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PERSONAGENS DE UMA HISTÓRIA MILITAR EM COMUM: ESTRANGEIROS QUE TOMARAM PARTE PELO IMPÉRIO DO BRASIL À ÉPOCA DE SUA INDEPENDÊNCIA

 


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FÁBIO NEVES LUIZ LAURENTINO

 

 

R​esumo

A Independência política do Brasil, proclamada em 1822 e reconhecida pelo Reino de Portugal em 1825, terá sido conquistada pacificamente, como comumente é referida? É sabido mas pouco esmiuçado pelos estudos históricos que embates navais na costa brasileira entre a recém criada Marinha Imperial brasileira e a Marinha Real portuguesa, e combates terrestres entre patriotas brasileiros e as forças portuguesas da Legião Constitucional Lusitana nas regiões da Bahia, Piauí, Santa Catarina, São Paulo e Rio Grande do Sul ocorreram nos anos iniciais da década de 1820. O objetivo deste artigo, que se encontra sob a orientação metodológica da História Militar, busca dar luz a este tema; aos personagens estrangeiros que optaram abraçar a causa brasileira.

Palavras-chave: Independência; Brasil; Mercenários; Marinha Imperial Brasileira.​

Abstract

Was the political independence of Brazil, proclaimed in 1822 and recognized by the Kingdom of Portugal in 1825, peacefully conquered, as it is commonly referred to? It is known but little explored by historical studies that naval clashes on the brazilian coast between the newly created Imperial Brazilian Navy and the Portuguese Royal Navy, and land combats between brazilian patriots and the portuguese forces of the Lusitanian Constitutional Legion in the regions of Bahia, Piauí, Santa Catarina , São Paulo and Rio Grande do Sul took place in the early years of the 1820s. The objective of this article, which is under the methodological guidance of Military History, seeks to shed light on this theme; to foreign characters who chose to embrace the brazilian cause.

Keywords: Independence; Brazil; Mercenaries; Imperial Brazilian Navy.

 


Intro​dução

A Independência política do Brasil, proclamada em 1822 e reconhecida pelo Reino de Portugal em 1825, terá sido conquistada pacificamente, como comumente é referida? É sabido mas pouco esmiuçado pelos estudos históricos que embates navais na costa brasileira entre a recém criada Marinha Imperial brasileira e a Marinha Real portuguesa, e combates terrestres entre patriotas brasileiros e as forças portuguesas da Legião Constitucional Lusitana nas regiões da Bahia, Piauí, Santa Catarina, São Paulo e Rio Grande do Sul ocorreram nos anos iniciais da década de 1820.

O objetivo deste artigo, que se encontra sob a orientação metodológica da História Militar, busca dar luz a este tema; aos personagens estrangeiros que optaram abraçar a causa brasileira e a bibliografia que compõe este período singular da nossa História e que, até então, foram pouco palmilhados entre a Historiografia Militar, seja no Brasil ou em Portugal.

Ademais, vale ressaltar que, por ocasião das comemorações dos 200 anos da Independência do Brasil, um significativo número de trabalhos acadêmicos – também no campo da História Militar – foram publicados, trazendo novas investigações e novas leituras de trabalhos já conhecidos de autores brasileiros do século XX. Ao que interessa o campo metodológico priorizado por esta Revista, destaco a publicação do Dicionário de História Militar do Brasil, 1822-2022, em dois volumes, sob organização de Francisco Carlos Teixeira, Francisco Alves de Almeida, Fernando Velôzo Gomes Pedrosa, Ricardo Pereira Cabral e Sandro Teixeira Moita, que será lançado neste final de 2022, no Brasil.

Assim, completa-se estes primeiros parágrafos introdutórios dizendo que o texto aqui elaborado, escrito sob a perspectiva brasileira dos acontecimentos, conta como base a publicação Dicionário da Independência do Brasil, de autoria de Guilherme de Andrea Frota e notas deste autor, também com lançamento previsto para o final de 2022, em Portugal. Este livro releva alguns verbetes sobre personagens e acontecimentos da História Militar portuguesa e, sobretudo, brasileira, buscando compreender também através dos acontecimentos militares a construção da “brasilidade" no início do século XIX.

Disto isto, a título de contextualização, é necessário olharmos para os acontecimentos desde a Revolução Constitucionalista de 1820.

Enquanto portugueses e ingleses lutavam para expulsar as tropas de Napoleão Bonaparte de solo português, ficou o país sob a Regência do Marechal Beresford, Marquês de Campo Maior, conservando-se a sede do Reino no Brasil. Essa situação foi suportada pelos portugueses até 1814 quando terminou a guerra. A partir de então começaram as queixas e intrigas para que o Rei voltasse a Lisboa. Entretanto, D. João VI, encontrava-se bem na sua Quinta de São Cristóvão, no Rio de Janeiro. A primeira tentativa foi feita pela Maçonaria em 1817; denunciada pelo Marechal Beresford foram os conspiradores levados ao patíbulo, antes que o Rei dela tomasse conhecimento. A marcha da ideia revolucionária não parava. Tinha o apoio e simpatia da Inglaterra, o discurso dos intelectuais, o descontentamento do povo e a indignação dos militares. Estes foram ligados pela Maçonaria. A situação agravou-se pela desinteligência entre D. Miguel Pereira Forjaz e o Marechal Beresford que veio ao Rio de Janeiro. Pensou o Governo uma série de medidas de aplicação urgente, entendendo, sobretudo, que as causas estavam na miséria e na fome. Mas antes que fossem aplicadas explodia a revolução a 24 de agosto na cidade do Porto, em parte aproveitando a ausência do Marechal Beresford.

Com a capitulação da Junta  de Governo, convocou-se as Cortes sem autorização. A 17 de outubro o brigue Providência chegava ao Rio de Janeiro trazendo as primeiras notícias. Convocou o Rei Conselho e todos opinaram que era agora mister dirigir as Cortes ilegalmente convocadas. Por proposta de Tomás Antônio se fez, então, um ofício às Cortes em que não se prometia claramente o regresso do Rei e acrescentava “… mas sempre estará também uma pessoal real do Brasil, pois bem veem que o Brasil não há de já agora ser colônia…".

