o título de Rei de Portugal, até que D. Afonso III[5] passou a designar-se “Rei de Portugal e dos Algarves", (desde Março de 1268), por ter sido no seu reinado que o Algarve foi incorporado na Coroa Portuguesa, por acordo de 1263.

Foi durante o reinado de seu filho D. Dinis[6], que as fronteiras de Portugal Continental ficaram firmadas pelo tratado de Alcanizes, de 1279, após se terem acordado com Castela as disputas sobre os territórios de Riba Côa e da margem esquerda do Guadiana, onde se incluía Olivença e o seu termo. O título de rei de Portugal e dos Algarves não sofreu modificação até ao final da I dinastia com D. Afonso IV[7]; D. Pedro I[8] e D. Fernando[9].

Com a subida ao trono de D. João I[10], que fundou a dinastia de Avis, nada se alterou até à tomada de Ceuta, em 1415, após o que aquele rei passou a designar-se “Rei de Portugal e dos Algarves e senhor de Ceuta". Igual título tomou D. Duarte[11].

D. Afonso V[12] mudou o título, em 1471, para “Rei de Portugal e dos Algarves D'Áquem e D'Àlém Mar em África", ao que D. João II[13]  acrescentou “e senhor da Guiné", em 1485. Com D. Manuel I[14] houve grandes mudanças devido à incrível expansão ultramarina portuguesa: “Rei de Portugal e dos Algarves D' Áquem e D' Álém Mar e Senhor da Guiné, da Conquista, Navegação, Comércio, da Etiópia, Arábia, Pérsia e Índia". Este título manteve-se com D. João III[15], D. Sebastião[16], D. Henrique[17] e D. António[18]. Os Filipes herdaram a coroa portuguesa e seus títulos.

Os reis da Dinastia de Bragança voltaram a assumir o título usado por D. Manuel I, já que o mesmo aparece escrito em variada documentação oficial[19]. Porém, a partir de 1815, no reinado de D. João VI, aquando da elevação do Brasil a Reino, aquele monarca passou a intitular-se: “Rei do Reino Unido de Portugal, Brasil e Algarve, D' Áquem e D' Àlém Mar em África, etc." O título foi efémero dado que, com a independência do Brasil, este reino deixou de fazer parte dos títulos dos reis de Portugal, como já assumido por D. Pedro IV e vem consignado na outorga da Carta de 1826.

A Constituição de 4 de Abril de 1838 é a única a trazer à cabeça da mesma o título da Rainha D. Maria II: “Rainha de Portugal e dos Algarves, D'Áquem e D'Álém Mar em África, senhora da Guiné e da Conquista, Navegação e Comércio da Etiópia, Arábia, Pérsia, e da Índia, etc." Este título vigorou, portanto, até ao fim da Monarquia usando normalmente os reis o título abreviado de, “Rei de Portugal e dos Algarves, etc."

Com a proclamação da República, em 5 de Outubro de 1910, a figura do rei passou a ser desempenhada pelo Presidente da República Portuguesa, que não juntava a este título qualquer outro.[20]

Um outro aspecto pelo qual podemos verificar a evolução que o território português teve ao longo dos tempos é a análise do que vem configurado nas diferentes Constituições Portuguesas. E isto porque, antes de haver Constituição, não estava expressa, digamos, uma formulação jurídica do território.

 

A primeira Constituição portuguesa deriva directamente da Revolução de 1820 (ou vintista) e foi aprovada em 23 de Setembro de 1822.[21] No seu Título II “Da Nação Portuguesa e seu Território, Religião, Governo e Dinastia", artigo 20, podemos ler:

“A Nação Portuguesa é a união de todos os Portugueses de ambos os hemisférios. O seu território forma o Reino Unido de Portugal, Brasil e Algarves, e compreende:

I – Na Europa, o reino de Portugal, que se compõe das províncias do Minho, Trás-os-Montes, Beira, Estremadura, Alentejo, e reino do Algarve, das Ilhas Adjacentes, Madeira, Porto Santo e Açores;

II – Na América, o reino do Brasil, que se compõe das províncias do Pará e Rio Negro, Maranhão, Pianí, Rio Grande do Norte, Ceará, Paraíba, Pernambuco, Alagoas, Bahia e Sergipe, Minas Gerais, Espírito Santo, Rio de Janeiro, São Paulo, Santa Catarina, Rio Grande do Sul, Goiás, Mato Grosso, e das ilhas de Fernando de Noronha Trindade, e das mais que são adjacentes àquele reino;

III – Na África Ocidental, Bissau e Cacheu; na Costa da Mina, o forte de S. João Baptista de Ajudá, Angola, Benguela e suas dependências, Cabinda e Molembo, as ilhas de Cabo Verde, e as de S. Tomé e Príncipe e suas dependências; na Costa Oriental, Moçambique, Rio de Sena, Sofala, Inhambane, Quelimane, e as ilhas de Cabo Delgado;

IV – Na Ásia, Salsete, Bardez, Goa, Damão, Diu, e os estabelecimentos de Macau e das ilhas de Solôr e Timor".

A nação não renuncia o direito, que tenha a qualquer porção de território não compreendida no presente artigo. Do Território do Reino Unido se fará conveniente divisão.[22]


Seguiu-se a Carta Constitucional, outorgada por D. Pedro IV, em 29 de Abril 1826.[23]

O seu artigo 2 do Título I definia assim o Território Nacional:

“O seu território forma o Reino de Portugal e Algarves, e compreende:

1º - Na Europa, o reino de Portugal, que se compõe das províncias do Minho, Trás-os-Montes, Beira, Estremadura, Alentejo e reino do Algarve, e das ilhas adjacentes, Madeira, Porto Santo e Açores;

2º - Na África Ocidental, Bissau e Cacheu, na Costa da Mina, o Forte de S. João Baptista de Ajudá, Angola, Benguela, e suas dependências, Cabinda e Molembo, as ilhas de Cabo Verde, e de S. Tomé e Príncipe e suas dependências; na Costa Oriental, Moçambique, Rio de Sena, Sofala, Inhambane, Quelimane e as ilhas de Cabo Delgado.