Já a esse tempo Lisboa havia aderido e uma nova Junta se organizara num Governo quase soberano. Beresford, que embarcara de volta pelo Providência, não pode descer e as ordens trazidas não foram executadas. A 11 de novembro essas milícias chegavam ao Rio de Janeiro. Foi essa revolução que marcou os novos destinos do Brasil. Em seguida, a primeira Província a se manifestar favorável a esta Revolução foi o Pará. A 1º de janeiro de 1821, Belém se pronunciava apoiando-a.

As Cortes Portuguesas decretaram a 10 de março de 1821 as Bases para a elaboração da Constituição. Elas organizavam o Estado pelo modelo liberal: a lei era igual para todos (art. 11), havia a divisão de poderes (art. 18), o Rei sem direito a veto (art. 23). A Junta Baiana jurou as bases a 25 de maio. Chegaram ao Rio de Janeiro, por navio português, a 2 de junho. O Conde dos Arcos era de parecer que não se deveria colocá-las em execução de imediato, baseado no seu artigo 21, que elas só se tornariam comuns aos súditos da América, África e Ásia “logo que, pelos seus legítimos representantes, declarassem ser essa a sua vontade". Mas o Marechal Carlos Frederico de Caula, Secretário da Guerra, insuflou secretamente a oposição. Surgiram reclamações e pasquins.

Esboçou o levante o 3º Regimento de Caçadores, comandado por Antão Garcez Pinto de Madureira, sendo o principal agitador o Capitão Joaquim Francisco de Sá e Vasconcelos que, no dia 5, conduziu a tropa que se reuniu no Rossio (hoje Praça Tiradentes), logo comandada por Jorge de Avilez, exigindo o juramento das Bases Constitucionais.

No Paço de São Cristóvão o Príncipe tomou conhecimento, pelo Marechal Caula, o que prova estar ele conivente com os acontecimentos, do que queria a tropa. Dirigiu-se, então, imediatamente, a cavalo, ao Rossio, passando, em seguida, ao teatro São João. Falou padre Narciso pela tropa, escutando o Príncipe, depois de adverti-lo: “ouvi-lo-ei da parte dos oficiais e da tropa. Mas devo-lhes advertir que a tropa não é Nação: pertence à Nação".

Foi pedida a demissão do Conde dos Arcos. Em seguida, D. Pedro jurou as Bases, demitiu o Conde dos Arcos, refez o Ministério, estabeleceu que o Governo das Armas fosse exercido por uma junta formada por Jorge Avilez, o Brigadeiro Veríssimo Antônio Cardoso, que era Quartel-Mestre General, e o Brigadeiro Francisco Saraiva da Costa Refoios.

A criação de uma junta ofereceu grandes dificuldades pela oposição movida por José Clemente Pereira. Foram eleitos 9 membros: Mariano José Pereira da Fonseca, D. José Caetano da Silva Coutinho, o Tenente-General José de Oliveira Barbosa, José Caetano Ferreira de Aguiar, o Tenente-General Joaquim de Oliveira Alvares, Joaquim José Pereira de Faro, Desembargador Sebastião Luís Tinoco, Francisco José Fernandes Barbosa e Manoel Pedro Gomes. O Príncipe em parte neutralizou essa Junta, que apenas verificaria a responsabilidade dos Ministros, de acordo com o artigo 31 das Bases. A Junta só se instalou na manhã de 14 e se reunia no consistório da igreja de São Francisco de Paula.

Somente às 5:30 da tarde terminou a jornada. O Príncipe, aborrecido, exclamou: “arranjem-se desta vez como bem lhes parecer porque eu terceira vez não venho cá, e Deus sabe para onde irei". Durante o dia foram distribuídas duas proclamas: uma “Ao Povo", como foi intitulada, e outra, aos soldados.

A Gazeta do Rio de Janeiro publicou, no dia 9, extenso artigo sobre o fato. Igualmente saiu, dias depois, o Diálogo político e instrutivo entre dois homens da  roça André Raposo e seu compadre Bolonio Simplicio acerca da bernarda do Rio de Janeiro e novidades da mesma (teve o número 6677 do Catálogo da Exposição de História do Brasil, realizada pela Biblioteca Nacional do Brasil em 1881).

Em dezembro de 1821 chegava ao Rio de Janeiro a correspondência de Lisboa pelo brigue D. Miguel. Eram os decretos de 29 de setembro e de 1º de outubro que determinavam, o primeiro a retirada do Príncipe Regente, para uma viagem de estudos pela Europa, e o segundo instituía as ligações diretas entre as Juntas Governativas provinciais com a metrópole. Irritou-se D. Pedro pela humilhação, mas submeteu-se em carta escrita ao Rei no dia seguinte.

Entretanto, os patriotas que se reuniam na rua da Ajuda, no chamado “Clube da Resistência", logo puseram-se de acordo. Entre eles, o mais notável foi o Frei Francisco de Santa Teresa de Jesus Sampaio, por causa de seus sermões patrióticos, destacando-se na defesa da monarquia constitucional contrária à tese do Grande Oriente que era republicana. Assim sendo, a saída do Príncipe poderia permitir o triunfo dos mações. A sua permanência defenderia a causa monárquica. José Joaquim da Rocha, que dirigia o "Clube", expediu Pedro Dias Paes Leme e João Evangelista de Faria Lobato para São Paulo e Paulo Barbosa da Silva para Minas a fim de conseguirem nessas duas Províncias requerimentos que exigiam que ficasse o Príncipe no Brasil. Ao mesmo tempo, surgiam no Rio de Janeiro publicações e manifestos.

À disposição de D. Pedro era, porém, a de partir. Em carta do dia 15 de dezembro, escrevia ao pai: “Torno a protestar às Cortes e a V. M. que só a força será capaz de me fazer faltar ao meu dever, o que será o mais sensível neste mundo. Concluo dizendo: sou fiel e honrado". Foi em meio a essa agitação que parte dos liberais e da sua hesitação que lhe foi mostrada uma carta do antigo Ministro Tomás Antônio de Vilanova Portugal a seu amigo Antônio Soares de Paiva, na qual dizia que se o Príncipe quisesse salvar seu pai e aos reinos de Portugal e do Brasil não deveria partir. Tal escrito muito influenciou o ânimo de D. Pedro.