3º - Na Ásia, Salsete, Bardez, Goa, Damão, Diu e os estabelecimentos de Macau e das ilhas de Solôr e Timor".

E acrescentava no seu artigo:

“A Nação não renuncia o direito que tenha sobre qualquer porção de Território nestas três partes de Mundo, não compreendida no antecedente Artigo".

Os artigos 63 a 69, determinavam quem podia ser eleito para as Cortes e não fazia qualquer discriminação em relação ao Ultramar.[24] O artigo n.º 132 mantinha a administração das Províncias Ultramarinas como do anterior. Porém, através do acto adicional, de 5 de Junho de 1852, o seu artigo 15, veio a dispôr o seguinte: “As Províncias Ultramarinas poderão ser governadas por Leis especiais, segundo o exigir a conveniência de cada uma delas".

1º - Não estando reunidas as Cortes, o Governo, ouvidos e consultados as estações competentes, poderá decretar em conselho as providências legislativas que forem julgadas urgentes.

2º - Igualmente poderá o Governador-Geral de uma Província Ultramarina tratar, reunindo o seu Conselho de Governo, as providências indispensáveis para acudir a alguma necessidade tão urgente que não possa esperar pela decisão das Cortes ou do Governo.

3º - Em ambos os casos, o Governo submeterá às Cortes, logo que se reunirem, as providencias tomadas.

4º - Fica, deste modo, determinada a disposição do artigo cento e trinta e dois da Carta Constitucional, relativamente às Províncias Ultramarinas.

Esta Constituição reflectia já a perda do Brasil, independente desde 1822, e a abdicação de D. Pedro em sua filha D. Maria da Glória.


Segue-se a Constituição de 1838, que entrou em vigor a 4 de Abril, aceite e jurada por D. Maria II. No seu artigo 2º estabelece:

“O território português compreende:

Na Europa, as Províncias de Trás-os-Montes, Minho, Beira, Estremadura, Alentejo, o Reino do Algarve e as ilhas Adjacentes da Madeira e Porto Santo e dos Açores;

Na África Ocidental, Bissau a Cacheu, o Forte de S. João Baptista de Ajudá na Costa da Mina, Angola e Benguela e suas dependências, Cabinda e Molembo, as ilhas de Cabo Verde, as de S. Tomé e Príncipe e suas dependências;

Na África Oriental, Moçambique, Rio de Sena, Baía de Lourenço Marques, Sofala, Inhambane, Quelimane, e as Ilhas de Cabo Delgado;

Na Ásia, Salsete, Bardez, Goa, Damão, Diu, o estabelecimento de Macau, e as ilhas de Timor e Solôr.

§ Único - A Nação não renuncia a qualquer outra porção de território a que tenha direito".

O artigo 6 define a cidadania portuguesa e, novamente, não faz qualquer distinção com os habitantes do Ultramar que continuam a estar representados nas Cortes.[25]

A Constituição de 1838, com os actos adicionais já referidos, foi a constituição que, até hoje, se manteve mais tempo em vigor – 73 anos – caindo com a Monarquia.

 

O novo regime não demorou muito tempo em aprovar a primeira Constituição Republicana, o que teve lugar em 21 de Agosto de 1911.[26]

Relativamente à definição do território português, a Constituição foi sintética, limitando-se, no seu artigo 2 do Título I, a preconizar: “O Território da Nação Portuguesa é o existente à data da proclamação da Republica".

§ Único - A Nação não renuncia aos direitos que tenha ou possa vir a ter sobre outro qualquer Território".

Assumia-se, portanto, o que vinha do anterior. Continuava ainda, através do Título V, a considerar como “Províncias Ultramarinas" os territórios fora da Europa. E era sucinto o seu artigo 67º (e único) relativamente à sua administração:

“Na administração das Províncias Ultramarinas predominará o regime de descentralização, com leis especiais adequadas ao estado de cada uma delas". 

Mais adiante (artigo 74º), a Constituição remetia para a lei civil, a definição de cidadão nacional.

O artigo 9, do Título III, especificava relativamente à representação nacional na Assembleia Nacional Constituinte, um senador por cada Província Ultramarina e o número de deputados, através dos colégios eleitorais o que não viria a ser modificado pelas alterações posteriores.

Porém, a Lei nº 1005 de 7 de Agosto de 1920, já falava em colónias. O seu artigo 1º dizia: “As colónias portuguesas gozam, sob a fiscalização financeira e das descentralizações compatíveis com o desenvolvimento de cada uma, e regem-se por leis orgânicas especiais e por diplomas coloniais nos termos deste “Titulo". E no seu artigo 2º, definia como sendo da “exclusiva competência do Congresso da República fazer as leis orgânicas coloniais e os diplomas legislativos coloniais".

 

Finalmente, e para o âmbito do nosso estudo, temos a considerar a Constituição de 1933.

Devemos constatar, em primeiro lugar, que o país viveu sem Constituição entre o Golpe de Estado de 28 de Maio de 1926 e a aprovação desta última Constituição, em 11 de Abril de 1933, depois de ter sido submetida a plebiscito, em 19 de Março do mesmo ano.[27]

A Constituição de 1933 contém uma característica inovadora importante: incluía um segundo documento intitulado “Acto Colonial" onde, sem embargo do espírito unitário da Nação portuguesa, se consignava as especialidades respeitantes ao espaço territorial fora das fronteiras europeias.

A Constituição, logo no fim do artigo 1º do Título I, especificava: “o Território de Portugal é o que actualmente lhe pertence e compreende:

1º - Na Europa: o Continente e Arquipélagos da Madeira e dos Açores;

2º - Na África Ocidental: Arquipélago de Cabo Verde, Guiné, S. Tomé e Príncipe e suas dependências, S. João Baptista de Ajudá, Cabinda e Angola;

3º - Na África Oriental: Moçambique;

4º - Na Ásia: Estado da Índia e Macau e respectivas dependências;

5º - Na Oceânia: Timor e suas dependências.

§ Único - A nação não renuncia aos direitos que tenha ou possa vir a ter sob qualquer outro território". 

E acrescenta-se no seu artigo 2º: “Em nenhuma parcela do território nacional pode ser adquirida por Governo ou entidade de direito público de país estrangeiro, salvo para instalação de representação diplomática ou consulado se existir reciprocidade em favor do Estado Português".

E no artigo 3º: “Constituem a Nação todos os cidadãos portugueses residentes dentro ou fora do seu território, os quais são considerados dependentes do Estado e das leis portuguesas, salvas regras aplicáveis de direito internacional…"

O artigo 108º remetia para o Conselho de Ministros a competência para nomear os governadores das colónias. E Título VI – Do Império Colonial Português, prescrevia no seu artigo 132º: “São consideradas matéria constitucional as disposições do Acto Colonial, devendo o governo publicá-lo novamente com as alterações exigidas pela presente Constituição".

Deste modo, o Acto Colonial no seu Título I, Artigo 1º, prescrevia: “A Constituição Política da República, em todas as disposições que por sua natureza se não refiram exclusivamente à Metrópole, é aplicável às colónias com os preceitos dos artigos seguintes".

Artigo n.º 2: “É da essência Orgânica da Nação Portuguesa desempenhar a função histórica de possuir e colonizar domínios ultramarinos e de civilizar as populações que neles se compreendam, exercendo também a influência moral que lhe é adstrita pelo Padroado do Oriente.

Artigo 3º - “Os domínios ultramarinos de Portugal denominam-se colónias e constituem o Império Colonial Português. O território do Império Colonial Português é o definido nos números 2º a 5º do artigo 1º da Constituição".

Artigo 5º - “O Império Colonial Português é solidário nas suas partes componentes e com a metrópole".

Artigo 6º - “A solidariedade do Império Colonial Português abrange especialmente a obrigação de contribuir pela forma adequada para que sejam assegurados os fins de todos os seus membros e a integridade e defesa da Nação".

Artigo 7º - “O Estado não aliena, por nenhum modo, qualquer parte dos territórios e direitos coloniais de Portugal, sem prejuízo da rectificação de fronteiras, quando aprovada pela Assembleia Nacional".

O Estado reconhecia, porém, uma diferenciação dentro dos cidadãos nacionais, os habitantes dos Territórios Ultramarinos, denominados “indígenas", no Título II, Acto Colonial. O seu artigo 15º especificava: “O Estado garante a protecção e defesa dos indígenas das colónias, conforme os princípios de moralidade e soberania, as disposições deste título e as convenções internacionais que actualmente vigorem ou venham a vigorar.

As autoridades coloniais impedirão e castigarão conforme a lei todos os abusos contra a pessoa e bens dos indígenas".

Artigo 18º - “O trabalho dos indígenas em serviço do Estado ou dos corpos administrativos é remunerado".

Artigo 19º - “São proibidos:

1º - Todos os regimes pelos quais o Estado se obrigue a fornecer trabalhadores indígenas a qualquer empresa de exploração;

2º - Todos os regimes pelos quais os indígenas existentes em qualquer circunscrição territorial sejam obrigados a efectuar trabalho às mesmas empresas, por qualquer título".

Artigo 26º - (Do regime Político e Administrativo – Título III) “São garantidas às colónias a descentralização administrativa e a autonomia financeira que sejam compatíveis com a Constituição, o seu estado de desenvolvimento e os seus recursos próprios, sem prejuízo do disposto do artigo 47º.

§ Único - Em cada uma das colónias será mantida a unidade política pela existência de uma só capital e de um só governo-geral ou de colónia".

Artigo 40º (Da garantia Económica e Financeira, Título IV) “Cada colónia tem o seu orçamento privativo elaborado segundo um plano uniforme".

 

Vejamos agora o que de notável houve no âmbito em estudo, aquando das revisões constitucionais.

A Lei n.º 1900, de 21 de Maio de 1935, mudou a redacção dos seguintes artigos do Acto Colonial:

Artigo 1º - “A Constituição Política da República, em todas as disposições que, por sua natureza, se não refiram exclusivamente à Metrópole, é aplicável às Colónias, guardados os preceitos dos artigos seguintes, e prescrevia para o artigo 40º, o seguinte: “Cada colónia tem o seu orçamento privativo, elaborado segundo um plano uniforme e de harmonia com os princípios consignados no artigo 63º da Constituição.

A Lei n.º 2009, de 17 de Setembro de 1945, acrescentava ao artigo 27º do Acto Colonial".

§ Único - “Em caso de urgência extrema o governo com voto afirmativo do conselho do Império Colonial em sessão presidia pelo Ministro das Colónias, poderá legislar sobre as matérias a que se referem o n.º 1 e as alíneas a) e b) do n.º 2 do presente artigo fora do período das sessões da Assembleia Nacional"; e alterava o artigo 40º para: “Cada Colónia tem o seu orçamento privativo, elaborado segundo um plano e de harmonia com os princípios consignados nos artigos 63º e 66º da Constituição.

1º - O orçamento geral da Colónia incluirá somente despesas ou receitas permitidas por diplomas legais e não entrará em vigor sem autorização ou aprovação expressa do ministro das Colónias.

2º - Quando o orçamento não possa entrar em execução no começo do ano económico, continuarão provisoriamente em vigor, por duodécimos, só quanto à despesa ordinária, o orçamento do ano antecedente e os créditos sancionados durante ele para ocorrer a novos encargos permanentes".

A Lei n.º 2048, de 11 de Junho de 1951, introduz substanciais alterações nomeadamente de terminologia, no sentido de fazer face ao ambiente internacional, sobretudo no que tocava ao Direito Colonial Internacional saído da Segunda Guerra Mundial e a dar maior coerência à doutrina integracionista seguida para a totalidade do território nacional.

Deste modo, a designação de império colonial e colónias, desaparece sendo substituídos por ultramar e províncias ultramarinas, com alteração dos seguintes artigos: 

Artigos 2º - O Estado não aliena por nenhum modo qualquer parte do território nacional ou direitos de soberania que sobre ele exerce, sem prejuízo da ractificação de fronteiras, quando aprovada pela Assembleia Nacional.

§ 1º - Nenhuma parcela do território nacional pode ser adquirida por Governo ou entidade de direito público de país estrangeiro, salvo para instalação de representação diplomática ou consular, se existir reciprocidade em favor do Estado Português.