A 1º de janeiro, retornou o emissário de São Paulo com o requerimento da Junta. No Clube da rua da Ajuda se promoveu um abaixo-assinado com oito mil adesões. A 5 de janeiro, chegou à representação de Minas Gerais, trazida pelo Desembargador Fonseca Vasconcelos, Presidente da Junto. Entre os dias 7 e 8, na casa de Joaquim da Rocha, preparou-se a cena final. Tudo leva a crer hoje que o “Clube" já estava em última ligação com o Príncipe.

Ao meio-dia de 9 de janeiro, domingo, José Clemente Pereira, Presidente do Senado da Câmara do Rio de Janeiro, saiu do consistório da igreja de Nossa Senhora do Rosário e, à frente dos Vereadores, dirigiu-se ao Paço, já àquela hora cheio de gente. Deitou fala em longo arrazoado para que o Príncipe ficasse. Este o escutou pacientemente na sala do trono e respondeu: “Convencido de que a presença de minha pessoa no Brasil interessa ao bem de toda a nação portuguesa, e conhecendo que a vontade de algumas Províncias o requer, demorarei a minha saída, até que as Cortes e meu Augusto Pai e Senhor deliberem a este respeito com perfeito conhecimento das circunstâncias que têm ocorrido".

Mas tal resposta era paliativa, sendo corrigida na tarde do mesmo dia para: “Como é para o bem de todos e felicidade geral da Nação, estou pronto: diga ao povo que fico". E assomando à janela, disse ao povo: “Agora só tenho a recomendar-vos união e tranquilidade". A sua permanência contribuiu para a nossa unidade.

A compreensão da missão histórica de Portugal por parte de D. Pedro e a consciência do povo, foram os fatores que permitiram que o Brasil não se fragmentasse, o que teria acontecido se partes do território se subordinassem diretamente às Cortes de Lisboa. Acrescente-se que o Fico foi aplaudido por todos, especialmente pelos comerciantes, em geral portugueses, que temiam que a partida do Príncipe gerasse atos de anarquia, da qual seriam os primeiros a serem vítimas. Comprometia-se, assim, D. Pedro definitivamente com a causa brasileira.

Atenuando o procedimento escrevia no dia seguinte uma carta ao Rei, seu pai. A reação das tropas portuguesas aquarteladas no Rio de Janeiro não se fez esperar. Comandadas pelo Brigadeiro Jorge de Avilez exigiram no dia 11 de janeiro que o Príncipe embarcasse. Com o apoio popular e algumas tropas brasileiras, D. Pedro cercou-os no morro do Castelo e exigiu a rendição. Passaram-se para a Praia Grande (Niterói). Reagiram também as Cortes o privando dos seus rendimentos de Príncipe Real, o que mais o irritou. A 16 de janeiro, constituiu outro Ministério, com partidários da causa nacional, e no qual figurava José Bonifácio, seu verdadeiro mentor político.

Com energia impediu que se aproximassem os navios do Chefe de Esquadra Francisco Maximiliano de Souza, que a 9 de março, aportou na barra do Rio de Janeiro. Conseguiu que 249 homens e a fragata Real Carolina ficassem a serviço do Brasil. Diante das notícias alarmantes que vinham de Minas Gerais resolveu fazer viagem até a sua capital no dia 23, levando pequena comitiva. Sua jornada foi rápida e triunfal submetendo-se o Governador militar José Maria Pinto Peixoto. No dia 25 de abril retornava à Corte. Essa viagem foi de grande efeito no ânimo do Príncipe.

A 4 de maio ordenou que os decretos das Cortes não se desse, no Brasil, cumprimento sem terem primeiro o Cumpra-se. A 13 de maio aceitava o título de Defensor Perpétuo.

E logo depois, a 5 de agosto, ingressava na Maçonaria, onde tomou o nome de Guatimozim, tornando-se seu Grão-Mestre. Foi em agosto que resolveu visitar a Província de São Paulo, onde se esboçava uma agitação. Já se encontrava de regresso ao Rio de Janeiro, parado às margens do riacho Ipiranga, para descansar, quando ali chegou o correio Paulo Bregaro com novos decretos das Cortes e mais cartas da Princesa Real D. Leopoldina e de seus Ministros. Impulsivo bradou: Laços fora, soldados! Independência ou Morte! Retornou, então, a São Paulo onde foi ovacionado pelo povo e nesta cidade compôs o Hino da Independência.

Na noite de 14, chegava ao Palácio de São Cristóvão. Na noite de 7 de outubro, foi ao Grande Oriente e assumiu o cargo de Grão-Mestre. A 12 de outubro, já no Rio de Janeiro, foi aclamado Imperador e Defensor Perpétuo do Brasil e a 1º de dezembro coroado na Capela Imperial em cerimônia pomposa, em grande parte copiada da de Napoleão I.

Os primeiros momentos de seu reinado foram dedicados à completa união do Brasil. Em várias províncias, como a Bahia, Cisplatina, Maranhão e Pará, os núcleos portugueses eram muito expressivos, acarretando uma guerra para a sua expulsão. D. Pedro compreendeu a necessidade de contratar estrangeiros e de formar com rapidez uma marinha nacional.

A exemplo disto, em janeiro de 1823, criou Pedro I o Corpo de Estrangeiros. Compunha-se de um Estado Maior e três batalhões, com 834 homens cada um, e organizados em 1º de granadeiros e 1º e 2º de caçadores. Esses soldados foram, em sua maior parte, recrutados por Schufer, na Alemanha, entre nobres decaídos, criminosos, refugo de tropas e aldeões enganados. Na verdade, não foram muito simpáticos à população, apesar de darem guarda no Paço Imperial.​

Os combates e os personagens estrangeiros a serviço do Império do Brasil

  Os Combates

     

Guerra de Independência na Bahia

A luta entre os patriotas baianos e a Legião Constitucional Lusitana, dirigida pelo Brigadeiro Madeira de Melo, começou a 25 de junho de 1822 com a insurreição da Vila de Cachoeira. Em pouco tempo, toda a Província aderiu à causa, menos a capital, porque estava tomada pelas tropas portuguesas. A 28 de junho, tiveram início às hostilidades, com o apresamento de uma canhoneira portuguesa. Em Cachoeira, o Governo interino organizou corpos de voluntários com os reforços que chegavam de Pernambuco, Paraíba, Alagoas e Rio de Janeiro. A Câmara de Cachoeira, reunida no dia 5 de julho, dirigiu uma carta ao Príncipe Regente, terminando: “Ajude-nos Senhor, que somos súditos devotos de Vossa Alteza Real". Quando chegou esse pedido já havia partido a esquadra, sob o comando do Chefe de Divisão Rodrigo Antônio De Lamare, que conduzia tropas de terra chefiadas por Pierre Labatut. Evitando uma batalha frontal, o Chefe De Lamare desembarcou às tropas em Alagoas.

Foi, assim, formado o “Exército Libertador". Seu efetivo total era de 9.515 homens, sendo 7.973 de infantaria, 1.289 de artilharia e 253 de cavalaria. A maior percentagem era mesmo de baianos, que concorriam com 7.072 homens, secundados pelo Rio de Janeiro, com 1.344 homens.

Na ilha de Itaparica existiam, ainda, 2.547 homens, entre infantes e artilheiros, sob o comando do Tenente Coronel Antônio de Souza Lima. 710 marinheiros formavam a guarnição da flotilha de Itaparica, sob as ordens de João Francisco de Oliveira Botas. As forças do Brigadeiro Madeira de Melo subiam a 10.500 homens, obtidas graças à convocação de todas as milícias e de todos os portugueses com a promessa de baixa em três meses.

Uma pequena esquadra lhe deixava aberto o porto de Salvador; era composta pelas corvetas Dez de Fevereiro, Regeneração, Restauração e Constituição, os brigues Audaz e Prontidão, e a sumaca Conceição. Todos sob o comando do Capitão de Fragata Bruno de Moraes.

Logo Madeira de Melo recebeu reforços da Divisão que saiu do Rio de Janeiro: 381 homens desembarcaram a 27 de março. De Lisboa chegaram tropas a 30 de outubro de 1822 na nau D. João VI, trazendo o Chefe de Divisão João Félix Pereira de Campos, que assumiu o comando das forças navais, agora aumentadas.

Foi em julho que os baianos começaram o cerco de Salvador, comandados pelo Tenente Coronel de milícias Rodrigo Antônio Falcão Brandão, que por sua vez, sete dias depois, transmitia esse comando ao General Pierre Labatut, que do Rio de Janeiro, havia chegado com reforços a 29 de outubro, estabelecendo o seu QG em Feira de Capuame. Diversos pequenos combates foram travados, especialmente no Engenho de Conceição e em Itaporã (21 de outubro e 29 de dezembro de 1822). Esses combates resultaram infrutíferos. Por isso, resolveu o Brigadeiro Madeira de Melo atacar a ilha de Itaparica a 7 de janeiro, com o objetivo de tomá-la, o que também não conseguiu. Ao desprestígio de Madeira acrescentou-se a falta de soldo às suas tropas e a elevação dos preços dos gêneros alimentícios.

A 22 de fevereiro, chegaram reforços brasileiros. O Batalhão do Imperador, comandado pelo Coronel José Joaquim de Lima e Silva, ao mesmo tempo que chegavam reforços (2.500 praças) de Lisboa em auxílio de Madeira de Melo (abril de 1823).

A esquadra portuguesa sofreu um revés no combate de 4 de maio, frente a Lorde Cochrane, que bloqueou o porto de Salvador, tomando como base de operações o Morro de São Paulo. A 14 de junho, Cochrane investiu pelo porto de Salvador numa demonstração de audácia e força que só não foi completa por causa da falta de vento. Tal fato levou ao desalento o Brigadeiro Madeira.

Labatut foi substituído, a 21 de maio de 1823, por causa da prisão do Coronel Felisberto Gomes Caldeira. Entretanto, foi durante o seu comando que os patriotas tiveram as duas principais vitórias em Pirajá e Itaparica. Foi o Coronel José Joaquim de Lima e Silva que ficou no comando, por indicação do Governo de Cachoeira. Nessa ocasião a posição do Brigadeiro Madeira era insustentável. Resolveu, por isso, regressar ao Reino. Durante alguns dias, mas especialmente a 1º de julho, embarcaram os portugueses que não quiseram ficar no Brasil. E às 4 horas da madrugada do dia 2 embarcou a tropa na maior ordem.

Os milicianos foram licenciados. Às onze da manhã fez-se vela a esquadra, composta de 71 navios. À uma da tarde entrava na cidade o Exército Imperial brasileiro, ao mesmo tempo que o Primeiro Almirante Lorde Cochrane cruzava a barra a bordo na nau Pedro I.​

     Guerra de independência​ na Cisplatina

Com a Independência proclamada pelo Príncipe D. Pedro, separam-se, na Banda Oriental, as forças que garantiam a anexação portuguesa na região: as tropas portuguesas, sob o comando do Brigadeiro D. Álvaro da Costa de Souza Macedo, e as brasileiras, chefiadas por Carlos Frederico Lecor (depois Barão de Laguna). Ficaram as primeiras com Montevidéu e as de Lecor, baseadas em Canelones, sitiando a capital da Província.

Os diversos navios portugueses (fragata Thetis, escunas Maria Teresa, Oriental, Luís de Camões, D. Álvaro de Castro, Maria Isabel, Isabel Maria e a barca Infante D. Sebastião) eram comandados pelo Chefe de Esquadra Rodrigo José Ferreira Lobo que, com os seus oficiais, prestaram juramento ao Império a 9 de novembro. Preferiu o Governo reforçar a posição naval, enviando uma força tarefa comandada pelo Primeiro Tenente David Jewet com as fragatas União e Carolina, a corveta Liberal e vários transportes.