§ 2º - Nos territórios ultramarinos a aquisição por Governo estrangeiro de terreno ou edifício para instalação de representação consular será condicionada pela anuência do Ministro do Ultramar à escolha do respectivo local.

Artigo 133º - É da essência orgânica da Nação Portuguesa desempenhar a função histórica de colonizar as terras dos Descobrimentos sob a sua soberania e de comunicar e difundir entre as populações ali existentes os benefícios da sua civilização, exercendo também a influência moral que é adstrita ao Padroado do Oriente.

Artigo 134º - Os territórios ultramarinos de Portugal indicados nos nos 2º a 5º do artigo 1º denominam-se genericamente «províncias» e têm organização político-administrativa adequada à situação geográfica e às condições do meio social.

Artigo 135º - As províncias ultramarinas, como parte integrante do Estado Português, são solidárias entre si e com a metrópole.

Artigo 136º - A solidariedade entre as províncias ultramarinas e a metrópole abrange especialmente a obrigação de contribuir por forma adequada para assegurar a integridade e defesa de toda a Nação e os fins da política nacional definidos no interesse comum pelos órgãos da soberania.

Artigo 137º - Os direitos, liberdades e garantias individuais, consignados na Constituição, são igualmente reconhecidos a nacionais e estrangeiros nas províncias ultramarinas, nos termos da lei, mas sem prejuízo de a uns e outros poder ser recusada a entrada em qualquer delas ou ordenada a expulsão, conforme estiver regulado, se da sua presença resultarem graves inconvenientes de ordem interna ou internacional, e destas resoluções caberá recurso unicamente para o Governo.

Artigo 138º - Haverá nos territórios ultramarinos, quando necessário e atendendo ao estado de evolução das populações, estatutos especiais que estabeleçam, sob a influência do direito público e privado português, regimes jurídicos de contemporização com os seus usos e costumes, se não forem incompatíveis com a moral, ditames de humanidade ou o livre exercício da soberania portuguesa.

Artigo 139º - O Estado assegura nos seus territórios ultramarinos a liberdade de consciência e o livre exercício dos diversos cultos, com as restrições exigidas pelos direitos e interesses da soberania de Portugal, bem como pela manutenção da ordem pública, e de harmonia com os tratados e convenções internacionais.

Artigo 140º - As missões católicas portuguesas do ultramar e os estabelecimentos de formação do pessoal para os serviços delas e do Padroado terão personalidade jurídica e serão protegidos e auxiliados pelo Estado, como instituições de ensino e assistência e instrumentos de civilização, nos termos das concordatas e mais acordos celebrados com a Santa Sé.

Artigo 141º - O Estado por medidas especiais, como regime de transição, a protecção e defesa dos indígenas, nas províncias onde os houver, conforme os princípios de humanidade e soberania, as disposições deste capítulo e as convenções internacionais.

As autoridades e os tribunais impedirão e castigarão nos termos da lei os abusos contra a pessoa e bens dos indígenas.

Artigo 142º - O estado estabelece instituições públicas e promove a criação de instituições particulares, umas e outras portuguesas, em favor dos direitos dos indígenas ou para a sua assistência.

Artigo 143º - É garantido aos indígenas, nos termos da lei, a propriedade e posse dos seus terrenos e culturas, devendo ser respeitado este princípio em todas as concessões feitas pelo Estado.

Artigo 144º - O trabalho dos indígenas contratados para o serviço do Estado ou dos corpos administrativos é remunerado.

Artigo 145º - São proibidos:

1º - Os regimes pelos quais o estado se obrigue a fornecer trabalhadores indígenas a quaisquer empresas de exploração económica;

2º - Os regimes pelos quais os indígenas existentes em qualquer circunscrição territorial sejam obrigados a prestar trabalho às mesmas empresas por qualquer título.

Artigo 146º - O Estado somente pode compelir os indígenas ao trabalho em obras públicas de interesse geral da colectividade, em ocupações cujos resultados lhes pertençam, em execução de decisões judiciárias de carácter penal ou para cumprimento de obrigações fiscais.

Artigo 147º - o regime do contracto de trabalho dos indígenas assenta na liberdade individual e no direito a justo salário e assistência, intervindo a autoridade pública somente para fiscalização.

Artigo 148º - São garantidas às províncias ultramarinas a descentralização administrativa e a autonomia financeira compatíveis com a Constituição e com o seu estado de desenvolvimento e os recursos próprios, sem prejuízo do disposto no artigo 175º.

§ Único – Em cada uma das províncias ultramarinas será mantida a unidade política, pela existência de uma só capital e do governo da província.

Artigo 149º - As províncias ultramarinas reger-se-ão, em regra, por legislação especial, emanada dos órgãos legislativos com sede na metrópole ou, relativamente a cada uma delas, dos órgãos legislativos provinciais, conforme as normas de competência fixadas na lei.

Artigo 150º - Os órgãos metropolitanos com atribuições de legislar para o ultramar são:

1º - A Assembleia Nacional, mediante proposta do Ministro do Ultramar, nos assuntos que devam constituir necessariamente matéria de lei segundo o artigo 93º, e ainda nos seguintes:

a) Regime geral de governo das províncias ultramarinas;

b) Definição da competência do Governo da metrópole e dos governos ultramarinos quanto à área e ao tempo das concessões de terrenos ou outras que envolvam exclusivo ou privilégio especial;

c) Autorização de contratos que não sejam de empréstimo quando exijam caução ou garantias especiais. 

2º - O Governo quando, nos termos da Constituição, tiver de dispôr por meio de decreto-lei para todo o território nacional ou se o diploma regular matéria de interesse comum da metrópole e de alguma ou algumas das províncias ultramarinas;

3º - O Ministro do Ultramar, cuja competência abrange todas as matérias que representam interesses superiores ou gerais da política nacional no ultramar ou sejam comuns a mais de uma província ultramarina, como for especificado no regime legal a que se refere a alínea a) do n.º 1º deste artigo.

§ A competência legislativa do Ministro do Ultramar será exercida precedendo parecer do Conselho Ultramarino, salvo nos casos de urgência e nos demais indicados na lei, bem como naqueles em que o Conselho demore mais de trinta dias o parecer sobre a consulta que lhe haja sido feita pelo Ministro.


Os diplomas a publicar no exercício desta competência legislativa revestirão a forma de decreto, promulgado e referendado nos termos da Constituição, adoptando-se a forma de diploma legislativo ministerial quando o Ministro estiver exercendo as suas funções em qualquer das províncias ultramarinas e de portaria nos casos previstos na lei.

§ 2º - Todos os diplomas para vigorar nas províncias ultramarinas carecem de conter a menção, aposta pelo Ministro do Ultramar, de que devem ser publicados no Boletim Oficial da província ou províncias onde hajam de executar-se.

§ 3º - Não pode ser contestada, com fundamento na violação deste artigo, a legitimidade constitucional dos preceitos contidos nos respectivos diplomas, salvo disposto no § único do artigo 123º.

Artigo 151º - São da competência dos órgãos legislativos das províncias ultramarinas que a lei definir todas as matérias que interessem exclusivamente à respectiva província e não sejam da competência da Assembleia Nacional, do Governo ou do Ministro do Ultramar, nos termos do artigo anterior.

§ 1º - Os acordos ou convenções não compreendidos nos artigos 81º, n.º 7º e 91º, n.º 7º, que os governos das províncias ultramarinas, devidamente autorizados, negociarem com os governos de outras províncias ou territórios, nacionais ou estrangeiros, dependem da aprovação do Ministério do Ultramar. 

§ 2º - Os diplomas dos governos ultramarinos não poderão revogar, suspender ou estatuir em contrário do que dispuserem a Constituição ou quaisquer outros diplomas emanados dos órgãos legislativos metropolitanos.

Artigo 152º - As funções de cada um dos governos das províncias ultramarinas, na esfera da sua competência, são exercidas sob a fiscalização dos órgãos da soberania e, por via de regra, conforme o voto de um conselho em que haverá representação adequada às condições do meio social.

Artigo 153º - O Governo superintende e fiscaliza o conjunto da administração das províncias ultramarinas, nos termos da Constituição e da lei ou leis orgânicas a que se refere a alínea a) do n.º 1º do artigo 150º, por intermédio dos órgãos que as mesmas leis indicarem.

Artigo 154º - Em cada uma das províncias ultramarinas haverá, como autoridade superior, um governador ou governador-geral, com as atribuições e prerrogativas que a lei definir, não podendo por qualquer forma conferir-se-lhe atribuições que pela Constituição pertençam à Assembleia Nacional, ao Governo ou ao Ministro do Ultramar, salvo as que restritamente lhe sejam outorgadas, por quem de direito, para determinados assuntos, em circunstâncias excepcionais.

§ Único - Não poderão ser nomeados governadores quaisquer interessados na direcção ou gerência de empresas com sede ou actividade económica na respectiva província.

Artigo 155º - As funções executivas em cada província ultramarina são desempenhadas pelo governador, que, nos casos previstos na lei, será assistido de um corpo consultivo.

Artigo 156º - A divisão administrativa das províncias ultramarinas e as condições em que nelas poderão ser instituídas autarquias locais serão determinadas por lei, tendo em atenção a importância, o desenvolvimento e a população de cada área.

§ Único – Sem prejuízo do disposto no § único do artigo 7º os estrangeiros com residência habitual no território por tempo não inferior a cinco anos, sabendo ler e escrever português, podem fazer parte dos corpos administrativos até ao máximo de um terço dos seus membros.

Artigo 157º - É supremo dever de honra do governador, em cada um dos territórios ultramarinos, sustentar os direitos de soberania da Nação e promover o bem da província, em harmonia com os princípios consignados na Constituição e nas leis.

Artigo 158º - A organização económica do ultramar deve integrar-se na organização económica geral da Nação portuguesa e comparticipar por seu intermédio na economia mundial.

§ Único - ​Para atingir os fins indicados neste artigo facilitar-se pelos meios convenientes, incluindo a gradual redução ou suspensão dos direitos aduaneiros, a livre circulação dos produtos dentro de todo o território nacional. O mesmo princípio se aplicará quando possível à circulação das pessoas e dos capitais.

Artigo 159º - Os regimes económicos das províncias ultramarinas são estabelecidos em harmonia com as necessidades do seu desenvolvimento e do bem-estar da sua população, com a justa reciprocidade entre elas e os países vizinhos, e com os direitos e legítimas conveniências da Nação Portuguesa, de que são parte integrante.

Artigo 160º - Pertence à metrópole, sem prejuízo da descentralização estabelecida no artigo 148º, assegurar pelas decisões dos órgãos competentes a conveniente posição dos interesses que, nos termos do artigo anterior, devem ser considerados em conjunto nos regimes económicos dos territórios ultramarinos.

Artigo 163º - De futuro a administração e exploração dos portos ou aeroportos do ultramar são reservados para o estado. Lei especial regulará as excepções que devam ser admitidas dentro de cada porto ou aeroporto em relação a determinadas instalações ou serviços.

Artigo 165º - As províncias ultramarinas são pessoas colectivas de direito público, com faculdade de adquirir, contratar e estar em juízo.

Artigo 166º - Pertence à metrópole, sem prejuízo da descentralização estabelecida no artigo 148º, assegurar pelas decisões dos órgãos competentes a conveniente posição dos interesses que, nos termos do artigo anterior, devem ser considerados em conjunto nos regimes económicos dos territórios ultramarinos.

Artigo 168º - Cada uma das províncias ultramarinas tem orçamento privativo, elaborado segundo plano uniforme, de harmonia com os princípios consignados nos artigos 63º e 66º, e votado pêlos seus próprios órgãos nos termos que a lei declarar.

§ 1º - O orçamento de cada província ultramarina incluirá somente as receitas e despesas permitidas por diplomas legais.

§ 2º - Quando o orçamento não possa entrar em execução no começo do ano, económico, continuarão provisoriamente em vigor, por duodécimos, só quanto à despesa ordinária, o orçamento do ano anterior e os créditos sancionados durante ele para ocorrer a novos encargos permanentes.