Cumprida a missão regressaram ao Rio de Janeiro. Apesar de ter sido feito um bloqueio naval no porto de Montevidéu, a revolta de 4 unidades permitiu ao Brigadeiro Álvaro da Costa organizar uma pequena força naval entregue ao Primeiro Tenente José Maria de Souza Soares de Andréa. Esse fato acarretou a exoneração de Rodrigo Lobo e a nomeação do Capitão de Mar e Guerra Pedro Antônio Nunes, que chegou à Colônia de Sacramento no dia 11 de outubro, a bordo da Liberal.

Lecor apoiou-se nas tropas brasileiras e em seus chefes Manoel Marques de Souza, Sebastião Barreto e José de Abreu. Aliou-se aos orientais de Frutuoso Rivera e cercou Montevidéu.

Os portugueses, que perdiam em terra, tomaram a decisão de um encontro no mar, com a finalidade de acabar com o bloqueio. O combate de Montevidéu começou no alvorecer de 21 de outubro, travado inteligentemente pelos nossos, que se fizeram ao largo para ganhar barlavento, longe do alcance das baterias de terra. O combate durou até às 4 da tarde.

Sentindo insustentável a sua posição preferiu D. Álvaro a capitulação. A 18 de novembro (1823), os representantes dos dois exércitos assinaram uma Convenção no Pastoreio de Pereira, perto do arroio Miguelete. No dia seguinte, os dois generais ratificaram a Convenção. Por ela compromete-se D. Álvaro a embarcar com sua gente para o Reino. Lecor só entrou em Montevidéu em 2 de março do ano seguinte.​

     Guerra de Ind​​ependência no Maranhão e Piauí

Em Oeiras, Piauí, existia o mais sólido núcleo português do país. Eram mais de mil homens comandados pelo Coronel João José da Cunha Fidié, Governador de Armas do Piauí. Presidiu a Junta maranhense o Bispo D. Joaquim de Nazareth, que rejeitara a proposta do Príncipe D. Pedro para aderir a sua causa. A 19 de outubro de 1822, irrompeu a revolução em Parnaíba, organizada pelo rico negociante Simplício Dias da silva que conseguiu proclamar a Independência a 2 de novembro.

Fidié partiu de Oeiras para Parnaíba e ajudado pelo brigue Infante D. Miguel ocupou a vila. Nas suas costas os Souza Martins revoltaram Oeiras proclamando sua adesão ao Imperador a 24 de janeiro. Soldados voluntários do Ceará, sob o comando de José Pereira Filgueiras, passaram ao Piauí, para ajudá-los, mas foram vencidos no combate do rio Jenipapo por Fidié, que pouco proveito tirou da vitória. Resolveu, então, dirigir-se para Caxias, disposto a fortalecer-se e esperar reforços vindos do Reino.

Correram para cercá-lo homens do Ceará e do Piauí, junto com as milícias sertanejas do Maranhão. Todos sob o comando do Coronel José Pereira Filgueiras, impondo-lhe a capitulação do Monte da Taboca, a 30 de julho. Ao mesmo tempo, o Primeiro Almirante Lorde Cochrane, exclusivamente com a nau Pedro I, apresentava-se na barra do Maranhão a 26 de julho de 1823.

Logo aprisiona o brigue Infante D. Miguel que lhe foi ao encontro, pensando ser um navio inglês. No mesmo dia, expediu uma proclamação aos habitantes e um ofício à Junta Governativa, informando que a esquadra brasileira iria chegar com tropas de desembarque. Realiza disparos elevados.

No dia seguinte, a Junta capitula e o Primeiro Almirante desembarca 200 homens para manter a ordem. No dia 28, tem lugar a proclamação da Independência e do Império. Como se pode notar os acontecimentos em São Luís foram concomitantes aos que se verificavam em Caxias no interior. O Almirante fez várias presas de guerra.​

     Guerra de Independência no Pará

Conspiraram os paraenses, em 1823, promovendo uma revolta a 14 de abril, comandada pelo Major Boaventura Ferreira da Silva, sufocada pela guarnição portuguesa, comandada pelo General José Maria de Moura. Presos os implicados na Fortaleza da Barra ou na Cadeia Pública, tiveram as vidas salvas por influência de Romualdo Antônio de Seixas. O jornal O Paraense, foi fechado, substituído pelo Luso-Paraense.

Depois que o Primeiro Almirante Lorde Cochrane conseguiu submeter a Província do Maranhão, determinou que John Pascoe Grenfell, no comando do brigue Maranhão, antigo Infante D. Miguel, se dirigisse para Belém. Chegando nesta cidade, Grenfell usou de estratagema igual, informando à Junta que era apenas o primeiro de uma poderosa esquadra que logo chegaria. A Junta, reunia a 11 de agosto, resolveu aderir à Independência. A Nova Junta foi eleita, presidida pelo Coronel Geraldo José de Abreu, e José Ribeiro Guimarães, Cônego João Batista Gonçalves Campos, Felix Antônio Clemente Malcher e o Capitão João Henrique de Matos.

Grenfell apreendeu a fragata Leopoldina, rebatizada com o nome de Imperatriz, e a charrua Gentil Americana.

Na noite de 15 de outubro, a tropa voltou-se contra seus oficiais e, reforçada por populares e desordeiros, depôs o Presidente da Junta de Governo, Geraldo José de Abreu, aclamando o Cônego Batista Gonçalves Campos. Em seguida, começaram a saquear e arrombar casas. Como continuasse a desordem, o Capitão Tenente Grenfell desembarca os seus marujos e ajudado pela milícia e alguns habitantes, consegue no dia seguinte (17) restabelecer a ordem. Manda fuzilar 2 sargentos, 2 soldados e um paisano; remeteu preso para o Rio de Janeiro o Cônego Gonçalves e organizou com os soldados, um regimento imperial. A 20 de outubro remeteu para bordo do navio S. José Diligente depois Palhaço, 256 presos que vieram a morrer ou envenenados ou por asfixia, a exceção de 4. Assumiu então a Presidência da Junta.​

     Guerra de Ind​ependência em Pernambuco

Foi a 25 de agosto de 1821 que se proclamou na vila de Goiana um Governo constitucional temporário. A 29 de agosto, instalou-se o Governo Constitucional temporário, presidido por Francisco de Paula Gomes dos Santos. Com forças de 3.000 homens comandadas pelo Coronel José Camelo Pessoa de Melo, investiram, a 21 de setembro, em Recife e Olinda, onde estavam entrincheiradas as tropas portuguesas, dirigidas pelo General Luis do Rego Barreto.

A Província, excetuando-se esses dois pontos, encontrava-se em mãos da Junta de Goiana. A 29 de setembro, o Coronel Pessoa de Melo investe sobre Olinda, comandada pelo Tenente Coronel português Antônio Inácio Caiola, tendo o fogo durado 4 horas.

Enquanto isso, os Majores Manoel de Azevedo do Nascimento e Manoel do Nascimento Monteiro atacaram e tomaram a povoação de Afogados, vizinha de Recife (1 de outubro de 1821) mas logo se retiraram pois marchava sobre eles o General Luis do Rêgo que conseguiu repeli-los.

Eleita uma Junta Provisória em Olinda, a 26 de outubro, esta entendeu-se com a de Cachoeira. A luta terminou pela Convenção de Beberibe, assinada a 5 de outubro, pela qual se acertou o embarque das tropas portuguesas e a eleição de um novo Governo. A 26 do mesmo mês, era eleita a Junta Provisória do Governo de Pernambuco, sendo seu Presidente Gervásio Pires Ferreira. No mesmo dia, embarcou Luís do Rêgo para o Reino. As tropas portuguesas, o batalhão do Algarve, embarcaram a 31 de janeiro de 1822.

A 1º de julho de 1822, o povo obrigou a Junta a reconhecer a autoridade de D. Pedro. Ao mesmo tempo, o Príncipe enviava um corpo de pernambucanos, que estava na Cisplatina, na fragata Carolina, acompanhados por Bernardo José da Gama. Chegados todos a 2 de julho, procuravam vencer as hesitações de Pires Ferreira.

Este, sob o pretexto de fazer um recenseamento da população ia adiando as eleições para os Deputados à Constituinte. Estes fatos provocaram a reação do povo e da tropa que, levantada pelo Capitão Pedro da Silva Pedroso, depôs a Junta a 16 de setembro de 1822, fugindo neste dia Gervásio Pires Ferreira.

A Independência foi proclamada na cidade de Recife a 8 de dezembro de 1822, o que foi seguido pelas outras Câmaras de Pernambuco, apesar de estarem bloqueando o porto de Recife as corvetas Dez de Fevereiro e Princesa Real que, comandadas pelo Capitão Tenente Isidoro Guimarães, logo se retiraram.​

  Personagens Estrange​iros

     

James Norton (1789-1835)

Nasceu em Newark-upon-Trent, na Inglaterra, entrando cedo para a Marinha Real inglesa. Prestou serviço na Companhia das Índias Orientais. Em 1823, foi contratado para o serviço da Armada Imperial Brasileira, sendo incorporado a 23 de agosto do mesmo ano. Sob o comando do Primeiro Almirante Lorde Cochrane, seguiu para a Bahia para combater o foco de reação lusitana. A 20 de dezembro, recebeu o comando da fragata Ipiranga.​

     John Pascoe Grenfell (1800 – 1869)

Nasceu no Condado de Surrey, Inglaterra. Começou cedo sua vida no mar, como aspirante e imediato nos navios da Companhia das Índias Orientais. Participou da Independência do Chile, tendo sido ferido na abordagem da fragata Esmeralda (5 de novembro de 1820). Em 1823, passava para o serviço do Brasil, acompanhando Lorde Cochrane e com este chegava ao Rio de Janeiro, a bordo do brigue Colonel Allen, a 13 de março de 1823.

Por decreto de 21 de março foi admitido na Marinha Imperial no posto de Primeiro Tenente, logo embarcando na capitânia, a nau Pedro I. Era um homem circunspecto e reservado. Unia a prudência à valentia, destacando-se em todos os seus atos por um senso ilimitado de responsabilidade. No combate de 4 de maio conjura o perigo de ser a capitania tomada pelos inimigos.

No momento da batalha, em que a Pedro I intimava aos navios portugueses Princesa e Príncipe que se rendessem, os marujos reinós negaram-se a manobrar os canhões, ao mesmo tempo que os que tomavam conta do paiol, negaram-se a entregar os cartuchos, declarando que dali não mais sairia pólvora para atirar a portugueses.

Foi durante este momento que Grenfell, junto com marinheiros ingleses e brasileiros, conseguiu prender os amotinados e assim salvou a capitânia. Participou Grenfell do bloqueio que se verificou no porto de Salvador, às ordens do Primeiro Almirante. Perseguiu os transportes portugueses quando se retiraram a 2 de julho, cabendo-lhe a abordagem do Grão-Pará, o qual teve os mastros grandes cortados. Por este feito foi promovido a Capitão Tenente.

Depois que Lorde Cochrane conseguiu a adesão do Maranhão, determinou que Grenfell, agora no comando do brigue Maranhão, ali apressado, se dirigisse a Belém do Pará, que igualmente ansiava pela expulsão dos portugueses. A 5 de agosto, partiu para o Pará, levando como imediato Victor James Subra, secretário de Lorde Cochrane. Não esqueçamos que às dificuldades normais do momento político, juntavam-se o desconhecimento das águas onde iam atuar.

A 10 de agosto, chegava à barra de Belém. Com astúcia, Grenfell impôs-se à Junta presidida por D. Romualdo de Souza Coelho, informando ser ele a vanguarda de uma poderosa esquadra, que logo chegaria. Aceita a Independência e aclamado o Imperador, estava por terminada a missão de Grenfell, que incorporou a fragata Leopoldina e a charrua Gentil Americana.