Artigo 170º - A contabilidade das províncias ultramarinas será organizada como a da metrópole com as modificações que se tornem indispensáveis por circunstâncias especiais.

Artigo 171º - As contas anuais das províncias ultramarinas serão enviadas ao Ministério do Ultramar, para, depois de verificadas e relatadas, serem submetidas a julgamento do Tribunal de Contas, nos termos e prazos fixados na lei, e tomadas pela Assembleia Nacional, nos termos do n.º 3º do artigo 91º.

Artigo 172º - A metrópole presta assistência financeira às províncias ultramarinas, mediante as garantias necessárias.

Artigo 173º - As províncias ultramarinas não podem contrair empréstimos em países estrangeiros.

§ Únic​o - Quando seja preciso recorrer a praças externas para obter capitais destinados ao governo de qualquer província ultramarina, a operação financeira será feita exclusivamente de conta da metrópole, sem que a mesma província assuma responsabilidades para com elas, tomando-as, porém, plenamente para com a metrópole.

 

A última grande revisão Constitucional ocorreu através da Lei n.º 3/71, de 16 de Agosto, já na vigência do Professor Marcello Caetano, como Presidente do Conselho de Ministros e visava uma maior autonomia para o Ultramar. Foram as seguintes as alterações que nos interessam:

Artigo 5º - “O Estado Português é Unitário, podendo compreender regiões autónomas com organização político-administrativa adequada à sua situação geográfica e às condições do respectivo meio social…"

Artigo 6º:

1º - Promover a unidade e estabelecer a ordem jurídica da Nação, definindo, fazendo respeitar e assegurando o exercício dos direitos, liberdades e garantias impostos pela moral, pela justiça ou pela lei, em favor das pessoas, das famílias, das autarquias locais e das pessoas colectivas, públicas ou privadas.

3º - Promover o bem-estar social, procurando assegurar a todos os cidadãos um nível de vida de acordo com a dignidade humana.

Artigo 133º - Os territórios da Nação Portuguesa situados fora da Europa constituem províncias ultramarinas, as quais terão estatutos próprios como regiões autónomas, podendo ser designadas por Estados, de acordo com a tradição nacional, quando o progresso do seu meio social e a complexidade da sua administração justifiquem essa qualificação honorífica.

§​ Único - A lei que fixar o regime geral de governo das províncias ultramarinas e estabelecer, em conformidade o respectivo estatuto deverá prever a possibilidade de serem criados serviços públicos nacionais, integrados na organização de todo o território português.

Artigo 134º - Cada província constitui uma pessoa colectiva de direito público, com a capacidade para adquirir, contratar e estar em juízo e cujo estatuto estabelecerá a organização político-administrativa adequada à sua situação geográfica e às condições do seu desenvolvimento.

Artigo 135º - A autonomia das províncias ultramarinas compreende:

a) O direito de possuir órgãos electivos de governo próprio;

b) O direito de legislar, através de órgãos próprios, com respeito das normas constitucionais e das emanadas dos órgãos de soberania, sobre todas as matérias que interessem exclusivamente à respectiva província e não estejam reservadas pela Constituição ou pela lei a que se refere a alínea m) do artigo 93º à competência daqueles últimos órgãos;

c) O direito de assegurar, através dos órgãos de governo próprio, e execução das leis e a administração interna;

d) O direito de dispor das suas receitas e de as afectar às despesas públicas, de acordo com a autorização votada pelos órgãos próprios de representação e os princípios consignados nos artigos 63º e 66º;

e) O direito de possuir e dispor do seu património e de celebrar os actos e contrato sem que tenham interesse;

f) O direito de possuir regime económico e do bem-estar da sua população;

g) O direito de recusar a entrada no seu território a nacionais ou estrangeiros por motivos de interesse público e de ordenar a respectiva expulsão, de acordo com as leis, quando da sua presença resultarem graves inconvenientes de ordem interna ou internacional, salvo o recurso para o Governo.

Artigo 136º - O exercício da autonomia das províncias ultramarinas não afectará a unidade da Nação, a solidariedade entre todas as parcelas do território português, nem a integridade da soberania do Estado.

Para esse efeito, compete aos órgãos da soberania da República:

a) Representar, interna e internacionalmente, toda a Nação, não podendo as províncias manter relações diplomáticas ou consulares com países estrangeiros, nem celebrar, separadamente, acordos ou convenções com esses países ou neles contrair empréstimos;

b) Estabelecer estatutos das províncias ultramarinas, legislar sobre as matérias de interesse comum ou de interesse superior do Estado, conforme for especificado na lei a que se refere a alínea m) do artigo 93º, revogar ou anular os diplomas locais que contrariem tais interesses ou ofendam as normas constitucionais e as provenientes dos órgãos de soberania;

c) Designar o governador de cada província, como representante do Governo e chefe dos órgãos executivos locais;

d) Assegurar a defesa nacional;

e) Superintender na administração das províncias, de harmonia com interesses superiores do Estado;

f) Fiscalizar a sua gestão financeira prestando-lhes a assistência indispensável, mediante as garantias adequadas, e proporcionando-lhes operações de crédito que forem convenientes;

g) Assegurar a integração da economia de cada província na economia geral da Nação;

h) Proteger, quando necessário, as populações contra as ameaças à sua segurança e bem-estar que não possam ser remediadas pelos meios locais;

i) Zelar pelo respeito dos direitos individuais, nos termos da Constituição, dos valores culturais das populações e dos usos e costumes não incompatíveis com a moral e o direito público português.

§ 1º - Os órgãos de soberania com atribuições legislativas relativamente às províncias ultramarinas são a Assembleia Nacional, nas matérias da sua exclusiva competência ou quando haja de legislar para todo o território nacional ou parte dele que abranja a metrópole e uma ou mais províncias, e o Governo, por meio de decreto-lei, ou, nos casos em que os diplomas se destinem apenas às províncias, por meio de acto do Ministro a quem a lei confira competência especial para o efeito.