Entretando, os portugueses não estavam satisfeitos; dirigidos pelo Cônego Batista Campos, populares e arruaceiros iniciaram um movimento a 15 de outubro que depôs o Coronel Giraldo José de Abreu, Presidente da Junta. Grenfell não se meteu, recolhendo-se ao seu navio. A insegurança na cidade se manifestou no dia seguinte, com saques e ataques a propriedades privadas. Diante disso, o Coronel Giraldo de Abreu e outros procuraram apoio de Grenfell para restabelecer a ordem.

Desembarcando seus marujos, Grenfell conseguiu a custo colocar em calma a cidade, fazendo vários prisioneiros, tendo os 5 cabeças (os sargentos Manoel Raimundo e Felipe de tal, o músico Maximiliano, o soldado Antônio e um Custódio) sido fuzilados, sem processo, por ordem da Junta. Os demais, presos a bordo do brigue São João Diligente vieram a morrer na noite de 20 para 21 de outubro (1823).

Acusado de ser o mandante desse morticínio, Grenfell foi submetido ao Conselho de Guerra quando retornou ao Rio de Janeiro. Depois de absolvido (19 de abril de 1826) foi promovido a Capitão de Fragata (8 de maio) pelos serviços prestados na Guerra de Independência.​

     Lorde Alexandre Thomas Cochrane (1775-1860)

Almirante inglês que serviu no Brasil durante a Independência. Nasceu em Annesfield, Escócia. Iniciou sua vida militar no Exército, depois ingressando na Marinha Real inglesa. Lutou nas guerras contra Napoleão, tendo sido aprisionado. Em 1806, entrou para o Parlamento. Em 1813, espalhou na Bolsa de Valores de Londres a morte de Napoleão, com intuitos econômicos. Acusado de velhacaria, foi expulso do Parlamento e da Marinha Real e obrigado a deixar o país. Desgostoso, lutou como mercenário na Independência do Chile em 1813 e, depois, na do Peru, onde chegou a receber a alcunha de El Diablo.

A sua reputação de passados feitos servia de terror aos inimigos. Estando o Governo Imperial necessitando organizar uma força naval e não tendo no momento quem a comandasse, aceitou a sugestão de Felisberto Caldeira Brant, nosso representante em Londres, para contratar Cochrane.

Por isso, ordenou José Bonifácio, em 17 de setembro de 1822 a Manoel Correia da Câmara, Cônsul brasileiro em Buenos Aires, que o convidasse.

No dia 29, o Lorde respondia aceitando. Depois de 60 dias de viagem chegava ao Rio de Janeiro, a 13 de março de 1823, a bordo do brigue Colonel Allan, fazendo-se acompanhar de vários oficiais ingleses, do americano David Jewett, e marujos ingleses mercenários. Depois de acertar com o Ministro Cunha Moreira seus estipêndios e o posto de Primeiro Almirante, arvorou sua bandeira na nau Pedro I. A 3 de abril de 1823, rumou para as águas da Bahia, comandando 6 navios.

Cochrane velejou calmo, dando tempo para que as guarnições novatas se exercitassem nas manobras de pano. A 4 de maio, encontrou-se com a esquadra de Félix de Campos. O combate não foi decisivo, uma vez que o Lorde não contava inteiramente com as suas equipagens. Entretanto, efetuou o bloqueio da Bahia, tomando como base de operações o Morro de São Paulo. Tentou a 14 de junho atacar os portugueses no porto de Salvador com a nau Pedro I, a fragata Ipiranga e a corveta Maria da Glória; mas a mudança de vento lhe impediu bons resultados, desistindo da empresa.

Com a retirada de Melo, Cochrane entrou no porto de Salvador na tarde de 2 de julho para logo sair em perseguição ao comboio português. Deixando que essa perseguição se completasse por John Taylor a bordo da fragata Niterói, rumou só com a nau Pedro I para São Luís do Maranhão, onde chegou a 26 de julho.

Num lance de audácia atemorizou a Junta Governativa com poderosas forças que logo chegariam. Apressou o brigue Infante D. Miguel e assenhoreou-se da cidade. A 28 de julho, foi proclamada a Independência.

Cochrane considerou a cidade como por ele conquistada e boa presa as propriedades dos portugueses e mais escravos e pólvoras. Arvorou-se em libertador do Maranhão, o que não é verdade. Logo mandou que John Pascoe Grenfell, comandando o brigue Maranhão, se dirigisse para libertar o Pará. Por sua atuação o Imperador lhe concedeu o título de Marquês do Maranhão. Desentendendo-se com o Governo a respeito do soldo que lhe era devido, Cochrane retirou-se para a Inglaterra, onde foi em sua Marinha reintegrado. Teve o título de 10º Conde de Dundonald e Lorde do Almirantado. Encontra-se sepultado na Abadia de Westminster.​

     João Francisco de Oliveira Botas

Provavelmente português, nascido (presume-se) entre 1776 e 1778, veio para o Brasil em data ignorada. Em 1809, era Contra-mestre do cais do Arsenal de Marinha da Bahia. Em 1816, desempenha o cargo de Ajudante de Patrão no mesmo estabelecimento. É quase certo que a partir de 1817 Botas aderiu aos ideais de emancipação do Brasil.       

Promovido a Segundo Tenente Graduado em 14 de março de 1818. Já com o posto de Segundo Tenente conspira para depor a Junta Governativa da Bahia em 1821. Fracassara a conjura foi preso, remetido para Lisboa e ali anistiado, graças à intervenção do Deputado Antônio Carlos de Andrada e Silva.

A 16 de julho de 1822, Botas retornava à Bahia, nessa época já sofrendo a pressão do Brigadeiro Inácio Luís Madeira de Melo. No Arsenal de Salvador, Botas entra em entendimento com o Intendente CMG Tristão Pio dos Santos e os dois começam a aliciar elementos em prol da Independência ao mesmo tempo que protelavam o término da fragata Constituição.

Resolveram incendiá-la na ilha de Itaparica. Por determinação do Governo Provisório de Cachoeira, Botas, agora Segundo Tenente da Armada Imperial, organiza uma flotilha de barcos, dos quais o Pedro I, com uma peça de calibre 12, era o mais importante. Na ponta de Nossa Senhora estabeleceu o seu quartel. Seu primeiro feito foi comboiar 18 embarcações de suprimentos para o Exército de Labatut. Era 8 de dezembro.

Botas chama a atenção dos inimigos sobre si para que o comboio pudesse escapar. A 23 de dezembro sai com a sua flotilha de Itaparica para provocar o inimigo. Durante 3 horas bombardeia e causa confusão entre os portugueses. A 7 de janeiro deu-se o combate de Itaparica em que o fogo, começado às 9 terminou às 18 horas. A atuação de Botas foi decisiva para que os portugueses não tomassem Itaparica nem o Forte de São Lourenço.

Por este feito o General Labatut promoveu-o a Primeiro-Tenente. A 30 de janeiro de 1823, tenta capturar duas canhoneiras portuguesas, utilizando 5 dos seus barcos. Entretanto, corre em auxílio o brigue Audaz e outros navios portugueses. Botas retrocede e sua canhoneira 25 de Junho encalha próximo da ilha das Fontes. Neste local se verifica um combate que durou duas horas, até que conseguem desencalhar a capitânia. Ajudaram aos nossos as baterias de Itaparica. Com isso os portugueses retrocedem.

A 30 de abril de 1823 nova intervenção sua permite a entrada de 4 navios no Cotegipe, carregados de reforços; ainda, nesse dia dá combate a uma escuna e 8 canhoneiras portuguesas com êxito. Finalmente, Botas distinguiu-se no combate de Olaria travado a 23 de maio. O Primeiro Almirante Lorde Cochrane promoveu-o a Capitão Tenente em 6 de dezembro de 1823.

Botas continuou a servir a Marinha Imperial; foi promovido a Capitão de Fragata em 28 de janeiro de 1826 e a Capitão de Mar e Guerra em 1828. Em 1832, recebeu a promoção de Chefe de Divisão Graduado. Faleceu na Bahia em 18 de dezembro de 1833.​

     Pierre Labatu​t (1767-1849)

Militar francês que serviu no Brasil durante a Independência. Distinguiu-se enquanto duraram as campanhas napoleônicas na Europa, tendo abandonado a França após a queda de Napoleão. Estacionou primeiro na Nova Granada, comandando tropas do ditador Manoel Rodrigues Torices. Por causa do seu gênio autoritário, logo desentendeu-se com Simon Bolívar, tendo fugido para Cartagena. Preso, foi expulso do país. Seguiu para Montevidéu e depois para o Rio de Janeiro, onde chegou a 29 de janeiro de 1819.

Com o princípio das guerras na Bahia, ofereceu Labatut ao Príncipe D. Pedro os seus serviços, logo aceitos. Em 3 de julho de 1822, era nomeado para o Exército Imperial brasileiro com a patente de Brigadeiro, recebendo, em seguida, o comando da expedição à Bahia. Embarcando com seus soldados em navios sob o comando do Chefe de Esquadra Rodrigo de Lamare, que os deixou no porto de Jaraguá, em Alagoas (28 de fevereiro de 1823).

Passou por Sergipe, instaurando a ordem, e organizou o seu quartel general em Feira de Capuame, onde chegou a 27 de outubro. Logo dirigiu-se contra as tropas do Brigadeiro Inácio Luís Madeira de Melo, oferecendo-lhe antes por carta do dia 29 a rendição, o que foi recusado. A 8 de dezembro de 1822, foi travado o combate de Pirajá a 20 km da capital e cuja vitória se deve unicamente a Labatut, ficando o líder português circunscrito a Salvador.

Entretanto, as divergências havidas entre o Brigadeiro Labatut e os irmãos Pires de Carvalho, e mais a prisão do Coronel Felisberto Gomes Caldeira, terminaram com a sua prisão e deposição (2 de maio de 1823) efetuadas pelo Governo Civil de Cachoeira. Submetido a Conselho de Guerra foi Piérre Labatut declarado inocente a 9 de fevereiro de 1824.

Em reconhecimento, o Governo Imperial lhe conferiu a Ordem Imperial do Cruzeiro e a Medalha de ouro da Restauração da Bahia. Participou, posteriormente, na Guerra dos Farrapos.

Faleceu na Bahia como Marechal de Campo, na antiga rua dos Barris, hoje General Labatut.

Conclu​são

Prática comum entre os exércitos e Governos durante o século XIX, a contratação de estrangeiros para fileiras em formação ou reforço das suas forças militares, também foi a saída rápida encontrada pelo Imperador D. Pedro I e os dirigentes militares do Império do Brasil para organização interna e luta contra as tropas portuguesas remanescentes em solo brasileiro. 

Muitos destes militares, majoritariamente vindos da Europa e com considerável experiência adquirida em combates das campanhas Napoleônicas, ofereceram seus serviços para as campanhas de Independência dos novos países que surgiam na América do Sul, com espírito aguerrido, em troca, dentre outras recompensas,  de títulos e glória militar.

Assim, contribuem para a formação do ethos militar brasileiro, em paralelo ao da formação de “brasilidade".

 

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FÁBIO NEVES LUIZ LAURENTINO

Nasceu no Rio de Janeiro, em 1989. É Mestre em História Militar pela Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa (FLUL) onde cursa Doutoramento em História Marítima em associação com a Escola Naval (EN). Desempenhou funções de investigador em História na Editora Laboratório de Ideias junto à Marinha do Brasil, onde publicou livros para as seguintes organizações militares: Base Aérea Naval de São Pedro da Aldeia (BAeNSPA), Navio-Escola “Brasil” e Serviço de Assistência Religiosa da Marinha (SARM). É membro da Associação Ibérica de História Militar (2019) e Amigo do Museu Militar de Sevilha (2018).​

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Como citar este texto:

LAURENTINO, Fábio Neves Luiz – Personagens de uma História Militar em Comum: Estrangeiros que Tomaram Parte Pelo Império do Brasil à Época de sua Independência​. Revista Portuguesa de História Militar - Dossier: O Brasil na História Militar de Portugal, 1500-1822. [Em linha]. Ano II, nº 3 (2022).[Consultado em ...], https://doi.org/10.56092/NXSI2428



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