§ 2º - Os actos legislativos do Ministro com competência especial para o ultramar revestirão a forma de decreto, promulgado e referenciado nos termos constitucionais, podendo adoptar-se a de diploma legislativo ministerial quando o Ministro estiver a exercer as suas funções em qualquer das províncias ultramarinas e a portaria nos outros casos previstos na lei.

§ 3º - A competência legislativa ministerial para o ultramar será exercida precedendo parecer de um órgão consultivo adequado, salvo nos casos de urgência, naqueles em que o Ministro esteja a exercer as suas funções em qualquer das províncias ultramarinas e nos demais indicados na lei.

§ 4º - A vigência nas províncias ultramarinas de qualquer diploma publicado pelo Governo depende da menção de que deve ser publicado no Boletim Oficial da província ou províncias onde haja de executar-se.

§ 5º - É indeclinável dever do governador, em cada uma das províncias ultramarinas, sustentar os direitos de soberania da Nação e promover o bem da província, em harmonia com os princípios consignados na Constituição e nas leis.

 

Podemos também, para finalizar, referir que a análise das diferentes constituições nos permite concluir que os habitantes do ultramar sempre tiveram representantes seus no Parlamento, eleitos segundo a lei vigente. Antes de 1822, tal representação não existia aquando da realização de Cortes. Sem embargo, cedo se verificou e necessidade de haver informação e análise sobre os territórios de além-mar, preocupação que veio a institucionalizar a existência do Conselho Ultramarino[28], por D. João IV, em 1643, e que perdurou com diversas designações apenas com uma interrupção entre 1833 e 1851, até ao fim do Estado Novo.[29]

Finalmente, um último aspecto interessa ao nosso estudo, a designação que os diferentes territórios foram tendo ao longo do tempo e seu significado. Durante a Reconquista efectuada durante a I Dinastia, os diferentes territórios foram incorporados na Coroa, sem qualquer designação especial. Passaram a constituir Municípios a que se dava foral e, ou, eram doados às ordens monástico-militares. Foi excepção a isto, o Algarve que manteve até ao fim da Monarquia, o título de Reino. Tal facto, deveu-se a que o Algarve (em árabe, AL GHARB – Terra do Ocidente) constituía um reino individualizado pertencente a uma Taifa, mais tarde Califado, durante a ocupação muçulmana, e foi incorporado como tal, na Coroa Portuguesa, após acordo com Castela que, depois da conquista da Andaluzia, reivindicava para si, este território que lhe era contíguo.

Já com a conquista de Ceuta e de outras cidades do Norte de África, aquelas passaram a ser denominadas por “praças", sem nunca terem constituído um conjunto político-administrativo mais amplo, na medida em que sempre estiveram isoladas no meio de território maioritariamente controlado pelos povos árabes e berberes de Marrocos.

Inicialmente também, os “estabelecimentos" portugueses ao longo da Costa Africana, do Industão e do Extremo Oriente, designavam-se por praças, fortalezas ou feitorias. Por outro lado, e percorrendo os documentos anteriores ao século XIX, os territórios conquistados, colonizados ou ocupados pelos portugueses, eram genericamente chamados “Domínios Ultramarinos" e, por vezes, “Conquistas".

A Índia e, mais tarde, o Brasil e Maranhão, constituíram Estados. O Brasil, em 1815, foi elevado à categoria de Reino.

As grandes circunscrições administrativas chamavam-se “capitanias gerais" e dava-se às feitorias e bases navais o nome de “estabelecimentos".[30]

A designação de “colónias" encontra-se já nos séculos XVII e XVIII. O termo “províncias ultramarinas" entrou na linguagem do século XIX por via legislativa, sob a influência das ideias de assimilação política e administrativa, que negavam aos territórios ultramarinos a necessidade de regimes jurídicos diferenciados da Metrópole. Deste modo, a Constituição de 1822, já fala em Ultramar, atribuindo-se às Cortes de 1821, a adopção da designação de “Províncias Ultramarinas".[31]

A Constituição de 1838 inclui o “X Título – Das Províncias Ultramarinas"; a revisão da Constituição, que resulta na Lei 1005 de 7 de Agosto de 1920, mudou o anterior título V para “Das Colónias Portuguesas"; a Constituição de 1933 substitui este V Título pelo “Acto Colonial", já publicado em 1930; porém, na revisão efectuada em 1950, deixou de existir o “Acto Colonial" e as parcelas ultramarinas passaram a designar-se “Províncias Ultramarinas" (Lei 2048 de 11 de Junho de 1951).

Em síntese, e em termos constitucionais, a designação de “províncias" perdurou de 1838 a 1911, durante a Monarquia e de 1911 a 1920, na I República, e de 1951 a 1974, na II República, num total de 105 anos; enquanto o termo “colónia" foi empregue durante 6 anos, na I República, de 1920 a 1926 e 21 anos, na II República, de 1930 a 1951. Donde se pode concluir sem abuso, que a designação não tinha a ver com regimes ou formas de governo, mas sim e apenas, com o interesse nacional. O termo “províncias" foi também usado naturalmente por vários autores desde o século XVI.[32]Durante todo este tempo, aqueles autores, políticos e governadores usaram estes ou outros termos conforme as suas convicções, tradições ou modismos, mas pensamos, sem quaisquer conotações pejorativas, antes tendo em mente o que seria melhor para o desenvolvimento harmonioso das diferentes parcelas de Portugal. De facto, as palavras têm a sua época. Província tem a ver com a tradicional tendência da diáspora portuguesa em se manter ligada à mãe-pátria e em considerar sempre a nação portuguesa como um todo; Colónia foi a expressão da política autonomista que o regime republicano trouxe no seu programa. Com o golpe de estado de 28 de Maio de 1926 deu-se início a um movimento de cariz nacionalista e o termo “colónia" é ultrapassado ou englobado no termo “império". Após a Segunda Guerra Mundial dá-se início a uma fortíssima campanha anti-colonialista, onde os termos “colónia" e “colonização" foram diabolizados, tornando-se conveniente abandonar uma terminologia que se prestasse a equívocos. E foi essa a razão fundamental pela qual se abandonou, o termo “colónia", a partir de 1950 e se retomou a tradicional designação de “ultramar" e “província ultramarina". Deste modo, é já tempo de se olhar para estes aspectos, através de uma correcta apreciação histórica, desapaixonada e sem intenções malévolas de oportunismo partidário, de ataque à memória de antagonismos políticos e de personalidades que lhe foram suporte ou da denegrição abusiva da memória colectiva, antipatrióticas e lesivas do interesse nacional.

 

NOTAS

[1] Cognome “o Conquistador". Em dois documentos (de 1155 e 1164) intitulou-se Ego Alfonsus, Pius, Felix, Triumphador, ac semper Invictus Portugalensium Rex.

[2] Cognome “o Povoador".

[3] Cognome “o Gordo".

[4] Cognome “o Capelo".

[5] Cognome “o Bolonhês".

[6] Cognome “o Lavrador". É curioso registar que o Algarve foi doado ao infante D. Dinis, quando este, ainda criança, visitou seu avô, Afonso X, “o Sábio", rei de Castela.

[7] Cognome “o Bravo".

[8] Cognome “o Justiceiro"

[9] Cognome “o Formoso"

[10] Cognome “o de Boa Memória"

[11] Cognome “o Eloquente"

[12] Cognome “o Africano"

[13] Cognome “o Príncipe Perfeito"

[14] Cognome “o Venturoso"

[15] Cognome “o Piedoso"

[16] Cognome “o Desejado"

[17] Cognome “o Casto"

[18] Prior do Crato – Não chegou a ser cognominado.

[19] D. João IV – Cognome “o Restaurador"; D. Afonso VI – Cognome “o Vitorioso"; D. Pedro II – Cognome “o Pacífico"; D. João V – Cognome “o Magnânimo"; D. José I – Cognome “o Reformador"; D. Maria I – Cognome “a Piedosa"; D. João VI – Cognome “o Clemente"; D. Pedro IV – Cognome “o Libertador"; D. Miguel – Não foi cognominado; D. Maria II – Cognome “a Boa Mãe"; D. Pedro V – Cognome “o Muito Amado"; D. Luís I – Cognome “o Popular"; D. Carlos I – Não foi cognominado; D. Manuel II – Não foi cognominado.

[20] Para além daqueles que passou a ter por inerência: Comandante-chefe das Forças Armadas e Chanceler Mor das Ordens Honoríficas Portuguesas (Cristo, Santiago e Avis)

[21] A Constituição é de inspiração maçónica (derivada das ideias liberais da Revolução Francesa de 1789), mas não deixou de, no seu preâmbulo, invocar o Nome da Santíssima e Indivisível Trindade.

[22] O capítulo I do Título III, da Constituição tratava da eleição dos deputados às Cortes. Os artigos 37 e 38, consignavam que as eleições se fariam por divisões eleitorais e no último artigo citado, estabelecia-se o número de eleitores a eleger por cada território ultramarino.

[23] A que se seguiram os Actos adicionais de: 5 de Julho de 1852; 24 de Julho de 1885; Decreto de 25 de Setembro de 1895; Carta de lei de 3 de Abril de 1896; 23 de Dezembro de 1907 (que em nada alterou o artigo em apreço).

[24] O acto adicional, de 5 de Junho de 1852, não altera esta postura

[25] O seu artigo 57, prescrevia ainda um subsídio para os deputados das províncias da Ásia e da África que não tivessem domicílio no continente do reino e ilhas adjacentes.

[26] Esta Constituição foi revista pelas: Lei n.º 635, de 28 de Setembro de 1916; Lei n.º 854, de 20 de Agosto de 1919; Lei n.º 891, de 22 de Setembro de 1919; Lei n.º 1005, de 7 de Agosto de 1920; Lei n.º 1154, de 27 de Abril de 1921; Decreto n.º 3997, de 30 de Março de 1918; Lei n.º 833, de 16 de Dezembro de 1918

[27] A Constituição de 1933 foi revista 10 vezes durante o tempo em que vigorou: Lei n.º 1885, de 23 de Março de 1935; Lei n.º 1900, de 21 de Maio de 1935; Lei n.º 1910, de 23 de Maio de 1935; Lei n.º 1945, de 21 de Dezembro de 1936; Lei n.º 1963, de 18 de Dezembro de 1937; Lei n.º 1966, de 23 de Abril de 1938; Lei n.º 2009, de 17 de Setembro de 1945; Lei n.º 2048, de 11 de Junho de 1951; Lei n.º 2100, de 29 de Agosto de 1959; Lei n.º 3/71, de 16 de Agosto de 1971

[28] Cujos antecedentes se podem reportar à Casa da Guiné e da Índia.

[29] Chamou-se Conselho Ultramarino, de 1643 a 1833 e de 1851 a 1868; Junta Consultiva do Ultramar, de 1868 a 1911; Conselho Colonial, de 1911 a 1926; Conselho Superior das Colónias, de 1926 a 1935; Conselho do Império Colonial, de 1935 a 1953 e de novo Conselho Ultramarino, de 1953 a 1974.

[30] Marcello Caetano, in “Conselho Ultramarino", pág. 47.

[31] Ver artigo, “províncias e colónias" da autoria do General Silvino Silvério Marques, Revista Militar, n.º ½ Jan./Fev. de 1998, pág. 33.

[32] Segundo José Gonçalo de Santa Rita, desde João de Barros, em 1552. (Gen. Silvino Marques, artigo citado, pág. 34).​



João José Brandão Ferreira

Tenente-coronel Piloto-aviador, na situação de reforma, comandante de Linha Aérea e mestre em Estratégia pelo Instituto Superior de Ciências Sociais e Políticas. Membro do Conselho Científico da Comissão Portuguesa de História Militar, académico da Academia de Marinha, sócio efectivo da Revista Militar e sócio fundador da Associação Cristóvão Colon. Autor de vários livros e artigos sobre Estratégia e História Militar.​



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Como citar este texto:

FERREIRA, João José Brandão, – Caracterização da Evolução do Território Pátrio durante a Expansão Ultramarina. Revista Portuguesa de História Militar - Dossier: Génese do​ Império Português do Oriente. [Em linha] Ano III, nº 5 (2023); https://doi.org/10.56092/XLBH9110 [Consultado em ...].

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